Capítulo 1 ( Atitude)
Estava um dia muito quente,daqueles em que a gentedesfalece só em pensar.Anita colocou um pedaçode tecido enrolado sobre o corpo,despida de qualquer peçapor dentro.Estivera sobre forte pressão no trabalho,não tinha vendido nem um imóvelnaquela semana, nemsequer tinha algum cliente interessado.Com a autoestima, lá embaixo, pediufolga naquela tarde, só para espairecer.Precisava, urgentemente, de dinheiro - tinha o aluguel, taxa do condomínio e outrasprestações á pagar.Naquele momento só podia se lamentar pelos gastos desnecessários,devia ter escutado a sua mãe que sempre lhe alertava sobreguardar algum dinheiro para eventualidades.Gostaria de ter seguido seu conselho, mas de que isto lhe adiantaria agora?Pegou um resto de refrigerante que estava na geladeira, colocou-o em um copo,sorvendo os goles, apressadamente, quase se afogou. Riu de si mesma ao perceber sua ansiedade.Largou o copo sobre a pia e foi para a sala, deitando-se preguiçosamente sobre o sofá quente.- Ai! - Deu um gemidinho, suave, pulando para se levantar, exclamando em voz alta:
-Nossa! parece que estou dentro de um forno!
Foi até a janela e nenhuma brisa, tudo parado.
Pensou no quanto fora difícil chegar até ali.
Deixara sua cidade natal para se aventurar numa cidade maior,
e agora, estava ali, sem saber o que fazer da vida.
- Tudo parado, balbuciou: - até a minha vida está estacionada.
Mas, isto não vai ficar assim.
A palavra tem poder, alguma coisa precisa acontecer e é agora.
Acabou de pronunciar estas palavras para si mesma, quando seu celular tocou.
Correu até a cozinha, onde deixara o aparelho sobre a pia.
ao dizer alô, notara a voz aflita de seu companheiro de trabalho:
- Onde você se enfiou?
Estou te procurando em todos os cantos, por
sorte, me disseram que você tinha saído.
- É..- balbuciou sem nenhuma emoção: - desculpe, se não te avisei.
-Bom, o motivo de ter te ligado é o seguinte: - Tem alguém interessado naquela
casa da Rua Vergueiro, no Jardim Eulália.
Ela quase engasgou ao perguntar: - Co - como? - aquela mansão?
- Sim, respondeu o rapaz.
- E você, por certo, está segurando o cliente, né?
- Sim! ele está aqui e com muita pressa!
- Estou a caminho, me dê alguns minutos. vá enrolando o moço. Deu uma risadinha
nervosa. e completou: - Ofereça-lhe café! E desligou sem perder mais nenhum minuto de tempo.
Envolveu-se dentro do primeiro vestido que encontrou. colocou uma rasteirinha nos pés e saiu em disparada. teve que retroceder quando percebeu que nem sequer trancou a porta.- Eita! exclamou:Entrou no carro, as pressas, quase atropelando o jardineiro que gritou, vermelho de raiva: - Não olha por onde anda?- Desculpe, agora não, tá! depois nos falamos, e saiu em disparada.Já em trânsito, pensou em suas palavras, ditas quase sem perceber: - Palavra tem poder!- Agora não podia duvidar, só faltava fechar negócio.Estacionou o carro em sua vaga, pegou a bolsa, fechou a porta, acionou o alarme e subiu as escadas as pressas.Abriu a porta do escritório e na afobação em que se encontrava, nem percebeu a pessoa sentada de costas para a sua escrivaninha. Jogou a bolsa sobre a mesa, sem nem ao menos se dar ao trabalho de cumprimentar as pessoas.