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Transferência de um bem

 Q uis apenas ser eu, esquecendo que outros também quer o mesmo..." Marchei como se fosse plena . Como se ninguém me bastasse. Como se...

sábado, 13 de setembro de 2025

Transferência de um bem

 Quis apenas ser eu, esquecendo que outros também quer o mesmo..."

Marchei como se fosse plena. Como se ninguém me bastasse. Como
se o mundo fosse posse minha. E me deparei com a ignorância de mim. E, agora, no enfado, construo meus dias e em lamentos faço minha cama todos os dias. Só há espinhos nela. Porém, construo esperanças em cima.
O sol me expulsa da cama pela manhã e a lua me traz de volta ao descanso. Esse descanso sonoro, repleto de boas recordações de um futuro que já entra em mim, como letras memoriadas e melodias já preparadas.
Estaria, eu, mais satisfeita se soubesse em que dever me bastaria.
Minha mãe, sempre me alertava, quando um homem passava em nossa porta para mendigar o pão: - Este homem não tem nome, nem residência, nem família! Dizia ela: Não sei por que me vem á memoria, nem sei por que o chamava de Lazirio, talvez, por ser um pequeno Lazaro, aquele que, mendigava a porta dos grandes e que recebia as migalhas que sobravam. Poderia nos parecer ninguém, no entanto, Deus estava com ele em sua renúncia.
Aí eu me lembrava de quando subia nas árvores para brincar de gente grande. Não tinha nada lá, nem um pote de mel, e eu, me sentia como um urso lambuzado de doces.
O ser que se desprende - assim como a borboleta se desprende de seu casulo e ganha asas para voar e morre quando desperta sua prole. É dessa forma que me sinto agora.
Quanto mais invisível sou para aqui, mais me sinto viva e visível para mim.
Doar-se não é sacrifício. É mágico e sagrado.
Se sou, vivo!
Se vivo, sou!
Se sou e vivo, de que me adianta se não doo um pouco de mim. Me bastar, o que me basta?
A pior doença do ser é estar envolto em si mesmo, como se o universo não existisse e de nada precisasse.
Existe outros tipos de prazeres que podem trazer satisfações para a vida toda, no entanto, fazemos de tudo para ter prazeres momentâneos. Mesmo que nos custe lágrimas e sofrimentos.
Precisamos aprender a ler os rótulos, antes de medicar-nos. Assim fica bem mais fácil nos livrarmos de sintomas indesejáveis.
Hertinha Fischer














sábado, 30 de agosto de 2025

Lá se vão os vilões, lá se vem os mocinhos velhos

 Me perguntam se eu tenho uma historia boa para contar. Tenho historia, só não sei se é tão boa assim.

Alguns trechos foram esquecidos, outros, memoriados, sem poder contar. O que posso contar, escrevendo, esqueço.
A melhor fase, antes dos cinco anos, não registrei.
Os outros sessenta anos, a memória guardou mais paisagens que dizeres. Não posso descrever o caminho, nem os córregos, nem as mudanças, que foram tantas.
Digo que havia, sempre havia!
Um estalar de vida a uivar, como lobos famintos seguindo suas trilhas.
Um troteio frenético de saberes e sabores, vencendo e titubeando ao mesmo tempo.
As vezes penso que é extremamente inútil revelar, como as antigas fotos que acabam por se perder nas gavetas.
Minhas importâncias são minhas importâncias - enquanto me valem terá um certo valor. Depois que me vou, alguém se valerá, mas, não com a mesma significância.
Pouco a pouco, o tempo vai nos perdendo e os lugares em que sentamos, ocupados.
Sinto as lembranças mais vagarosas, como um tilintar de orvalhos da manhã, que mal chegam e já se preparam para partir.
Uma flor que o tempo toma para si, cujo perfume se vai com o vento.
Algum lugar me espera,
se me espera, quando?
Haverá cura para essa doença chamada velhice,
ou persistirá até que a doença seja a cura?
A velhice é como a criança com menos de cinco anos, sem registro.
Nada será tão sublime como mais um dia, mais uma noite e o dia seguinte. A memória não tem autoridade para ir além do instante. E é esse instante que nos impulsiona a continuar seguindo pelos caminhos já memoriados.
Até que nos procurem nas coisas, que, para aplacar a dor da memória, coisas que nos pertenceram sejam jogados fora. Missão cumprida, partida!
Hertinha Fischer










segunda-feira, 25 de agosto de 2025

O entardecer da vida

 (Talvez doa um pouco, acima dos espinhos, espirra uma rosa)

Esses dias que me revelam,

revelaram-me em outros dias.

A limpo foi passado,

os rascunhos que me disseram.

Vencendo as horas que nem me lembro,

quando o relógio me foi vencendo,

No ciclo das mesmas horas,

um pouco me foi morrendo

A noite que mal descanso,

o dia que chega ligeiro,

Tempo, anda mais devagar,

que aqui, sou passageiro.

Repentinamente, aqui cheguei

com a face enrubescida

Lá se foram os melhores anos

E já me encontro vencida.

Sulcos que abri com a enxada

Agora se abre na pele

Meus órgãos, antes tão puro,

Lá dentro já me repele

Pernas já se cansaram,

Olhos obscurecido

Unhas fracas nas pontas dos dedos

Ossos enfraquecidos.

Por dentro, sempre criança

Quer brincar e espairecer

O corpo já tão cansado,

só pensa em alvorecer

A lua pela metade,

Os campos adormecidos,

meia luz, meio turvo

nos sonhos que foram esquecidos.


Hertinha Fischer.







 

domingo, 24 de agosto de 2025

O começo e o fim da linha

 Aqueles instantes singelos e ao mesmo tempo,

loucos, por conhecimento, iam adentrando aquele

mundo ainda submerso na escuridão.

O sol parecia distante e frio e a lua tocava de leve

a orla das sombras, quase á iluminar algum trecho

quem nem existia.

Eu, quase alguém, suportando esse mundo desconhecido,

entre cinzas e resquícios de fogo, apostando nesse viver

morno sem fôlego.

Submergia, afogado, nas entranhas das carências, tentando ser luz

á ultrapassar as nuvens.

Tocava de leve o nada e sentia a magia do tudo no nada que revelava

em outros que não me cabia.

Estava dentro e de fora me explorava.

Que são paixões: fogos ou apagões?

Lá fora o tempo fluía, dia a dia, crescia.

Tempo que me levou sem perceber, tempo

que se passou sem que soubesse.

Um hoje e o futuro - um só lance,

anos a fio á passar no olhar de um só luar.

E o fim a espreitar, até quando existir?

Hertinha Fischer









O resolver matemático da vida

 Quem mais poderia me ver como os olhos de minha mãe?

Era um olhar límpido, repleto de amor e fé.

Não podia andar com meus pés, nem escolher em

que caminho andar, mas, podia, emprestar o seu colo,

quente, quando o inverno se instalasse em meu semblante.

Os leves tropeços da criancice não deixavam muitas marcas, mas, no decorrer

dos tempos e correria da vida, os tombos iam se aperfeiçoando e

as feridas ficavam cada vez maiores.

Fui me desfazendo de certas brincadeiras inocentes e adentrando

um mundo perigoso, onde um vulcão de emoções explodia.

As minhas andanças se tornavam cada vez mais frenéticas, o

mundo me rodeava, de tal forma, que me perdia em seu labirinto

de poder.

Havia ainda aquele medo de crescer - de descobrir para onde não

 ir, de aprender o errado e não com os erros.

A soberba da adolescência não consta sabedoria - segue com os olhos

entreabertos, serrados e descrentes.

Todos os outros me pareciam tão certos, tão amáveis, tão saciados, e, eu, meio tonta,

titubeando á revelia.

