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Lá onde aconteceu

  Busquei em vão o que não achei, a maquina do tempo não funciona. Leva-me na alça de seu estalo Já foi, foi mesmo. Em que sala se entrega,...

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Última gota

Abandonei o meu ninho aos quatorze anos de idade, e
meus pais ficaram lá, a me observar de longe,
Tinha que aprender a me virar, até então como bola murcha,
Trabalhei em alguns lugares, em condições de escrava, sem
carteira assinada e muitas vezes sem salário.
Muitas vezes, me alimentei com miolo de pão e água,
mas era esta a minha porção, então não reclamava.
Era apenas um ser vivente.
Aos finais de semana rumava para casa, e achava um porto
seguro para descansar, o colo da minha mãe.
Chorava toda vez que tinha de deixá-la e voltar a luta.
Ao completar meus dezesseis anos, pela graça de Deus,
minha irmã mais velha arrumou um emprego numa fábrica e
me levou com ela. Agora com todos os benefícios.
No inicio foi difícil, quase que me mandaram embora, no
entanto, dei tudo de mim para aprender, e depois de algum tempo, dominava.
Tudo ia bem, mas passava de casa em casa, pagando mensalmente
um lugar para morar. Quase sempre acontecia algo e eu tinha que arrumar
outro lugar para ficar.
Aos dezenove anos aconteceu o que eu mais temera na vida, minha mãe,
sempre tão ativa, adoeceu.
E eu vi então, o que realmente era a vida, uma sucessão de lutas, e num determinado
 tempo, somos obrigados a encarar que tudo não passa de vaidade.
Minha mãe foi secando como um poço com pouca água, o liquido
tão precioso que é a vida, foi aos poucos se esgotando, até
transformar-se numa ultima gota que também secou.
E eu fiquei ali, parada, sem poder acreditar, pensei que mãe fosse eterna, e lá estava ela,
sem vida, apenas um corpinho frágil desgastado e sofrido, sem nenhum fôlego.
Não chorei a princípio, a dor que sentia não permitia que extravasasse,.
Deixamo-la então, deitada no pó, e assim como o vazio que a sua ausência deixou , um vazio em mim se formou, endurecendo meu coração, como se estivesse me transformando naquele mesmo
pó que a cobriu.
Porém, eu tinha que seguir, não tinha outro jeito, agora, fora de um jardim florido, eu
precisava me conformar em ser  apenas uma flor solitária perdida em qualquer lugar, num
lugar que não era meu.
Ao voltar para casa aos fins de semana, eu ainda esperava encontra-la a esperar por mim. Só que não,
da estrada onde podia ver a janela, eu não mais a encontrei, a janela se fechara para sempre.
Eu continuei, é preciso encarar a realidade, ainda havia muita água em meu poço e até que essa dor
passasse, eu precisava de toda coragem possível.
Procurei em muitos rostos uma compensação pela perda, mas, na verdade, esta é uma perda irreparável, e quanto mais me iludia, mais mal causava a mim.
Não via mais caminho, só uma névoa a cobri-lo, como se todos os caminhos se fechassem a minha frente, eu estava só.
Bom, em todo vácuo que se forma, alguma coisa o preenche, ao passar dois anos, uma outra pessoa entrou em seu lugar, meu pai não conseguiu caminhar sozinho.
E ai tive que encarar uma outra pessoa, completamente desconhecida, a usar todas as coisas que até então, eram da minha mãe. Não a culpava, porém não consegui amá-la.
Minhas visitas a minha casa foram diminuindo cada vez mais, porém não deixava de ir, por causa
do meu pai.
Eu me transformei naquela plantinha que vive sobre a sombra de outras árvores, miúda, solitária,
fraca, pois o sol não mais me alcançava, e a cada dia ia enfraquecendo mais e mais.
Porém, toda plantinha cresce e fica grande e alcança as copas de outras árvores enormes, e enfim,
chega mais perto do sol, e o sol a cobri-la a transforma, de fraca e miúda, a forte e eficaz.
Depois de muito sofrer, enfim achei o caminho, as névoas foram se dissipando, e o caminho se tornando mais nítido.
]Lógico que a gente encontra muitas criticas pelo caminho, para crescer é necessário enfrentar
os reveses, não mais como castigo, e sim., como ensino.
Ilhei-me muitas vezes, me perdi em pantanais de fraquezas e desalento, e sobrevivi.
Hoje já posso contar minha história, para lhes ensinar que passamos por tudo e um pouco mais, cada
um com a sua porção, mas a vida continua para alguns, quanto para outros se finda, até que  também em nossa fonte, seque a última gota.
Herta Fischer.



















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