- Boa tarde! - ouviu uma voz melodiosa vindo do outro lado da sala:- Boa tarde, respondeu, assimilando a voz de seu companheiro de trabalho.Só depois se virou para a figura sentada em frente ao seu computador, dizendo: - Desculpe a espera, tive que sair para resolver alguns negócios pendentes, mentiu:Foi então que a ficha caiu, se viu desnorteada com a beleza do homem, um pouco sem graça e se mostrando efusiva, relaxou.-Então! começou a falar: Está interessado nesta casa? - interpelou o homem, jogando uma foto em cima da mesa.Enquanto o homem estudava os contornos para identificar o imóvel, ela o olhou de soslaio, por cima do computador. Notou a exuberância de seu pescoço e dorso, uma leve ondinha de cabelos brancos, entre cabelos pretos e bem cortados. uma camisa cor de marfim e uma gravata vermelha adornavam aquele corpo másculo, que descia até a cintura, de onde ela não podia mais enxergar, por ele estar sentado e de cabeça baixa.Uma onda de calor quase á sufocou, e se viu abanando-se com um pedaço de papel.- Está com calor? Uma voz macia e cortante ao mesmo tempo a fez despertar. Sentiu-se corando como uma menininha de colegial. Viu-se dizendo sem pensar: - pois é! E olha que estamos com o ar condicionado ligado!A seguir se arrependeu do que disse, balbuciando meio desconfortável: - Me desculpe, mas, é que estava lá fora e com essa onda de calor sufocante nem percebi que estava repetindo essa minha mania de me abanar. Ele sorriu, mostrando as carreirinhas de dentes bem branquinhos, e seus lábios se mostraram tão acessíveis que ela ruborizou mais uma vez, como se ele a tivesse beijado.Resolveu falar sobre negócios e deixar para lá o que estava sentindo em relação ao moço, afinal, concluíra: - Não estou aqui para paquerar, mas, para realizar o negócio do ano.Você quer ver o imóvel hoje? - se viu perguntando:Ele balançou a cabeça positivamente, para depois responder: - Se você não tiver nada mais urgente para fazer.- Não tenho nada para fazer - falou sem pensar.Tão logo se recuperou, não podia deixar transparecer o seu fracasso no trabalho.- Quero dizer: - nada que não possa esperar. - Vamos?- Ela se levantou de supetão, esbarrando na canequinha desenhada onde guardava suas canetas, e tudo foi ao chão.Ele contornou a mesa e abaixou-se para catá-las, dando de cara com um par de pernas bem torneadas e brancas como cera.
Reparou na cor de seu vestido, enquanto suas mãos fazia de conta que procurava por mais alguns objetos, possivelmente, caídos embaixo da mesa.
Levantou os olhos, devagar, subindo até o seu seio arredondado e bem feito, e se viu pensando em coisas que nunca imaginou pensar, não, pelo menos, até aquele momento. e também enrubesceu.
Mas, ela nem notou, pois, já se afastava tentando pegar a bolsa do outro lado da mesa.
- Sou muito desastrada, as vezes, falou: - complementando a seguir: - Como toda mulher que se preze.
Ele saiu em direção a porta, abrindo-a e segurando, enquanto ela passava a passos largos e seguros.
Quando ele conseguiu fechá-la, ela já descia as escadas, indo em direção ao estacionamento.
quase teve de correr para alcançá-la.
Sorriu consigo mesmo, se perguntando: - Que mulher é essa?
Anita, por sua vez, desligou o alarme, abriu a porta, acomodou-se e abriu a porta no sentido do passageiro. ele entrou, acertou o banco que estava muito para a frente, e ela aproveitou para passar os olhos sobre as pernas de seu acompanhante.
Mais uma vez se viu imaginando coisas. - Engraçado, ela pensava: - Nunca fui dessas coisas.