Procurava me relacionar, tinha uma certa urgência em aceitação, a pressa me levou ao mundo da frustação.

Havia riqueza de palavras por dentro, mas a língua estava presa na timidez.

Meus entes eram de poucas palavras, aprendi com eles á ser muito reservada no falar.

Porém, a cabeça rodava - passeava com total liberdade, sonhando com o amplo dos sentimentos profundos.

E foi assim minha iniciação adulta, aprendia muito na solidão, quando o silêncio me tocava, o sonho resplandecia. 

Só depois de muitos calos nos pés, muitos dissabores na alma, é, que, descobri que, todos éramos iguais.

O que a boca não conta, os olhos espalham.

Minha história não foi a melhor nem a pior, mas estava rodeada de agitação, com muita riqueza nos detalhes.

As vezes, arrepiantes, noutras soltas e leve. É assim que a vida resolve a gente.

De repente, mais perto do horizonte.


Hertinha Fischer








sábado, 16 de agosto de 2025

Paixão de primeira viagem

Mais um dia na roça, as mudas já estavam preparadas

na caixa, prontas para encontrarem seu lugar na terra.

Algumas mãozinhas se posicionavam, preparadas para

estabelecerem um ritual de plantação.

Uma grande extensão de terra estava devidamente aradas

e gradeadas, só faltava abrir os sulcos com a enxada.

E lá estava ela, a irmã mais velha de uma leva de cinco filhos,

que, incansavelmente, fazia uma valeta rasa, que seria preenchida

por centenas de mudas de cebola, todas enfileiradas milimetricamente,

por seus três irmãos mais novos. Com a terra que se revolvia na valeta

principal, cobriam-se as mudas, e assim, consequentemente, como um

ritual sem fim.

Vilma se destacava entre as mulheres, se tornara uma peça principal entre

os irmãos. Além de fazer o serviço mais pesado, orientava os demais no 

que deveriam ajudar.

Sonhava um dia poder viver por conta própria, poder largar aquela vida simples, onde seus sonhos eram enterrados junto com as mudas.

Mas, ainda era muito jovem e precisava aprender a andar com os próprios pés.

O próprio andava muito distante.

Os anos foram passando devagar. Cada pedacinho de terra batida continha muito mais que simples pisadas.

Sua cabecinha rodava sem parar, ousava pensar em outros lugares, outras possibilidades lhe encaravam enquanto dormia.

De repente, como num conto de fada, uma porção de terra foi alugada por japoneses. Uma família inteira passou a rondar seu espaço. A terra foi revolvida com tratores potentes, o pequeno riacho fora alargado, tornando-se um grande lago, uma carreira de canos enlaçados por argolas, subiam a ribanceira, até se entregarem, completamente, entre os sulcos da lavoura.

Um rapaz muito simpático desceu até o rio para colocar o motor em funcionamento, passando em frente a porta de sua casinha. Ela deixou escapar um suspiro de satisfação. Algum anjo lhe dizia, lá no fundo de seu íntimo que as coisas iriam mudar.

Subiu até a estrada e ficou maravilhada com aquela forma de regar. Só conhecia seu pobre regador de lata. A água jorrava por todos os lados, como um chuveiro inteligente, espalhando por sobre uma grande porção da lavoura. Depois de uma hora mais ou menos, as pessoas mudavam os canos de lugar, até que toda a terra ficasse totalmente alimentada de umidade.

Suas manhãs repletas de tarefas e cansaço, finalmente, á encaminhou para outros rumos. Enquanto acendia o fogo para preparar o café, sua alma se enchia de felicidade. Embora tivesse o rosto do dia, a refletir afazeres, tinha o coração transbordando de emoções.

Ao ouvir o roncar de um caminhão, sabia que veria alguém que a faria transportar para um mundo só dela, fazendo com que, as tarefas, antes tão angustiosas, lhe parecesse menos pesada.

Já se preparava para olhar pelo buraco da parede. Já não parecia tão desconcertante, a falta de uma parte do reboco. E com os olhinhos afoitos e curiosos, se preparava para vê-lo passar, indo em direção ao rio para ligar o motor.

Começou a tomar mais cuidado com a forma de se vestir. O trabalho na roça exige roupas simples - lenço e chapéu na cabeça e um conga surrado nos pés, mas, teve a ideia de colocá-lo apenas quando saísse, para que o moço não tivesse que vê-la mal vestida.

No inicio ele nem olhou para ela, parecia completamente alheio a tudo, mas, conforme o tempo ia passando, os olhares insistentes daquela menina, despertou um certo interesse da parte dele. Tinha acabado de completar dezesseis anos, começava a  desabrochar por dentro e por fora, sua juventude e frescor não passaram despercebido e começou um flerte silencioso entre os dois.

Hiroche já estava com vinte e um anos de idade, estava pronto para um relacionamento sério, no entanto, Vilma ainda teria que esperar mais alguns anos para que seu pai á deixasse namorar. Porém, ela sentia o coração pulsando no peito por causa dele. Muitas vezes, precisava segurar o peito com força para evitar que os outros escutassem o nome dele em cada batida.

Certa tarde, quando descia para o rio para buscar água na bica, ela ouviu alguns passos vindo em sua direção, olhou para cima, notando aquela presença maravilhosa que a fazia sonhar.

O motor ficava um pouco abaixo de onde ela estava, ela concluiu que ele estava indo desligá-lo, embrenhou-se entre a mata com muito tato, bem devagarzinho, tomando um certo cuidado para não alertá-lo com o barulho de galhos se quebrando abaixo de seus pés. Perto do tanque tinha uma grande árvore que ela e seus irmãos chamavam de árvore de galo, por ser uma árvore, cujas flores, se pareciam com pequenos galinhos vermelhos. De onde estava dava para ver o motor. 

Quando ele chegou, desligou o motor, desceu até a beirada do tanque, lavando as mãos e molhando levemente os cabelos. ela quase desmaiou ao constatar que com os cabelos molhados, os cabelos negros brilharam ainda mais, deixando aquele rosto muito mais atraente. Resistiu um pouco, pensando em sair correndo dali, mas, ele olhou para o lado e a viu. Foi se deslocando bem devagar em sua direção perguntando com uma voz bem suave: - O que você está fazendo ai?

Ela se encolheu um pouco diante do nervosismo que a apavorou naquele momento, já um tanto arrependida de tal ato, mas, respondeu com a voz controlada: - Estou olhando para você!

- Isso eu percebi, disse ele em tom brincalhão: - Só não sei o que se passa em sua cabeça!

Sua cabeça rodopiou, aquele olhar a deixou tão vulnerável, que a fez se aproximar um pouco mais e com os olhos iluminados e a boca entreaberta, se ofereceu a ele sem pensar. Foi um beijo rápido e cheio de significado, pelo menos para ela. Sentaram-se numa pedra e começaram a conversar como dois grandes amigos, ele fazendo pergunta e ela respondendo meio sem graça: -Preciso ir, ele comentou antes de se levantar, ela baixou os olhos, ainda sentindo o gosto dos lábios dele nos seus. também se levantou e tomaram direções opostas, ela voltou para a bica e ele subiu em direção a casa de seus pais.

Dias se passaram, ela o evitou o quanto pode, não poderia encará-lo depois do ocorrido, e ele, por sua vez, nem dava sinais de que se importara.

O amor que ela nutria por ele, ia muito além da presença física. Ela sempre achava um jeito de vê-lo pelos buracos da parede ou adentrando a mata e furtivamente, se encolhendo atrás de algum arbusto, só para vê-lo passar.

Nunca mais se falaram a sós, parecia que aquele beijo fora fruto de sua imaginação, mas, que mudara para sempre a sua vida naquele lugar. Sentia que pertencia a ele e as manhãs ficaram bem mais prazerosas só em pensar que ele chegaria para mais um dia de trabalho. 

