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Luz azul

  Quando olhava o que ele fazia, ficava extasiada. Era capaz de fazer qualquer coisa andar, especialmente, quando manejava seu tempo. Era me...

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Imigrantes guerreiros

Mais um pouco e completo a jornada!

As vezes fico pensando se não teria sido diferente, ou então, porque
não foi diferente?
Se meus avós não tivessem que vir para o Brasil, fugindo da guerra, provavelmente,
para mim, não haveria história.
Meu avô e sua família saíram da Alemanha por volta de 1914, fugindo de uma situação ruim, enquanto que,
na Romênia, minha Avó e sua amiga se preparavam para fazer o mesmo caminho, pelo mesmo motivo.
Porém, o destino fez com que a esposa de meu avô adoecesse na viajem, e chegasse aqui no Brasil para morrer.
Meu avô, então com quarenta anos de idade, ficou viúvo, nesta terra estranha, com quatro filhos, sendo o caçula ainda um bebe.
Minha avó tinha apenas vinte anos de idade, não conhecia a cultura nem a linguagem daqui, no entanto, com
muita coragem, ela e a amiga arrumaram um emprego na agricultura.
Passado algum tempo, essas duas histórias se juntaram, e minha avó conheceu o filho mais velho do meu avô, que assim como ela, também tinha seus vinte anos de idade!
Se conheceram, provavelmente, na agricultura, em alguma fazenda qualquer.
logo, ele a pediu em casamento, e então, noivaram.
Porém, meu avô, com seus belos olhos azuis, deve ter chamado a atenção da minha avó. E ela, por sua vez, uma mulher de fibra, muito admirada pela coragem, também não passou despercebida pelo meu avô.
E num belo dia. Eu acho que seria um belo dia, pois o amor enfim se resolveu. Ele a convidou para fugir com ele. Não queria enfrentar seu próprio  filho, dizendo-lhe que estava roubando a sua noiva.
Então, numa cidade qualquer, eles se casaram e foram morar na cidade litorânea de Cananéia.
La meu avô comprou um pequeno sitio, com a economia que trouxe da Alemanha, e minha avó, logo engravidou uma, duas, três, quatro.
Ela ainda cuidava do filho mais novo do meu avô, então, tinha agora cinco filhos sobre seus cuidados.
Passaram-se algum tempo, já tinham plantado lavoura, tinham alguns animais e a vida ia transcorrendo normalmente, até o filho dele, o que era noivo da minha avó, tinha se casado com a amiga dela, essa que viera com ela para o Brasil. Então estava tudo bem, tudo tinha acabado em paz.
Porém, nada que esta tão bom que não possa mudar. Num determinado dia, os militares invadiram a terra do meu avô, e o expulsaram de suas terras, alegando que não podia ficar no Brasil, deram-lhe um prazo para que arrumasse suas coisas.
Meu avô implorou para que não fizessem isto, pois ele já tinha quatro filhos nascidos aqui, e alegou ter seus direitos como brasileiros, Porém, não houve acordo. eles disseram que, se minha avó quisesse, ela e os brasileirinhos até podiam ficar, mas, meu avô e seus três filhos do primeiro casamento, eram estrangeiros e teriam que sair do país.
Minha avó resolveu, então, lógico, acompanhar o marido, mesmo porque, ela não tinha a menor condição de ficar só com as crianças, como iria sobreviver?
Então, ensacaram alguns pertences como, roupas, alimentos e panelas,  o que conseguiram colocar sobre as costas e vieram para  a cidade de piedade.
Por sorte, tinham por lá alguns conhecidos que também migraram da Alemanha para cá. E esses amigos os receberam por algum tempo.
Mas, os militares não estavam dando folga, e se meu avô fosse visto novamente, ele seria preso e deportado, juntamente com seus filhos nascidos na Alemanha.
Então, ele pegou minha avó e os filhos, se embrenharam no sertão para fazer carvão. Não tinha restado mais nada, tinham perdido tudo, o governo confiscou seus bens. Agora só restava a fuga. E voltar para a Alemanha, com Hitler fazendo tudo o que queria,. Não, ele não queria mais voltar.
Entre Piedade  e a estrada que leva a cidade de Juquiá, a mata era muito fechada, só havia algum caminho traçado por alguns animais, pequenos trilhos quase que invisíveis, e foi por lá que meu avô e minha avó caminharam até encontrar uma clareira onde ele levantou um pequena cabana.
O tempo foi passando, e eles começaram a fazer carvão, o único modo de sobrevivência naquela mata. e tiveram mais quatro filhos.
Os dois primeiros eram homens, sendo um o homem que se tornaria meu pai, juntando com o filho mais novo do primeiro casamento, seriam três homens, já que os outros, mais velhos, do primeiro casamento se casaram e foram cada um para o seu lado, o restante eram meninas, e a vida era muito dura.
Uma das meninas ficou doente, e eles a viram se consumindo dia a dia, minha avó a levou ao médico na cidade de Juquiá, mas, ela não sobreviveu.
A cabana era coberta por folhas de palmeiras e as as paredes eram feitas com madeira, e a noite podia ver as onças rondando a casa.
Meu pai completara dezessete anos quando meu avô adoeceu gravemente. ele então tratou de trazer meu avô para o hospital de Sorocaba, só que meu avô acabou falecendo, e sem condição alguma de levar o corpo de volta, meu pai enterrou meu avô por lá mesmo.
Na volta, apenas contou a minha avó o ocorrido.
Depois da morte do seu pai, meu pai resolveu sair da mata, já que não havia mais nenhum perigo de serem pegos pelos militares. e arranjou emprego na agricultura, deixando para trás a difícil tarefa de fazer carvão.
Minha avó e seus outros filhos ficaram ainda lá por algum tempo, até que meu pai fez-lhe o convite de também saírem. No inicio houve uma certa resistência por parte do meus tios, mas, ao ver a labuta das minha tias e de minha avó, eles acabaram aceitando.
Então, meu pai conheceu minha mãe, se casaram, tiveram seus filhos e tudo acabou bem.
Essa é uma parte da história de minha família.
No inicio eu perguntei se teria diferente?
Se meu pai e seus irmãos tivessem tido a oportunidade de estudarem, quanta coisa poderia ter sido evitado. O meu pai sabia ler e escrever muito pouco, mas, fez questão de que, nós, seus filhos, concluíssemos pelo menos o ensino primário.
Ele passou a vida inteira trabalhando na agricultura, assim como minha avó e alguns de seus filhos.
Outros, tiveram chance de trabalhar no comercio e puderam dar aos filhos, melhores chances.
Enfim, é o que tinha de ser...Apesar de tudo.
E nós não teríamos existido se de alguma forma tivesse acontecido diferente. Se a história tivesse tomado outro rumo, consequentemente eu não teria nascido dessa família ao qual me orgulho muito...Filhos e netos de perfeitos guerreiros.
Herta Fischer