Agora me vejo a olhar as pernas de um homem que é meu cliente, como se fosse um paquera. E ainda por cima, admiro até a cor da sua calça. Caqui! - ela afirmou em pensamento: combinando bem com a cor marfim da camisa e a gravata vermelha, para completar um sapato bico fino, de um preto reluzente, como se tivesse sido comprado naquele exato instante. - perfeito demais! - pensou:
Só então ouviu o ronco do motor e concluiu já estar a caminho.Ele ficou em silêncio, observando a paisagem as margens das ruas. Ela nem precisava olhar para a frente, parecia que seu cérebro ativara um robô dentro dela, que indicava o caminho. E que caminho! - Ela pensava: - palavra tem poder! - e riu por dentro.Finalmente, depois de uns vinte minutos, ele interrompeu o silêncio: - chegamos!- Como você sabe? se ouviu perguntando:- Já olhei para a fotografia da casa tantas vezes, que não é difícil identificá-la. É aquela ali?- Sim, ela mesma! tinha até me esquecido do quanto ela é bela.Ele á olhou nos olhos quando ela desligou o motor se virando para pegar a bolsa do banco de trás. E ambos se mumificaram por alguns instantes. como se estivessem se perdendo um dentro dos olhos do outro. E o encanto de dissolveu rápido, antes que os levassem á algo que não tinham planejado.Ela pegou a bolsa e saiu do carro, ele fez o mesmo.Como se não tivesse acontecido nada, caminharam lado a lado até a porta da casa.Anita abriu a bolsa, pegou as chaves e quando foi abrir a porta, ele as pegou de suas mãos, assustando-a, um pouco, com a rispidez de seu ato.- Parece bravo! - ela falou quase que a sussurrar:Ele respondeu que não e que nem tinha motivos para isso, apenas quis mostrar-se cavalheiro.A casa era muito bonita por dentro, até mais do que por fora, isso ela já sabia, mas, queria ver nos olhos dele a mesma emoção que sentia. Não sabia bem por quê. A cada cômodo visitado, ele falava algumas palavras como: - Muito bom! Gostei disso!.Ela também não tagarelava como era de costume, até parecia que não queria vender a casa.No término da visitação, resolveu ser profissional outra vez; - vamos sentar! - afirmou, levando o dedo a sinalizar um banquinho disposto entre os arbustos. antes que ele decidisse ela se pôs á caminho.Um jardinzinho simpático apareceu de repente entre as árvores mais frondosas, encantando o seu olhar, mais uma vez, parecendo vir das profundezas de sua alma, já vira tantas vezes, mas, agora, parecia tão mais sublime. Seria o encanto daquele homem?Sentaram-se quase ao mesmo tempo, um ao lado do outro e um muro se ergueu entre os dois. Agora eram os profissionais. Ela, a vendedora, ele, o comprador.- Então! - ela sempre começava a frase assim: - O que você achou?- Bela , muito bela, gostei muito!- Vai fechar negócio ou ainda precisa pensar, já sabe dos números, certo? - vai fazer uma contra oferta?- Calma! calma! ele disse com uma voz um tanto rouca: - deixe-me pensar um pouco. e resfolegando como se estivesse um tanto cansado, levantou-se.Distanciou-se um pouco, chutando um montinho de terra, ela sorriu por dentro, falando consigo mesma- Vai sujar os sapatinhos.Colheu umas tulipas e voltando-se, para ela, fez um gesto de oferta: - ela sorriu, e foi o sorriso mais lindo que ele já vira. ela fez que sim, com um movimento gracioso de cabeça.
Ele se aproximou, fez um gesto de mesura colocando as flores entre seus dedos.
Sentou-se mais a vontade. olhou em seus belos olhos dizendo: - Eu fico com a casa!
mas, quero um favor.
- Que favor?
- Quero que trabalhe para mim.
- Como assim? - perguntou-lhe um tanto apreensiva
Bem! Eu estou me separando de minha esposa, por isso estou comprando essa casa. Não é uma separação litigiosa , é de comum acordo. tanto que já resolvemos as questões financeiras. Só faltam algumas questões legais. E assim que assinarmos o divórcio, pretendo me mudar para cá.
Ela não falava nada, apenas o ouvia com atenção. O coração batendo descompassado, não entendia bem o que estava se passando. Era uma emoção nova, algo que ela desconhecia completamente. As tulipas murchavam em suas mãos, deixando um perfume, suave, no ar e aquilo enchia o seu coração
com uma mescla de alegria e compaixão. relutava em dizer para ele que nada daquilo lhe interessava, agora, que o negocio já fora concluído. Que já podia pagar o aluguel com folga, todos os seus problemas se tornaram tão pequenos, pelo menos, por enquanto.
mas, não podia lhe dizer nada, só escutava-o com atenção.