A família dele era bem grande, todos trabalhavam juntos e eram boas pessoas, muito simpáticas e prestativas, trazendo muita satisfação para ela e sua família, que acabaram se tornando bons amigos.

Ela ainda estava esperançosa de que um dia eles pudessem ficar juntos, não havia pressa, talvez, com um pouco mais de idade, ele pudesse promover algum encontro, ou talvez, pedisse a sua mão para seu pai.

Os anos se passaram, o amor só aumentava e nada! Nem sequer um olhar mais demorado, nada!

Até que um dia soube da novidade.

Estava um dia muito quente, daqueles em que até a saliva pode queimar os lábios. Ele chegou na porta de sua casa, pedindo um copo de água fresca. Ela foi até o balde, encheu um copo e entregou para ele. Ele sorveu o liquido em pequenos goles, enquanto a encarava nos intervalos. - O que foi? ela perguntou: - Por que me olha assim?

-Assim como? ele respondeu: 

-Desse jeito que não entendo!

-É que eu preciso te contar uma coisa, antes que você saiba de outro modo!

-Que coisa!

-Eu vou me casar!

- Casar?  - Mas como, se nem está namorando?

- Pois é! - sabe por que não te procurei mais?

- Por que não quis, ora!

- Não, resposta errada. Eu quis e muito! Só que não achei justo te enganar. 

- Como assim, me enganar?

- Na minha cultura, são os pais que arrumam casamento ao filho mais velho, porque, é o filho mais velho que fica morando junto e cuidando deles quando se casam. 

- Como assim? - O filho mais velho não se casa por amor?

-Não! O amor chega depois. Deu uma bela gargalhada achando graça de tudo, enquanto ela balançava a cabeça de um lado para o outro sem entender.

E foi assim que os sonhos mais lindos que ela já teve na vida se desvaneceu. Ele continuou trabalhando perto de sua casa, ela continuou vendo-o todos os dias, até que aquela paixão foi embora, assim como veio, deixando-a livre para outras experiências.

Hertinha Fischer
















Pétalas de razões

 Despediram-me ainda

na aurora, para, que, o
dia, me acolhesse por inteira,
antes, que, a noite, me mostrasse
outro lado.
Havia pontes - idas e vindas,
a mostrar intenções, que, por
detrás, de tudo, se findava e recomeçava.
Pediram-me que caminhasse devagar -
sem comprometimento algum
com as passagens estreitas e desertas, que,
por certo, haveria de encontrar.
Ensinaram-me amor em qualquer
instante, fé em cada passo e confiança,
especialmente, quando precisasse de
algo mais que apenas coisas.
Quando, por fim, tive
que sair do casulo, já me sentia tão forte
a ponto de sair voando, desbravando,
sem, no entanto, me sentir corajosa
demais.
Colocaram uma balança em minhas mãos,
para ir dosando sonhos, uma fita métrica em cada pé,
para não dar o passo maior que a perna.
E assim, cresci, a sombra do bem-querer, sobre pétalas de
razão, perfumadas com emoção, sem, no
entanto, pensar ou desejar mais do que me cabe.

sábado, 2 de agosto de 2025

Mente e coração

 Ainda estou á desvendar esse labirinto de tijolos e telhas, onde minha

alma se esconde num corpo já carregado de lutas e labutas.

Ainda quero andar, ainda quero voar mais um pouco na

ponta dos pés.

Como quem, parado, translada por dentro.

A ultima gota não secou, transborda sereno.

Não quero coisas, quero para além delas,

as estrelas não se apagaram. Há um céu

de encantos e de desencantos nos cantos.

Uma porta pequena ainda se abre, e uma

certa suavidade para além das cortinas das

janelas, voltadas para tempos e contratempos.

Se tivesse o poder de voltar, mudaria algo? talvez!

Esse gosto que ainda provo em rostos que nem

mais vejo, Onde estariam agora, se ainda estivessem?

Há um desejo que ainda perdura, uma abertura entre

a mente e o coração, que ainda guarda o que o tempo escondeu.

O "meu tempo" se passou entre as urtigas, temperadas com sal,

quando meus passos soaram, absorvendo as gotículas suaves

da vida. 

Sempre havia sorrisos na boca da noite e suavidade nos olhos do sol.

Hertinha Fischer.










segunda-feira, 21 de julho de 2025

Olhos cansados de ver

 Sempre estive oculta por dentro,

nunca deixei transparecer a obsessão de minha alma

que, herege, flutuava dentro de mim, como

um pássaro sedento á procurar por água,

mesmo estando perto de um rio.

Havia de descobrir, por mim mesma, o ocultismo

das mentes solitárias, que se embrenhavam em pensamentos,

por vezes, negros, sem deixar transparecer.

Todos temos um lugarzinho secreto, um paraíso ou

 um inferno de nós mesmos, algo inexplicável que nos impulsiona para o abismo

da ansiedade.

No inicio, há uma comodidade por dentro, algo como um

despreparo psíquico, nada tem de sentimentos.

Com o passar dos anos, a mente desperta um desejo enorme

de ser como os outros. É nesse instante que nos perdemos

de nós mesmos.

Temos a fala, os movimentos, o cheiro, o paladar, a audição,

a visão ocular, objetos que aprendemos a manusear,

mas não sabemos ler o livro interno, então nunca aprenderemos

como pensar e como lidar com o desconhecido do sentir.

É como tentar andar na lua, sem nenhum equipamento

que engane a gravidade.

Temos lei e não sabemos interpretá-las, por desconhecê-la

completamente.

Assim como quem acredita em Deus e não

consegue acreditar no invisível.

Manusear com as mãos é fácil, manusear com os sentidos exige

muita prática que envolve emoções. E como

controlar as emoções sem danificar o

controle sobre nós mesmos?

Como entender o que nos causa dor?

Entender as diferenças de resultados individuais,

nos campos afetivos, financeiros, quando os ganhos e perdas

afetam diretamente a área, que, a gente nunca aprendeu a operar?

Nesse contexto, seria bom não se ter consciência de nada.

Ou melhor: consciência, todos temos, até os animais têm,

mas, bom seria ter consciência curta

Que não nos tornássemos donos do amor,

mas, que o amor fosse dono de nós.

Que a vida nos levasse até o ponto

em que viver fosse necessário,

e que nos trouxesse , de volta,

quando ela quisesse.

Melhor se ter bom resultado,

do que viver se escondendo da realidade,

caindo na contradição de um sentimento

que nem sequer sonhamos em compreender.

Todos os "outros" se escondem e nós nos fartamos de

visibilidade.

Um eu, protagonista de si, orientado por ego e estultícia.

Querendo sobrepor a sua natureza, de modo que sobreviva

em um púlpito imaginário, de onde possa pregar a si mesmo

como rei.

Tem uma casinha de barro que ainda mora em mim.
Lá dentro, cheia de ternura por fora.
Uma quietude como céu azulado, anjos rodeando
minhas janelas.
E o passar dos anos em marcha lenta, copiando-me e me
redesenhando em seus instantes.
O ar malicioso á receber o suave perfume que as flores de
laranjeiras, apaixonadamente, lhe atribuem , ainda abre caminho até as minhas passagens, celebrando-me e adocicando meus momentos.

Tudo transcorre como sempre, igual para toda obra que é realizada, onde o simples pensar se modifica

diante do irreal que os homens destacam, mas, que, o mesmo do mesmo, flui por dentro.

Ainda se pode ver pássaros fazendo seus ninhos, o céu continua azul, as flores se abrem, esparramando suas pétalas em tempo de partida, mas, os olhos se cansaram de ver e se fecham para o bem viver da percepção e a natureza se encolhe.

