Total de visualizações de página

Luz azul

  Quando olhava o que ele fazia, ficava extasiada. Era capaz de fazer qualquer coisa andar, especialmente, quando manejava seu tempo. Era me...

sexta-feira, 11 de novembro de 2016

Cantinho da memoria

Na verdade, eu carreguei tudo nas costas: meus desatinos, medos e
vaidades.
Não parei para ouvir. Aliás, nem abri meus ouvidos a nenhum
som que pudesse me fazer voltar.
Os precipícios iam se me abrindo. E, eu, os enfrentando, me
esfacelando  por dentro.
Não me opus a nada, tão perfeita era minha ciência, tão mesquinha
a minha procura. Não me dei conta dos que me queriam
bem, só importava a minha consciência, e aquilo que
me abraçava e me dava alguma sensação.
Nunca parei para pensar em mim, como alguém que
pode causar danos, minha suficiência, meu destino.
Estive nua, completamente nua de conhecimento, de
esperteza e de razão.
O juízo sempre me espreitou,  querendo me poupar, Porém,
 eu fugia dele.
Minha carne pedia mais e mais prazeres, e só me deparei
com prazeres alheios. Quando me usavam e tiravam de mim,
qualquer razão para ser feliz.
Não, eu não ficava por muito tempo, alguma voz que desconheço
me alertava sobre consequências, e sem perceber eu me recolhia
na solidão, muitas vezes.
Dizem que a solidão machuca a gente: - mas gente, também machuca!
È preferível, mil vezes, a lágrima sombria do esquecimento, que a tortura
do ser visível, cheio de marcas.
Brincando de ser feliz, como uma bonequinha de porcelana sentada
numa cômoda qualquer, a esperar que a vejam,  que brinquem com ela,
que a abracem, que digam de sua importância. Assim vivi muitos anos.
Até perceber que a falha estava em mim, na minha busca por alguém, a
espera de um amor que não vinha. Na ânsia de ser amada, muito
me perdi.
Dizem que a gente precisa se amar para ser amada. Faroleira! Não
pode existir sentimento trocado.
A gente só se sente bem quando não nos veem com indiferença. Quando
olhos amorosos nos atraem, quando realizamos a fotossíntese no outro.
Os experimentos da vida nem sempre dão certo, muitas vezes só nos fazem
infelizes.
Até que a flor miúda se desenvolva, cresça com a luz do sol, se forme no
ventre da terra, e abra espaço para ela mesma, fica a mercê do que lhe
oferecem.
Eu sai muito cedo do casulo, a primavera veio antes das flores, e a fome
me levou a comer pó.
Era o que eu sabia fazer, muito pouco, ou quase nada.
O mundo me atacava, se abria como lobo mau, e para qualquer
lugar que fosse, não havia proteção. Eu estava totalmente só.
E como lidar consigo mesmo, com o que sente, com o que precisa?
Tocando flauta no deserto, a sorrir consigo mesma, a dançar sobre as dunas
endeusadas, sentindo-se inútil.
Cada passo, uma punhalada, dores e desconforto povoando minha noite, e
de dia, muito mais.
Uma solidão dolorida, exaurida, planos de morte,
Pode parecer forte, pode parecer triste, mas é assim que me sentia.
Busquei na noite uma forma de sair, de sumir, de não mais sentir solidão.
Talvez, matando o meu corpo, eu pudesse, enfim, sair de mim, e me encontrar
num lugar melhor.
Mas, nem a morte me queria. La estive eu a vomitar essa vontade, e um anjo
me ajudando, fazendo expelir para fora aquele desvario.
Acordei sã, muitas visitas a olhar para mim com piedade, como se piedade
me bastasse?
Eu queria amor, eu queria cuidado,
E só me davam sobras.
Foram longos anos de suplicas, a pedir favor, a pedir paz.
Porém, as coisas só pioravam.
Foi então que conheci o amor. Era lindo! Como se eu pudesse flutuar dentro de mim.
Um arrebatamento, um sentimento divino.
O primo amore!
Algo encantador, que me fez exultar de prazer, chagar ao topo do mundo.
O sabor que eu experimentava era como o mais doce dos manjares, a luz
que se acendera em meu caminho, acabou com a escuridão, até as minhas noites se fizeram
dia.
Minha  feridas cicatrizaram, meu coração se desanuviou e eu só pensava em viver. me arrependi
de todo mal que fiz para mim.
Parecia outra pessoa no mesmo corpo.
Encontrei outra forma de olhar.
Estava muito sozinha ainda, mas, agora, preenchida pelo cuidado,
pela procura, pelo contato, pelos beijos e promessas.
As tardes eram maravilhosas, os fins de semana tão quanto.
Os braços a circular o meu corpo, o olhar de desejo, a pureza das
conversas, os sorrisos compartilhado.
O chocolate do beijo derretendo na boca, o açucarado do sentir amor.
Foram dias inesquecíveis, como tudo que é bom. porém, tanto amor
não sobreviveu. Sobreviveu em mim, mas, não foi compartilhado na
mesma intenção, foi mais importante para mim, do que para ele.
Numa tarde triste, ele se despediu e se foi.
E tudo virou cinzas de repente, meu sol se apagou, meu riso cessou,
e novamente, estava lá, sozinha e sem ninguém.
Só que, mais madura, mais forte.
Não era mais aquela menininha amedrontada, aquela sensação de que
poderia ser amada, me fez mudar. Me fez querer continuar a desbravar
minha estrutura, entender melhor a vida.
Não digo que não sofri, que não passei noites em claro, que não
o desejei perto de mim.
Até o persegui por algum tempo, até esgotarem-se a minha paciência,
pois, piedade, eu não queria.
E vieram novas conquistas, colocando tudo no lugar.
Passado o susto, novos acontecimentos foram explorados, absorvidos,
sentidos, gostados. Até que um dia os amores se encontraram; Os amores! isso
mesmo. no plural.
Eu não precisei me esforçar... dois corações com o mesmo parecer. dois pés
seguros na caminhada. um só caminho, um só desejo, um só cuidado,
uma só realização: O de ser e de fazer feliz.
Eu e o meu homem, na substancia. E a dor? ha! a dor! Esta se foi.
Herta Fischer



















Nenhum comentário:

Postar um comentário