Ele continuou falando: - Eu vou precisar de alguém confiável que trabalhe neste novo projeto, pois vou precisar me ausentar por um tempo. Não sei se você já sabe, mas, eu moro em outro estado, a mil e duzentos quilometro daqui, Não posso, simplesmente, estar em dois lugares ao mesmo tempo, por isso pensei em te contratar para transformar esta casa num lar.
Ela olhou para ele com surpresa no olhar e num relapso de incerteza, lhe perguntou: - Porque eu?
Ele ficou em silêncio por alguns segundos para depois responder: - Não faça pergunta difícil, eu não saberia responder.
Só sei do que preciso e meu íntimo me revela que você seria a pessoa certa para cuidar da casa, contratar uma arquiteta e uma decoradora, comprar as peças necessárias, sem que eu precise me preocupar.
Olhando-a nos olhos, completou: - aceite, por favor! nem precisa se ausentar de seu emprego atual, pois, pelo que sei, não precisa trabalhar em tempo integral, dá para conciliar seu trabalho com mais este.
- Como sabe sobre isto?
- Ele a olhou com provocação e com uma voz um tanto pastosa pelo cansaço, falou: - Esqueceu do quanto me fez esperar por você?
Enquanto isso seu colega de profissão me contou um pouco do que sabia sobre sua pessoa, Sei que é solteira, que não tem filhos, mora sozinha e seus pais não são desta cidade. Que veio para cá para estudar, e arrumou esse emprego para se sustentar, que não gosta de ser conduzida e nem protegida por ninguém.
- Nossa! balbuciou- Só falaram sobre mim, pelo que consta!
- Um pouco sobre você, outro pouco sobre a casa, mas, não fique brava com ele, eu é que fiquei muito entediado com aquela infinidade de café que ele me oferecia, então, entre um gole e outro, fui lhe fazendo perguntas. Não queria fazer negócio com uma pessoa completamente desconhecida.
- E gostou do que soube sobre mim? Tão logo fez a pergunta, tão logo se arrependeu.: - não precisa responder!
- Respondo assim mesmo:- gostei sim! me pareceu confiável, e depois que te conheci pessoalmente, constatei, que, além de confiável, ainda é uma mulher corajosa e linda.
Ela enrubesceu novamente, sua íris se dilatou e seu rosto ficou extremamente rosado, Tanto que até ele percebeu.
- Porque ficou constrangida, acho que já está acostumada a receber esse tipo de elogio, ou estou enganado?
- Está! não costumo receber elogios de clientes, sou bem profissional, não dou margem para esse tipo de comentários.
Ele sorriu de um modo que a fez estremecer.- está duvidando de mim? acrescentou:
- De modo algum, só achei engraçado a forma com que lida com suas emoções. Sei perfeitamente de tudo isso. Só que, em sua presença, as vezes, me esqueço que a conheci nesse dia, para seu governo, nos conhecemos á apenas algumas horas, mas, parece que sempre a conheci.
Ela corou novamente como se ele á tivesse despindo.
Pensou naquele dia: - Como pode acontecer tantas coisas, tudo o que ela almejava na vida, de repente se concretizava: - um grande amor, uma quantia razoável de dinheiro entrando em sua conta! - Opa!,
palavra tem poder, mas, nada disso é verdade, será apenas um sonho?
Não, não era sonho, pois a voz do rapaz a acordou para a realidade,:
- E ai, dá para me dar uma resposta?
- Resposta sobre o quê?
Ele fez uma cara de surpresa e falou rapidamente: - sobre a minha proposta de trabalho.
-Ah! sim, Claro! - Dá para esperar até amanhã?
- Sim, mas só até amanhã a tarde, pretendo, assim que assinar a papelada da compra da casa, seguir para minha cidade. ainda tenho muitas coisas que resolver por lá.