A correria, neste momento, são para as coisas que enferrujam, os sentimentos, antes, brilhosos como ouro, já se tornaram avermelhados, como olhos que recebem a poluição dos ares. E o coração já não aguenta o peso do corpo, que só olha para baixo, procurando por si mesmo nas sombras.


Hertinha Fischer





















quinta-feira, 17 de julho de 2025

Dia artificial

 Ausente de estilo, eu, sempre

eu, a me vestir.

A alma é o que me reveste.

Sou do tempo em que as coisas eram feitas para durar uma vida.

Por isso há tanta vida em meu olhar.

Decifrava a mágica das sombras - o meio olhar

do dia e o olhar inteiro de suas horas.

Ao tardar, a noite surgia, escondendo as cores

para debaixo do tapete.

E as sombras se tornavam intactas,

quebradas de vez em quando pela

luz fraca da lamparina a querosene.

Lá fora um sonar de arrepio - as formas,

amedrontadoras. Muitas vezes, até o silêncio

falava.

O olhar da lua cheia me encarando pelos buracos da

parede, me davam um certo alivio, sabendo,

que nada estaria tão escondidos na escuridão.

Só então, colocava a cabeça para fora do cobertor,

aproveitando um pouco da luminosidade desse olhar.

O cantar generoso do galo me despertava cheia de 

expectativas para viver, porque o dormir era uma forma de 

morrer por algumas horas.

O sol já se derramava em luz por todos os lados,

as sombras se dissipavam, aos poucos, devolvendo

as cores dos jardins, as falas das galinhas e a alegria

das abelhas.

E o astral dos humanos se aprontavam para brilhar.

Ah! que saudade.

Não há mais escuridão da noite, a cidade é um eterno

dia artificial.

O que me acorda é o barulho do motor,

sem asas para bater, apenas um ranger de pneus

no asfalto e o olhar da lua não mais atravessa minha parede.

Hertinha Fischer








sábado, 12 de julho de 2025

Lágrimas de sol

 E aquele charmoso chão que relava nos pés,

acobertado de pó vermelho.

Brincava de rachar calcanhar;

adentrava, colorindo os sulcos.

A relva, que, de manhã, soletrava

gotas, como lágrimas de sol, a poetizar

a manhã.

O colorir das minhas íris, esverdeada

pelas folhas trepadeiras a balançar

com o vento.

O coração saindo pela boca, em um frenesi

de pulsar.

Quantas histórias haveria por ali, esquecidas

pelos que ali passavam.

 Minha imaginação os buscavam em cada

vala aberta.

Havia, por ali, árvores lendárias, contando

os anos em anéis.

Esparramavam as orquídeas por sobre os

troncos, como chuva de ouro puro.

Agrupavam-se diante do tempo presente,

arrastando o passado com elas.

Eu, ainda presente, passeei entre elas, e

um prazer de estar, carreguei comigo.

Talvez, também já tivesse sido passado, voltando

a minha natureza, transladando em torno do tempo.

Hertinha Fischer






sábado, 5 de julho de 2025

Leitura da vida

 As vezes me encontrava tão sozinha, parecia estar num mundo só meu

Amava as pessoas, amava mesmo, porém, o perto estava longe.
Uso muito o termo "minhas estradinhas," a verdadeira amiga que me incentivava a ir em frente.
Queria conversar, aprender com os que sabiam, mas, não tinham tempo para mim.
Então, ia, meio que tateando, segurando aqui e ali, até poder descobrir onde se encontravam as coisas.
E as coisas apareciam, escondidas dentro da imaginação.
Quantas vezes, o rio soletrava poesia. As ramadas derramavam charmes por entre as árvores, e eu, ia conhecendo, outros modos de amar.
Quantas fantasias se aplicavam á minhas andanças, quase que á se fundir com a realidade.
O espaço em que cabia meus pés, continham mais historias do que o próprio caminhar. Me contavam de sonhos distantes que ainda havia para sonhar.
A prova estava no horizonte.
A noitinha, quando tudo parecia dormente, as luzes se acendiam, ao longe, como pontos luminosos em novos céus desconhecidos, apontando outros mundos a se descobrir.
As vezes, era a princesinha dos olheiros das formigas, noutras, apenas a raposa querendo caçar a esperteza.
As descobertas tão vagas, o ouriçar dos ouvidos a procura de sons, no palavrear sutil do sertão já fragmentado pelas plantações.
A semente rasgando a terra, tão frágeis e tão fortes ao mesmo tempo, submergindo, ganhando formas e cores, como se, de antemão, conhecessem o caminho planejado.
Repentinamente, quase tudo me parecia familiar.
Tudo me parecia compreensível, até mesmo o que não sabia, parecia saber. Interpretava cada olhar, como quem interpreta um texto bem escrito.
A mente, eu pensava: tudo depende de como se usa. Com que curiosidade se busca conhecimento.
A vida é um livro aberto, pronto para qualquer pessoa que ousa lê-lo sem preconceitos.
Hertinha Fischer











segunda-feira, 30 de junho de 2025

Eu dando vida as coisas

 E o caminho era suave - sem obstáculos

na pronúncia das flores.

Um perfumado sonar de cores e risos,
que se estendiam na passagem dos olhos.
A liberdade corria como balsamo nas veias,
colorindo as entrelinhas da alegria escancarada.
Corpo e mente sintonizada com o vento
a bater levemente nas folhas.
Espaço pequeno mundo - resumidamente geográfico.
Pedrinhas sem cor, acolchoando o amarronzado
corpanzil das estradinhas empoeiradas.
O mestre saber, do tempo, escrevendo em si mesmo,
nas folhas brancas e soltas do ar.
Uma mente dançante, a copiar o ventre das folhas espalhadas pelo chão, dando vida a magia
de um ser.
Ser que nem sequer sabia ser.
Um corpo pequeno e de poucos dias,
á sonhar com a realidade abstrata,
Em seu redor o vento continha verbo,
personificando o oco do espaço.
A corrida que do coração escapava,
abrindo o caminho dos lábios para sorrir.
A dança do tempo que não parava,
enquanto o corpo cantava o silêncio
das coisas.
Tudo era vivo, mesmo o que parecia morto.
Se ali continha, existia,
se existia tinha propósito,
na alegria de me ver passar.
Hertinha Fischer



domingo, 29 de junho de 2025

Não houve nós dois

 Havia luz naquele olhar, capaz de eletrocutar

toda minha defesa.

Surgiu, repentinamente, em minha estrada,

andando desmascarado e sutil.

Olhei e adoeci no mesmo instante, sabia que morreria de amor.

Meus olhos o acompanhavam, mesmo sem corpo presente..

Meu coração o chamava até que me ouviu.

Parecia que o tempo, de felicidade, rodopiava abaixo dos meus pés.

Seriam instantes jamais explicados, Todos voltados para aquela luz.

Tão pouco tempo e pareciam séculos. Cada encontro permanecia 

como uma eternidade que se estendia até o outro encontro.

Dizia eu: - Feitos um para o outro!

Só não sabia que nada existia do lado de lá.

Um incêndio de magia consumia toda a razão.

Me preparava, a cada encontro, como uma rainha se prepara para seu rei.

Parecia, diante da ilusão, de que a recíproca era verdadeira.

Os beijos doces, regados a chocolates e goma de mascar de hortelã,

tatuavam o coração de gosto.

As ternas risadas e carícias intencionais, os passeios de mãos dadas,

o ir para a cama,  depois da despedida, levando o gosto da felicidade para os sonhos.

O esperar pelo próximo encontro, o ronco da moto chegando, toda sexta,

a tarde, a garupa quente, dos abraços aconchegantes em sua cintura.

