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Luz azul

  Quando olhava o que ele fazia, ficava extasiada. Era capaz de fazer qualquer coisa andar, especialmente, quando manejava seu tempo. Era me...

domingo, 28 de dezembro de 2014

Nem tudo que parece é

Eu tinha naquela época, pouco mais que doze anos,
morava no sitio, poucas vezes vinha para a cidade.
Até que um dia, meu pai resolveu me levar com ele a cidade, disse-nos que
chegara a cidade um profeta (falso).
Minha mãe ficou excitada com a possibilidade de sair de casa, de fazer algo diferente,
 então, com
muito gosto nos preparou com a melhor roupa.
Chegando ao local de culto, observei um palco enorme, localizado a um canto
 de um terreno baldio, Tinha um bom espaço para abrigar multidões.
Ouvimos então o sermão, que nos deixou emocionados. era lindo poder ouvir
a voz de Deus.
Depois do sermão, cantavam hinos, louvando ao Senhor e incentivando-nos
a amar.
"Não importa a igreja que tu vais,
se atrás do calvário tu estás,
Se o seu coração é igual ao meu,
Dá-me a mão, e meu irmão serás."
Era uma loucura, sons de muitas vozes que arrepiavam. Por várias vezes vi meu pai enxugando
lágrimas,
Bom, depois de louvar, admoestar e efetuar algumas possíveis curas, um coador enorme
aparecia no meio da multidão: Hora de colher ofertas. E cada um fazia a sua oferta conforme
podia.
Algumas semanas se passaram. Meu pai não perdia um só domingo, mesmo com
uma certa dificuldade no transporte, pois o útimo ônibus que saia da cidade rumo ao bairro
mais próximo do nosso, saia as dez horas da noite, se perdêssemos esse ônibus, só no
dia seguinte de manhã.
Então, muitas vezes saíamos antes do culto terminar.
Depois que descíamos do ônibus, ainda tínhamos que andar pelos cinco quilometros
seguintes, a pé, e no escuro.
Como éramos de uma família simples, não tínhamos nenhuma consciência de maldade
dentro da gente. Meu pai era um lavrador, só  tinha conhecimento da roça. E de gente? muito pouco1
Então, dentro do nosso mundo não havia mente doente, todos honravam o seu bigode, como diziam
por lá, naquela época.
E foi assim, que meu pai ingenuamente fez uma certa amizade com o Tal missionário, como ele
se autodenominava.
E o tal, percebendo nossa simplicidade, pediu para meu pai  me emprestasse a ele, a fim de que pudesse cuidar de sua esposa, que também cozinhasse e limpasse a casa, já que sua esposa não estava
apta para realizar tais tarefas.
E meu pai me levou até a sua casa, e lá me deixou.
Eu tinha tanta vergonha de estar num lugar desconhecido, tendo que andar por uma casa que não era minha, e ainda ser dirigida por gente estranha. mas, enfim, eu não podia negar ao pedido de meu pai,
mesmo porque era proibido desobedecer tais ordens.
Fiquei por lá durante algumas semanas, mesmo porque, pouco me era exigido. Se me lembro bem,
eu nunca vi a cara da esposa do tal homem, minha estadia se limitava a limpar a casa á meu modo,
cozinhar coisas simples e no final do dia sentar num sofá e assistir novela, para
depois deitar-me num sofá e acordar no outro dia para fazer as mesmas coisas.
Porém, logo as coisas mudaram. Quando eu sentava no sofá para assistir televisão, o missionário
colocava os pés sobre meu colo. Eu ficava totalmente sem jeito, mas não falava nada. isto aconteceu porque chegou na casa um irmão dele, e ele, talvez para se mostrar ao irmão começou a cometer
seus delitos, mostrando quem realmente ele era.
Eu ficava muito assustada, ninguém até então tinha me desrespeitado,  e eu não sabia o que fazer.
Então, ficava quieta, como se não tivesse acontecendo nada, e isto o incentivou a fazer coisa pior.
Eu achava estranho que sua mulher nunca tivesse mostrado a cara. Sabia que tinha alguém no quarto, mas esta pessoa não saia por nada, nem para tomar água.
Porém, num certo dia, eu passava pelo corredor, como fazia todos os dias, pois o tanque para
lavar roupas ficava ao lado do quarto do casal, e constantemente mantinham a porta fechada.. Este quarto ficava no andar de baixo, enquanto que a cozinha e a sala ficava no piso superior, dando acesso para a rua. Só que para alcançar o tanque, eu tinha que descer uma pequena escada até alcançar o corredor, onde ficava não só o quarto, mas também o banheiro e a lavanderia.. Antes
de começar a escadaria tinha um patamar, onde ficava um armário que eu guardava minha poucas roupas, e a frente, quase ao pé da escada eles deixavam uma caixa de bebida a base de chocolate dentro
de pequenos frascos de vidro, e eu amava aquela bebida. de vez em quando, ao me encontrar sozinha,
eu abria uma garrafinha e me deliciava com o sabor doce da bebida.