E ainda tem mais: - quero que você pense sobre se mudar para cá! - aquela casa construída lá embaixo, está vazia, se você quiser pode ocupá-la. Assim se livra do aluguel e ainda fica mais próxima do trabalho.
Ela olhou de soslaio, por cima dos óculos de sol, que agora, a protegia dos raios do pôr do sol, que estava diretamente voltado para eles . e sem pensar concluiu: - isto é bom demais para ser verdade!
- Isto quer dizer o quê? - ele disse: - que você aceita?
Ela pensou um pouco, e decidiu se fazer de difícil. balançou a cabeça em negativa.
- Ainda não!- Preciso pensar! Afinal, é uma mudança e tanto, incluindo muita responsabilidade.
De repente seu celular começou a tocar, ela pediu licença, levantou-se , se afastando um pouco, para atender.: - Alô! Tão logo reconheceu a voz de seu assistente, que começou a falar sem parar: - Onde você está? - Já estou a ponto de fechar o escritório, todos já foram embora, só falta você! - Ainda vai voltar?
Ela olhou para seu relógio de pulso e não conseguiu acreditar no andar das horas, o tempo passara tão rápido que nem percebeu que quase anoitecera.
- Desculpe-me! - saiu uma voz quase chorosa: - Pode sair, eu volto, mas, tenho a chave!
- E ai? Como foi?
- Tudo correu as mil maravilhas! - Não conseguiu esconder a emoção.
Ouviu um assovio animado do outro lado e uma expressão de contentamento no falar: - Que maravilha! Valeu a espera!
- Sim! valeu!, mas, vamos conversar noutra hora! Já está ficando tarde, preciso sair daqui. Beijo, amigão!
O telefone ficou mudo de repente, ele já tinha desligado, com certeza, estava louco para ir para casa!
Ela se voltou para o moço e só então percebeu que não sabia seu nome. Ficara tão empolgada com o negócio, que esquecera completamente de perguntar. Ou não era só isso?
- Eu peço desculpas, falamos sobre tantas coisas, tratamos das coisas práticas e nem sei qual é o seu nome!
- Daniel, mas pode me chamar de Dan!
- Então Daniel, podemos ir?
Ele sorriu, falando em seguida:- Dan! para os amigos prefiro ser chamado de Dan. Sim!
podemos!
Levantaram do banco e seguiram diretamente para o carro, falando sobre as questões legais de compra e venda.
Se despediram na porta do escritório, prometendo se encontrarem no outro dia as dez da manhã,
quando, então, iniciariam o processo da transferência do imóvel.
Ela voltou para casa com uma sensação estranha. Não era mais a mesma. Parecia que estava vivendo a vida de outra pessoa. Estava tensa e ao mesmo tempo relaxada, não sabia explicar: Seria amor ou apenas empolgação pelo homem, que, de repente, mudava sua condição de momento?
Entrou em casa, fechou a porta e foi para o banho. Enquanto a água caia sobre sua cabeça, ela colocava um pouco em sua boca e esborrifava para fora. Era assim que conseguia relaxar e pensar.
Tudo transcorrera bem, nem acreditara que depois de tanto tempo numa penúria que dava dó, agora, poderia resolver muitas pendências.: como saldar as dividas contraídas naquele ano, que estava difícil de sanar., sair daquele apartamento pequeno e morar num casa maior, com aquele jardim imenso e tantas outras regalias que sequer sonhara.