As gotículas do sereno nos envolvendo, o amor se revelando em mim, em

você.

O mundo se resumia: nada existia sem você.

Até aquele dia!

Tarde de sábado, ensolarado e cínico.

Esperava o ônibus, a fim de voltar para a casa de meu pai.

E ele apareceu, repentinamente, como vento de tempestade.

-Onde vai? perguntou: 

-Na casa de meu pai, respondi: - Ele me espera!

Sem nenhuma piedade, parecendo que não me ouviu, ele retrucou:

- Vai nada! vai se encontrar com outro!

- Que outro? me ouvi perguntado:

 - Não sei,

você é que vai me dizer!

Já disse que meu pai ficou viúvo, e me espera, todo sábado,

para que faça o almoço de domingo e que cuide

de suas roupas.

- Mas não é o que estão dizendo!

- Quem "estão" dizendo?

-Alguém que não posso dizer o nome!

- Sinto muito! disse eu:  quase a sacolejar os nervos.

- Se você for, você dança! 

E  dancei, porque fui!

Cuidei de tudo antes de voltar para vê-lo no domingo a tarde.

Passou-se aquele domingo, o domingo seguinte,  assim, sucessivamente,

até hoje não entendi aquela forma de amor. Só sei que nunca mais

houve dia seguinte para nós dois. 

Hertinha Fischer










sexta-feira, 20 de junho de 2025

Marchinha do acontecer

 E as nuvens espessas se alinharam

no semblante do sol azul
Quando o amor despertou o urso,
sobre o gelo que se formou no sul.
O mar tornou-se açucarado, quando
o amor acendeu a luz.
Poeira de areia que o vento, enfim, levantou
Trouxe alegrias, fartas, e marolas a quem amou.
Sobre o terço que se reza, continhas conta
os dedos,
O amor quando revelado, de ambos os lados,
solta coragem e arranca os medos.
Hertinha Fischer.

Sinônimo de amor é sonhar

 Se estou aqui, estou parando,

se vou ali, estou andando,

ninguém segura esse coração,

quando estou sonhando.

Se estou na roça, estou trabalhando,

se fico em casa, estou descansando,

ninguém segura esse coração, 

quando estou sonhando.

Se estou alegre, estou me consolando,

se fico triste, estou lembrando,

ninguém segura esse coração,

quando estou sonhando.

Se chego em casa, estou chegando,

Se saio, estou passeando,

ninguém segura esse coração, 

quando estou sonhando.

Se olho para o céu, estou orando,

voltando pra terra, estou voando,

ninguém segura esse coração,

quando estou sonhando.

Se estou deitada, estou lembrando,

Se estou dormindo, estou sonhando,

ninguém segura esse coração,

quando estou amando.


Hertinha Fischer.


quinta-feira, 19 de junho de 2025

Emoções e fracassos

 Estava eu, sem chão, naquele momento.

Acostumada a ter meu pai na direção, comandando as

tarefas, e nós, sobre seu comando, trabalhando e se

desenvolvendo. 

Repentinamente, nos vimos sem esse auxilio.

Sem ferramentas adequadas para continuar na lavoura, como

um motor de irrigação, por exemplo, meu pai se viu obrigado

a tomar outras direções. 

Sem aviso prévio, a plantação já não se desenvolvia bem,

as sementes não mais despertavam como antes.  A plantação seguia

lenta e sem o desenvolvimento necessários para finalizar-se com saúde.

E por várias vezes, a gente perdia tudo na roça, sem proveito algum na colheita.

Antes mesmo disso acontecer, meu pai já trabalhava como intermediário na

venda de sementes de cebola, que, naquela região era muito bem aceita.

Foi então, que apareceram mais dois produtores da região sul, que o procuraram

para revender essas sementes naquela região.

Como meu pai não necessitava mais de nosso trabalho, nós passamos a trabalhar

como diaristas para outros agricultores, enquanto meu pai se comprometeu ,exclusivamente,

em suas vendas.

No inicio até que era divertido, poderíamos ganhar o nosso próprio dinheiro, e ficar com ele, já que nosso pai, não nos dava nada além de alimentação, moradia e vestes.

Até que, em determinado dia, ele começou a resmungar algo como: - Vocês precisam tomar uma decisão em suas vidas, Até aqui eu cuidei das necessidades básicas de vocês, mas, está na hora de cada um cuidar de si.

O que ganho com vendas dá muito bem para mim e sua mãe, mas, para tratar de todos vocês como adultos, vai sair muito caro.

Eu ainda era uma jovenzinha de quatorze anos de idade, embora, já me sentisse bem mais madura do que minhas irmãs mais velhas. E fui ficando incomodada com o jeito do meu pai agir. De repente, ele não mais precisava de nenhum de nós?

Numa tarde ensolarada, quando a noite já preparava sua chegada, chegou um carro em nosso quintal, com quatro ocupantes.

Vinham de uma cidade que me era completamente desconhecida. Estavam a procura de moças para trabalhar em sua lanchonete.

Não tenho e não tinha, naquela época, nenhuma ideia de como chegaram até nossa casa. Sei que acabaram encontrando o caminho de meu destino.

O homem e a mulher eram os donos da propriedade, e outros dois, seus funcionários.

Foi uma conversa rápida. Decidido ali mesmo, em nosso quintal. E repentinamente, antes que a noite avançasse muito, já me via dentro do carro, ao lado de minha irmã numero quatro e os dois desconhecidos rapazes.

A viagem durou aproximadamente uma hora, talvez. O silencio arrebatava a quilometragem. 

Quando chegamos ao local, entramos por uma grande porta, E dentro do estabelecimento, havia um grande balcão de madeira, com alguns banquinhos encostados em frente. Algumas mesinhas  e pequenas cadeiras de madeira, dispostos em um médio salão. Dentro do balcão havia um outro balcão, embutido na parede. Uma chapa de lanche e várias garrafas de bebidas dispostas numa prateleira acima . Ao lado, uma geladeira de porte médio. 

Atravessamos esse compartimento e entramos numa espécie de deposito, com vários engradados de garrafas de cervejas e refrigerantes. E mais a frente havia uma cama, beliche, já pronta,  para nós duas dormir. Ao lado um pequeno banheiro com chuveiro.

E foi assim, meio que, silenciosamente, que toda a mudança começou.

A tarde, o ambiente mudava um pouco, varias pessoas, se aglomeravam, encostados no balcão, enquanto eu e minha irmã os servíamos meio timidamente, Depois de alguns dias já mais soltas, com um pouco mais de pratica, fomos aperfeiçoando a forma de atender os clientes que ali chegavam para lanchar, ou simplesmente relaxar, depois de um intenso dia de trabalho.

Certa noite, estava eu, fazendo sanduiches para dois clientes, e quando me virei, havia mais quatro pessoas para atender. Reparei que havia um rapaz entre eles, que assim que me viu, não tirava os olhos de mim. Outros três, aparentavam ser bem mais velhos que ele. Muito tempo depois fiquei sabendo que eram tios e sobrinho, e que o rapaz tinha dezenove anos de idade. Vieram na cidade, para instalar um parque de diversão. Seus tios eram os proprietários e ele, estava passando um dias na casa de um de um  deles, aproveitando para passar alguns dias com eles no parque.

Ele apareceu mais algumas tardes e sempre me olhava com aqueles belos olhos verdes. Numa noite, quando eu recebia o valor de consumo, seu tio me deu mais do que devia, quando fui devolver-lhe o troco, ele não quis receber me pedindo que ficasse com ele, como caixinha. Eu fui colocar o dinheiro no bolso, e o rapaz, imediatamente, pegou em minhas mãos e me fez devolver para o caixa. Não entendi direito o que o levou a fazer isso, mas, como sempre, minha educação exigiu que o obedecesse.