Bom, isto não vem ao caso, Como estava dizendo: Eu desci a escada naquele dia e vi a porta do quarto aberta, estava na casa apenas eu, e ao passar pela frente da porta, eu não resisti, minha curiosidade era tanta, que arrisquei uma olhadela.
Me surpreendi ao notar uma bela moça de olhar perdido, mais parecia uma boneca de porcelana,
tão alva e desbotada por não tomar sol, completamente nua.
Ele a mantinha trancada em seu quarto, eu acho que era consensual, porque ela podia ter pedido socorro, afinal não estava sozinha na casa, eu estava lá, e seu marido pouco ficava em casa.
Naquele dia eu fiquei tão nervosa , que não parava de me perguntar o que realmente estava acontecendo naquela casa? E o pior, eu estava ali, completamente vulnerável, não conhecia o local,
não sabia voltar sozinha para casa. Estava completamente amarrada pelos pés.
Eu não sabia se meu pai continuava frequentando aos cultos, eu também me tornei prisioneira daquela casa e daquele misterioso homem. Ele nunca pediu para que eu saísse, nem para comprar o que faltava, ele se encarregava de tudo.  E eu, como uma cordeirinha, não tinha coragem para enfrentá-lo, fui criada para obedecer, não podia abrir minha boca, estava a mercê do destino.
Meu pai nos ensinara a não contestar, sua palavra era lei, ou a gente obedecia, ou sofria as consequências, geralmente, com o que ele tinha nas mãos, cordas, varas e até com cintos na bunda.
Eu vivia com medo de tudo, até dos pequenos delitos que como criança cometia.
Continuando: sempre que ele estava em casa, e eu sentava para assistir televisão, ele continuava descansando seus pés em meu colo, eu ficava tremendo, mas não tinha coragem para falar o que eu estava sentindo.
Até que numa noite, eu já estava deitada sobre o sofá, que passou a ser minha cama até então. este sofá ficava em um canto da sala, quase perto da porta de entrada.
Eu ouvi passos na escada, não fiquei preocupada, era domingo, e provavelmente, ele estava indo trabalhar.
Cobri a minha cabeça com o lençol, como que, para esconder-me. Ele passou e retirou o lençol, e ainda no escuro me fez um estranho pedido: -Olha eu vou descer, depois de algum tempo, você bate palma, vai até o patamar da escada e me chama, diz que alguém esta querendo falar comigo.
E assim eu fiz! Sem desconfiar de nada, pelo menos não queria acreditar, pois meu coração acelerou parecendo
que ia sair do peito. Como que ja se preparasse para o que viria.
Ouvi nitidamente ele abrir e fechar a porta do quarto, subir vagarosamente as escadas, percorrer
a cozinha e entrar na sala. Então abriu a porta da sala, falou alguma coisa para simular a presença de alguém e fechando-a novamente, deitou-se comigo. Virei uma estátua de pedra, não conseguia me mexer, então começou a me beijar na boca e se esfregar em mim, e eu sem reação.
Por pura sorte, ou ação de Deus ao perceber a minha agonia, um ser revoltado apareceu para me tirar daquela miséria de situação., a meia luz, quase que parecendo um fantasma, um vulto de menina lançou uma garrafa na parede fazendo um barulho de cacos deslizando sobre os degraus. E vei outra e mais outra, e o homem saiu de cima de mim, e ficou tentando se defender das garrafas voando para todos os lados.
Ela chorava e nada dizia, apenas lançava as garrafas contra a parede e despedaçava-as como se fossem seu próprio coração a sofrer.
Eu estava atônita, com muito medo, agora dos dois lados, medo que ela me matasse, ou que ele para defender-se falasse que eu era culpada, que eu o incetivara, e que ele como homem, não resistiu.
Antes de colocar a mão nela, ele ainda fez um último pedido:
-Tenho que acalmá-la -ele disse. Vá até o local do culto, vá correndo, estou atrasado, diga-lhes
que houve um contratempo, que vou me atrasar um pouco, enfim,, fique la até eu chegar. Entreta a plateia!
Mais que rapidamente, eu sai correndo daquela casa, não sei como minhas pernas obedeceram, sei que cheguei ao lugar quase sem fôlego.
Lembro-me de subir no palco, de balbuciar algo como, ele se atrasa, mas chega, e comecei a cantar:
"Desta água quem quiser beber,
só a Cristo deve recorrer,
outra água nos fará perecer,
só a de Jesus nos fará viver."

"Não importa a igreja que tu vais...."

E o povo a cantar comigo, mal sabiam que por dentro eu estava inerte.
No meio de alguma canção, ele chegou, E eu sai! Desci e caminhei até a casa, deitei-me, pois estava
tudo quieto, não consegui dormir, vi quando ele chegou e desceu as escadas pisando nos cacos que estavam por todo lugar, não sobrara nenhuma garrafa inteira para contar a história.
Pela manhã, antes mesmo que o galo cantasse, peguei meus poucos pertences e fui para a
rodoviária, por sorte, achei algum dinheiro espalhado pela casa, apenas o que pagava minha passagem
para casa, não podia voltar a pé.
Tomei o ônibus quase como um autômato, e quando cheguei em casa, ninguém perguntou nada.
Não sei por quê? Eu também nada falei, mesmo quando minha irmã mais velha me achou chorando atrás da casa. depois de muita insistência da parte dela eu apenas balbuciei. Ele tentou me violentar.
E foi só, nunca mais se falou sobre o assunto, e esta história morreu comigo.
Nunca mais ouvi falar neste missionário, nem por parte do meu pai, que nunca tocou nesse assunto.
E eu aprendi que, não devemos confiar em ninguém a não ser em nós mesmos. E olha lá!
Fim....
Herta Fischer








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