Dormiu mal aquela noite, foi difícil se desligar, só depois que o cansaço vencera é que pode descansar um pouco.No dia seguinte levantou-se muito cedo, preparou o desjejum, tomou uma ducha quente, e foi para o escritório.Chegando lá, todos á saudaram, dando-lhe os parabéns pela venda, nem notaram o turbilhão de emoções que á estava incomodando.Lá pelas dez horas, Daniel chagara, logo após o antigo dono da casa também apareceu, todos se reuniram na sala de reuniões e efetivaram o negócio.Daniel lhe parecera muito distante, diferentemente do dia anterior.Assinaram a papelada, os cheques foram editados. As comissões devidamente distribuídas. A parte que cabia a imobiliária, a parte que lhe cabia, enfim, todos os trâmites devidamente acertados e concluídos com muito sucesso, sem nenhuma ressalva.Agora, só havia mesmo o trabalho do seu assistente, que registraria tudo em cartório.Ela foi a primeira a sair da sala, não aguentava mais a pressão do seu coração, que batia muito acelerado, como se fosse um pilão a moer milho.Aquilo tudo lhe causara muito estresse como nenhum outro negócio que anteriormente fora fechado. Ela só entendia que o comprador era o culpado, não conseguia parar de pensar naquele homem.Foi para a saleta ao lado, serviu-se de um café, sentou-se numa poltrona de coro cru, disposto perto da máquina.Aquela sala era muito aconchegante, que, por alguns instantes, até conseguiu relaxar. No entanto, o sossego durou pouco. logo, ouviu vozes vindo do corredor e seu cliente abriu a porta, entrando acompanhado de mais dois colegas de trabalho e a conversa fluiu, sempre relacionado com trabalho.Ela pouco falou, de vez em quando, se deparava com um par de olhos verdes olhando em sua direção. Naquele dia, ele se vestira com esportividade. Estava muito mais atraente que quando o conhecera: vestia uma camisa cor de vinho, acompanhado por uma calça mais clara, quase que da cor salmão. estava sem a gravata, com a manga da camisa enrolada até os cotovelos e a camisa aberta , mostrando pelos dourados que se perdiam entre os tecidos.
O sapato era um tanto menos chamativo, embora simples, mantinham uma limpeza impecável.
Ficou admirando seu cliente por alguns segundos, até ouvir uma voz dirigida diretamente á ela: - Oi!, está me ouvindo? Parece estar num outro mundo!
Anita deu um salto na cadeira, quase derrubando a xícara que estava segurando entre os dedos,
- Que susto! Não estou dormindo, nem me encontro fora do mundo, só estou um tanto cansada.
Ele deu aquele sorrisinho encantador que derrubou toda a sua defesa.
- Eu estou esperando a resposta!
- Sobre? - fez a pergunta sem pensar - Desculpou-se logo a seguir: - Ah, sim! Eu aceito a sua proposta, só que, com uma condição.
- E qual é essa condição? perguntou meio decepcionado: - que será que viria agora? Tudo poderia se esperar de uma mulher, ainda mais de uma que parecia viver nas nuvens.
- Eu quero ter carta branca, já que não vai estar por perto, quero todas as condições necessárias para realizar esse projeto.
- Claro!- ele respondeu com segurança na voz:- Nem poderia ser diferente, já que estou colocando a minha vida em suas mãos.
- Sua vida? - ela se viu balbuciando:- por acaso aquela casa representa a sua vida?
- Sim! ele disse com uma certa tristeza no olhar: - a partir de agora, só viverei para ela e para os negócios.
- Não sei se deveria dizer isso, mas, você me pareceu meio frustrado. O que realmente aconteceu para que o seu casamento não desse certo?
- Ele sorriu , e com uma certa displicência no olhar foi lhe contando o ocorrido: - A culpa foi minha. Minha esposa sempre foi muito dedicada ao casamento, embora tivesse que trabalhar, não porque precisasse, mas, para que se distraísse, sentindo-se importante como pessoa. Só que eu, vivia para o trabalho e acabei deixando-a um pouco de lado. Quando percebi, já era tarde.
Ela já estava interessada em outro, uma pessoa que a completava, que cobria todas as suas necessidades. Ao conhecê-lo eu entendi o por quê.
- Você conheceu o amante de sua esposa e se deu bem com ele? Como isso é possível?
- Não era ainda o amante, embora tivessem um relacionamento de amizade já há muito tempo,
antes de mudarem a condição do relacionamento, eles foram muito sinceros, vieram falar comigo, e sem muita delonga expuseram o acontecido.
Estavam se apaixonando e pretendiam ficar juntos. e eu era um empecilho.
Então, para a boa saúde de todos, optamos, de comum acordo, que o melhor seria nos divorciarmos o quanto antes.