Na quarta visita a lanchonete, ele me fez um convite para ir conhecer o parque de diversão. Como na noite seguinte seria meu dia de folga, aceitei o convite.

A tarde, tomei meu banho e escolhi minha melhor roupa, que nem era tão sofisticada assim. Apenas uma blusinha florida e um macacão jeans e um sapatinho de salto baixo. Sai para a rua toda contente, sabendo que o encontraria.

Logo que entrei no parque, as luzes coloridas, com diversos percursos e atrações como carrosséis, roda gigante, chapéu mexicano e algumas barraquinhas de jogos variados, me deixaram meio tonta. Nunca havia sequer chegado perto de um. Meus olhos o procuravam, nem precisei andar muito, lá estava ele, dentro de uma barraca. Assim, que me viu, pulou a grade e veio ao meu encontro.

Colocou seu braço ao redor do meu pescoço e foi me levando para conhecer o parque. Me levou para brincar no chapéu mexicano, e fiquei deslumbrada com tal acontecimento. Era uma delicia girar acima do chão, e poder observar a cidade de cima, como era noite, as luzes á deixava mais exuberante. Ele estava ao meu lado e ficamos nos olhando e rindo o tempo todo. Depois me levou na roda gigante, e assim, fui conhecendo toda a magia de um parque de diversão, honrando o nome que levava.

Depois de nos divertirmos bastante, chegou a hora de subir de volta para casa. Ele se ofereceu para me acompanhar. Quando já estava quase chegando, paramos, nos olhamos e nos beijamos. Eu já havia beijado alguns rapazes, esporadicamente, quando ia no cinema de minha cidade com minhas irmãs mais velhas. Nos domingos, nosso pai nos dava o dia livre. Depois do almoço, deixávamos a cozinha limpa e podíamos fazer o que quisermos. Como a única opção que tínhamos a noite era dormir cedo para acordar cedo na segunda feira para trabalhar. Quando tinha um filme bom passando no cinema, nós íamos, de ônibus, até a cidade que ficava a mais ou menos uns vinte quilômetros de nossa casa. Apesar de ter que andar por cinco quilômetro a pé até chegar ao ponto, e depois, voltar tudo a pé novamente.

O filme começava as oito horas e terminava as dez. E o ônibus saia do seu ponto as dez, então, não dava para assistir o final do filme. Já que, para chegar do cinema até o ponto, Tínhamos que andar uns dez minutos. Mesmo assim, a gente ficava feliz demais por poder fazer algo diferente do cotidiano.

Como o cinema, na época, era um lugar de encontro, sempre havia rapazes do nosso bairro, que tomava o mesmo ônibus, e consequentemente, como bons adolescentes, o ônibus passava a ser um ótimo lugar para paqueras. Que acabava em convites para assistir o filme juntos. Numa dessas vezes, ao invés de assistir a um filme que não tinha final, se trocavam caricias. E foi assim que acabei ganhando o primeiro beijo, seguidos do segundo, terceiro, e outros vários. Longe da vista do meu pai, tudo era divertido. 

Não passava disso, na segunda feira tudo era esquecido, diante do trabalho árduo na roça. 

Mas aquele beijo foi bem diferente, tinha uma conotação mais ardente, algo que jamais havia imaginado, seria amor? Talvez!

Nos dias que se passaram, a gente dava sempre um jeitinho de nos encontrarmos, as escondidas, longe de olhares curiosos que pudessem gerar fofocas maledicentes. E os beijos se multiplicavam.

Certo dia, enquanto ainda havia eu e ele, Seria meu dia de folga. Resolvi ir para casa de meus pais e lhe contei.

Foi então, que pediu para que nos encontrássemos no terminal de ônibus da cidade. Eu, como já mencionei, morava na lanchonete de uma cidade um tanto distante da cidade que fazia ligação com o sitio que meus pais moravam. Ele viria de outra cidade, onde seus tios moravam, sentido contrario de mim. E foi no exato momento que eu desembarcava do ônibus que me trazia, ele desembarcava do ônibus que o trouxe. E nós nos aproximamos, nos beijamos, ele pegou em minha mão e começamos a passear pelas ruas como se nada mais existisse a não ser nós dois. 

Ainda era de manhã bem cedo, perto das oito horas, e eu tinha que pegar um ônibus as quatro horas da tarde, rumo ao sitio de meus pais. E ainda teria que andar cinco quilômetros a pé, depois do desembarque. Havia na cidade um lugar muito bonito, chamado cruzeiro. Onde havia várias pedras e jardins com uma grande cruz de ferro, situado num lugar bem alto, de onde se poderia ver a cidade inteira. E nós subimos até lá. Não havia ninguém por perto, e pudemos conversar e namorar em paz. 

Passamos o dia em nosso mundo, sem comer e sem beber água, nos alimentando de beijos. Apenas quando apareceu, por acaso, um sorveteiro, é que ele comprou um sorvete para ambos. Quando percebi já tinha passado das quatro horas da tarde. E o último ônibus que me levaria até o sitio, saia as seis, então, meio relutantes, nós tivemos que descer e nos despedirmos. E foi assim, que ele me deixou, com a lembrança do ultimo beijo e um leve aceno de mão.

Quando desci no ponto, já estava escuro, E tive que ter muita coragem para caminhar cinco quilômetros sem luz. Fui rezando, e limitei-me a distrair com a doce lembrança do encontro. Ainda sentia o perfume em minhas mãos, e o gosto dos inúmeros beijos trocados.

Passei o final de semana em transe. E na segunda feira, voltei para o trabalho, que transcorria sem muitas novidades. O meu amor foi embora pra cidade em que morava, e desta vez, era bem mais longe, a 374 quilômetros de mim.

Passou-se varias semanas até que, um dia, uma carta chegou. Vinha de uma loja de móveis que ficava do outro lado da rua. Um funcionário veio me entregar. Fiquei  muito surpresa quando vi o nome do remetente. Nada mais, nada menos, que ele. Com papel de carta, cheirosa e delicada, com uma gravura de duas pessoas abraçadas no alto de uma colina,  com uma boa caligrafia que dizia assim: - Meu amor, como você estava linda nesse dia. Sinto tantas saudades suas e meu amor não cabe nesse papel. Este foi o dia mais lindo de minha vida. Beijo!

Poucas palavras que trouxeram alegrias imensas para meu coração.

O tempo passou, veio mais uma carta bem romântica e depois o silêncio.

Trabalhei mais alguns meses na lanchonete, depois pedi para sair e fui trabalhar numa padaria próxima. O salário era maior e o trabalho bem mais divertido. Mais gente trabalhando, mais gente entrando e saindo, e assim fui fazendo novas amizades, E como não tinha mais o deposito para dormir, aluguei um quarto numa pensão, onde vieram morar comigo, uma irmã e uma amiga.

Certo dia, após uma longa jornada de trabalho, Já estava quase na hora de sair, chegou uma senhora que costumava a passar por lá de vez em quando para tomar um café. Era muito brava  e a gente gostava de irrita-la. Não me lembro o que foi que eu falei, e ela imediatamente, levantou a bengala para bater em mim, eu agachei no balcão ficando de cócoras, e quando me levantei, lá estava ele, com cara de preocupação, olhando para mim. Fiquei muito surpresa ao vê-lo. Estava chovendo naquela hora, e seu cabelo muito mais encaracolado  por estar molhado. Vestia uma camisa cor de caramelo, calça azul e sapato preto, lindo e elegante como sempre. 

Começou dizendo: Nossa! levei um susto quando via aquela senhora querendo te agredir! Eu apenas o olhava como se fosse uma alucinação. Gaguejei um pouco ao responder que já estava acostumada com a senhora e que, ela não fazia mal nem a uma mosca. Como estava quase na hora de acabar meu turno,  pedi que me esperasse.

E foi o que ele fez.

Minha irmã que também trabalhava ali, me ofereceu um guarda-chuva e me aconselhou a leva-lo ate a pensão. Na hora fiquei meio sem jeito, mas como estava chovendo muito e sem ter onde ficar para conversarmos, pedi a ele que fossemos até a pensão. E novamente nos perdemos um no outro, ele me beijava ardentemente, enquanto sussurrava em meu ouvido: - Quanta saudade!

Naquela época havia muito respeito por parte dos rapazes, eles nunca tentavam nada a mais do que simples beijos. E foi o que aconteceu. Conversávamos entre um beijo e outro.

Ele me contou que viera na casa de seus tios e já estava voltando para sua cidade, e não resistindo, resolveu vir  me ver. Que eu estava linda e que ele desejava estar sempre comigo, mas, que estudava e trabalhava, e como a cidade em que morava era longe, não podia me ver com muita frequência. Eu não perguntei nada, nada mesmo, só ficava inebriada com seus beijos quentes. Veio a hora da despedida, eu o levei ate a porta, sentindo meus lábios inchados, sentindo uma certa vergonha por causa disso. E ele se foi.

Eu com quinze anos, ainda sem nenhum preparo para o romance, fui adentrando a solicitude tempo, me achando a rainha das horas, perdida nos embaraços das emoções. Sem palavras para defender o que sentia, deixei-o ir. E os momentos tão sublimes foram se apagando ante outros encontros e decepções.

Só agora,  com sessenta anos de idade, amadurecida e repleta, de vida, por dentro, consigo, enfim, falar dos sentimentos profundos que despontava em mim, ainda em tenra idade, das quais as palavras ainda me eram tão escassas. Se fosse hoje, sem duvida, eu te diria, que te amei!

Hertinha Fischer











sábado, 14 de junho de 2025

Estação de cada vez

Sempre acreditei no tempo,

havia, em mim, a disponibilidade

de poder acertar tudo no dia seguinte.

Mas, entender, como entendia, não seria

para os outros.

Os erros que cometia, ficavam desfigurados,

após a noite. Nunca guardei nada para o amanhã.

O meu dia era e é apenas um dia.

Não se vive o amanhã de hoje.

Não é necessário arrastar tudo para

debaixo dos lençóis.

Muito menos, plantar magoas em sonho.

Pode-se guardar munições para guerras futuras,

Porém, não se usa munições sem que haja

guerras.

O que nos serve, nos serve em vida.

Depois que se morre, nada nos serve.

Hertinha Fischer






sábado, 7 de junho de 2025

Feitio da vida

 A vida me exibia feito dela,

nem me reparava e lá estava.
Não havia escolha,
sentido me levava.
Assim como uma frase bem escrita,
dentro de um conto inteiro, lia,
não entendia.
Almejava céu e era terra.
Um ser dentro de um universo,
e nem de universo sabia.
Movimentos de figuras, gente!
E que eram outros componentes?
Ousar defesa sem culpa, culpar-se
por ser.
As cegas, ir e vir, descombinados caminhar.
Saber o que sabiam, ensinar-me sem compreender.
Que mundo rarefeito e desconecto - nascer num meio desconhecido e ter que sobreviver.
Talvez seja por isso que a vida,
nos negue conhecimento, logo ao nascer.
Nada se perde, tudo é um amontoado de mesmas coisas.
O que não se copia, não se cria, ou se ausenta da superioridade,
sem novidade, só superficialidade.

Hertinha Fischer

segunda-feira, 2 de junho de 2025

O eu que se perdeu

 Não é só o eu passando,

mas tudo que do eu procede.
Um sopro que do ar se fez vento,
uma sombra solitária que saiu ao meio dia.
As ondas que morrem na praia,
a areia que se afoga na orla.
O pulsar de um coração sem sangue,
A magreza em meio a muita gordura.
O alto em lugares baixos, a luz em dia
sem lua.
Alegrias de momento, somos.
Curvados e amedrontados, eretos.
Sedentos de amor dos outros,
sem amor por si mesmos.

Hertinha Fischer.

domingo, 1 de junho de 2025

Bioalegria

 Nunca me entristeci com coisa alguma,

embora já tenha chorado muito.
As situações com as quais não podia lidar,
deixava para o tempo resolver á sua maneira.
Enquanto vivia, procurava absorver todas
as etapas com entusiasmo, mesmo quando,
não dava certo.
Nasci na pobreza, minha casa era limitada: apenas a cozinha, uma
parede e um quarto, abrigando sete pessoas.
Quando acordava e para fora, saia, tudo aquilo que meus olhos
alcançavam era meu.
Os cabelos que dançavam com o vento, a estradinha que circundava a terra, brincando de esconde-esconde com meu olhar curioso.
O riacho tão pequeno, segurando as águas em seus braços.
A jabuticabeira, sentada as margens, soltando flores brancas por sobre seu corpo, transformando-a, do dia para noite, em pequenas bolas negras e adocicadas.
O corredor de terra batida, atapetada por vegetações alegres, fazendo cocegas na sola do meu pé.
A tabua de lavar roupas, deixando-se envolver por musgos, só para nos ver escorregar pra dentro do rio.
As canções de radio, que a tarde incitava, acordando a noite e recebendo o dia com suas belas poesias.
A ribanceira que recebia um córrego, bem no centro de seu ventre, deslizando vagarosamente, como um brilho de sol.
A bacia velha que nos banhava, para depois nos ver brincar, pendurada no galho de um pessegueiro.
A roça viçosa que nos sondava de cima, louca para vir brincar com a gente.
E as pessoas - os conhecidos, morando longe, morando perto, trançavam amizade com carinho.
Havia uma certa obediência, fruto da hierarquia da natureza e do tempo.
Cujo patriarca seria Deus!

Hertinha Fischer.

sábado, 31 de maio de 2025

O sol também ama

 Me encantava com as cores da tarde, 

despejada na entrada da noite,

enquanto se preparava para receber a

visita da lua cheia.

Costumava deitar lá fora,

pousando o corpo quase adormecido,

rente ao chão frio, apenas um manto

de saco de estopa nos separava.

 Olhava para o céu como se pudesse tocar

as estrelas com as mãos.

Seu brilho intenso pulsava dentro dos meus olhos.

Enquanto a boca da noite assoviava uma

canção suave, adentrando com paixão

em meu coração.

Dizem que a noite é poética, faz poesia em

plena escuridão, só para enternecer as estrelas

que se enamoram do sol distante.

Acende as suas luzes para que se lembrem 

que elas existem.

Hertinha Fischer





sábado, 24 de maio de 2025

Alegria do saber

 Eu aprendia matemática contando as pedrinhas na estrada.

É claro que sempre acabava perdendo as contas, mas,

me divertia muito, enquanto, andava solitária, a caminho da escola.

Também foi assim que aprendi a sonhar.

Olhava com entusiasmo as borboletas que me cercavam, elas

coloriam minha história de momento.

As curvas, as retas, os círculos, as entradas, as saídas, a roça!

Ao adentrar a sala de aula, meus dedinhos seguravam o lápis

com tanta força, quanto a força que existia em minha imaginação

Desenhos, a princípio, tão desengonçado, iam desenvolvendo

músculos e ideais.

A escola tinha cheiro de sabedoria, não a sabedoria de se saber tudo, mas,

á de poder, enfim, descobrir.

A partitura das letras, que, procurava desvendar nas tabuletas espalhadas pelas estradas,

das quais pareciam querer me dizer algo muito importante, e que sempre me deixavam intrigada,

por não saber corresponder.

Aquele emaranhado de vogais e consoantes, que acompanhavam figuras, á tentar falar comigo, sem, no entanto, compreender.

A escola.. ah, a escola! que preciosa semente despertava em mim.

Ia muito além da estradinha, muito além de tudo que me rodeava, seria ela que me daria mais condições de saber um pouco mais sobre tudo.

As voltas do a, o laços do e, os pingos do i, o olho do o, as curvas do u. Tão difícil de desenhar, e tão fácil de amar.

Jamais pensaria que, um dia, pudesse fazer poesia com ela, e fiz!


Hertinha Fischer





sexta-feira, 23 de maio de 2025

Contando tempo

 Evoluía a tarde em suas andanças açucaradas,

embrenhando entre os galhos desleixados.

distribuindo fleches de luz nas íris floradas,

enquanto a lua já se fazia ornamentar atrás do morro inerte.

 Canções de cigarras e sabiás se fazia ouvir na boca do verão,

que acalorado, ainda, pela paixão eminente, se expandia,

baixando seu hálito quente sobre a terra.

Meu corpo sempre corria, para movimentar um pouco, de ar,

tornando mais leve o próprio respirar.

Enquanto os cabelos escorriam pelos ombros, os poros

iniciavam um lacrimejar, sistêmico, aliviando, um pouco,

o bafo quente da atmosfera.

A orquestra da noite começava a tocar a musica do silêncio,

onde os grupos dos sapos e dos grilos, conseguiam quebra-lo,

afinando as cordas de seus violões desafinados.

Tempo, de quanto tempo carecemos?

Apenas num segundo de luar, floresce tantos sonhos.

Hertinha Fischer








segunda-feira, 19 de maio de 2025

Dia de sonho

 Noite que chega, noite adentra,

cansaço que nunca sai,

Se vai por algum momento

para depois voltar atrás.

Um sorriso passageiro,

mostra o dente e vai ligeiro.

trás as bençãos do descanso,

que só finge que é manso.

Casos estranhos se conta

que a realidade desmonta

Assim que o dia clareia

o cansaço incendeia.

Queria, do sonho, o caminho

Só para continuar dormindo

sonhar que a segunda feira,

poderia ser domingo.

E da manhã, aquela paz

Nunca a tarde á desfaz.

Hertinha Fischer



domingo, 18 de maio de 2025

o sonar do silêncio

 Há lembranças que nunca se apagam,

como os luares de outros tempos 

e lugares.

Havia uma criança e a criança era eu,

um mundão á minha espreita, e o

pouco que sabia.

Mesmo sem ver, eu ouvia.

Pela manhã, o cheiro de café me chegava

aos ouvidos.

E me contava que era dia.

As comédias dos grandes pássaros,

que começava ao sol nascer,

tentando ganhar dos pequenos,

que os punha á correr.

Da grandeza da Tereza,

que o dia dava leveza

ouvia o seu cantar:

Essa vida é uma beleza.

Essa saudade que solta corre,

esfola a alma e nunca morre

Se fecha uma estrada,

logo outra socorre.


Hertinha Fischer







sábado, 17 de maio de 2025

Olhar que nada perde

 Nem preciso de muito espaço,

já tenho meu verde cantinho,
das árvores me dando abraços.
Sorrisos de ruas se abrindo
diminuindo todos os cansaços
portas que vão se abrindo,
gentes que vejo saindo,
crianças da calçada emergindo,
tornando meus sonhos mais lindos
Meus olhos á ver tudo as voltas,
nuvens que do céu não se solta
estrelas que que o ar sempre escolta
e o mar que nunca se revolta.
as tintas que se jogam no ar,
No encontro do sol e a chuva,
traçando suas suaves curvas
para o arco-íris traçar
E a alma que se alimenta,
de tudo que vê e que sente,
o corpo que nunca desmente
a alegria que as vezes se ausenta.

Hertinha Fischer

sexta-feira, 16 de maio de 2025

O segundo diluvio

 Acordei pensando no amor. E logo me veio a mente a figura de Cristo - sem rosto, de coração aberto.

Doando-se como o céu se doa as nuvens.
Fiquei meio atordoada e logo pensei: Quem conhece o verdadeiro amor?
As características do amor: não é soberbo, não é ciumento, não se orgulha, não é inconveniente, não procura seus interesses, não se ressente do mal, não se alegra com a injustiça, e se regozija com a verdade - Tudo suporta, tudo crê, tudo espera.
Isso me lembra o decorrer da vida, não é direcionado a nada que se refere ao individualismo,
Então pensei com meus pensamentos: Quem é o amor, ou para que serve o amar?
O amor somos nós, este é o sentido. A que devemos esse amor? A Deus que nos fez!
Serve para servir, sem, no entanto, usar de si mesmo para exemplificá-lo.
O amor em si, o amor em nós, o amor que equivale, o doador, o receptor.
Como um casamento perfeito, onde o doador e o receptor agem de maneira digna, justa e abençoada.
Ai me lembro das virgens, das lâmpadas, das bodas.
As prudentes se abasteceram o suficiente para esperar que o esposo abrisse a porta para a festa. As néscias
acreditavam que estavam seguras e que, o esposo, assim que as visse, abriria a porta, trouxeram pouco combustível para suas lâmpadas e elas se apagaram. E ao ficarem no escuro, pediram azeite emprestado para as virgens prudentes que, imediatamente, se recusaram, dizendo: Se dermos a vocês e o noivo se demorar, correremos o risco de também perder a festa.
Quando as néscias saíram para comprar combustível, o noivo abriu a porta do salão, as prudentes entraram,
O noivo fechou a porta, quando as néscias voltaram encontraram a porta fechada.
Assim também é a vida.
Muitos tolos não acreditam que a porta pode se fechar de uma hora para outra, se recusam a olhar com clareza, até que a porta se feche e fiquem de fora.
Aconteceu na época de Noé - Quase todos, exceto sua própria família, acreditaram em Deus e em sua palavra, quando disse que haveria uma grande inundação que cobriria a terra. Os ateus zombaram dizendo: Como isso seria possível. O mar estava em seu lugar, protegido em seus limites, os rios se acomodavam, cada um em seu lugar. Jamais choveria tanto para inundar aquela terra que era grande em extensão. Riram quando Moisés começou a construir a arca, e mais ainda quando começou a coletar os animais para salvá-los. Mas, certo dia começou a chover sem parar, e não parou por cinquenta dias, a arca começou a emergir, os incrédulos que até aquele momento estavam alheios, cada um com seus compromissos, começaram a pedir socorro e o socorro não veio.
Se passaram milhares de anos e Deus vem dando oportunidade para que o amor nos leve ao arrependimento. E assim, possamos, através do exemplificado amor, viver uma vida equilibrada, deixando de lado todo tipo de rancor, inclusive aquele que nos faz esquecer o amor.
Obedecer é o caminho, sem obediência a porta se fecha e ficamos de fora, sem conhecer a gloria das bodas.
Poucos entrarão pela porta, e quando esta se fechar, tentarão arrombá-la, mas, já estará lacrada e selada.
É tão difícil acreditar que será assim, assim como naquele tempo, os incrédulos não acreditaram no dilúvio.
Muitos se agarram a vida que tem, acreditando que nunca vão morrer, e quando a lâmpada do corpo físico está quase se apagando, clamam por misericórdia.
E encontram a porta fechada, não há mais a quem recorrer.
O mar continua agitado, a arca se equilibra sobre as ondas e a terra já está inundada por águas impuras. E do amor revelado, só sombras e duvidas, assim, novamente, um diluvio se instala, só que desta vez, o mar tá dentro da gente.

Hertinha Fischer