E isso vem ocorrendo já á algum tempo, embora ainda moremos na mesma casa.
- Nossa! que história! E como se sente diante disso?
- No começo, não vou negar, isto me abalou profundamente. Eu não me dava conta de que o nosso relacionamento já havia se esgotado. Há muito já não havia muito á se falar, nem á compartilhar, exceto coisas banais. e alguns encontros românticos, sem muita emoção, só por comodismo mesmo.
- Que triste!
- Sim! muito triste! É nisto que dá o casar-se quando se é muito jovem.
- Faz quanto tempo que são casados?
- Quinze anos, eu acho!
- Vocês tiveram filhos?
- Não! E não foi por falta de querer. Não tivemos, porque não tivemos. Ela tem um problema nas trompas, e não pode segurar o feto.
Já sabia disso quando me casei com ela e isso não me afetou no primeiro momento, como já te disse: Quando se é jovem demais, a gente não para para pensar e sempre está tudo certo.
- E agora, o que você pretende fazer? - Quero dizer:- depois que se mudar para cá.
- Ainda não sei direito. Só sei que pretendo recomeçar, Sou jovem ainda e tenho que pensar!
- Vai mudar de atitude, ou pretende viver para trabalhar? Se for assim, nem adianta se casar novamente.
Falou assim, mais para jogar verde e colher maduro. Já estava sonhando em ocupar o lugar vago.
- É óbvio que aprendi a lição, começou a falar:- Se me casar novamente, eu acho, que preciso pesar os prós e os contras. mesmo porque, já tenho o suficiente para pensar em dosar o tempo.
E falando nisso. que tal um drinque depois do trabalho para comemorarmos o negócio. Podemos chamar seus amigos, ou sairmos sozinhos, como preferir.
- Sozinhos? se viu a perguntar:
- Sim! porque não?
- Afinal, somos nós que realizamos o negócio, não teve interferência de ninguém. a sua simpatia me fascinou de um jeito tão forte, que me vi quase que obrigado a comprar a casa. Deu uma boa gargalhada e acrescentou em seguida: - brincadeira!
- Mas ela viu sinceridade em seu olhar e foi por isso que aceitou o convite, pediu que á pegasse lá pelas nove horas da noite, em frente a sua casa.
Ambos se despediram, ele foi para o hotel, sentindo-se realizado, ela foi comemorar com os amigos a efetuação daquela venda.
Trabalhou o restante da tarde no escritório, pois ainda tinha muitas tarefas pendentes, depois foi para casa um tanto ansiosa com o encontro de logo mais á noite. deu uma ajeitada em seu apartamento, levou o lixo para fora, tomou um banho, para depois relaxar um pouco deitada no sofá com a televisão ligada. Não conseguia prestar atenção em nada, pois a sua cabeça se concentrava na figura linda de seu mais novo cliente, pensando se valeria a pena mudar-se para a nova casa.
Ligou para a sua mãe e lhe contou as novidades, Escondendo a parte mais intrigante: A paixão eminente pelo novo patrão.
Lá pelas oito horas da noite começou a se enfeitar: Usou maquiagem, frisou os cabelos, passou um perfume pouco usado por ser muito caro, Colocou seu melhor vestido, seu mais novo sapato. e se pôs a contar os minutos, tanto a agitação que lhe tomara conta.
Enquanto isso, Daniel também se perfumava, coisa que ele fazia com muita frequência. Mas se viu a tomar um certo cuidado com a escolha, porque, para ele, seria uma ocasião muito especial. Durante quinze anos não teve nenhum envolvimento romântico com nenhuma outra mulher que não fosse a sua esposa. E poucas vezes sentiu-se tão amedrontado como se sentia agora. Parecia que a vida voltara a pulsar de uma outra forma em seu peito, como se voltasse a respirar com mais intensidade e muito mais prazer.
Fez a barba, escolheu a roupa, os sapatos, até comprou um novo perfume, queria que fosse diferente, Nada a ver com o homem do passado. Agora, a mudança seria total em todos os sentidos, não queria correr riscos com o novo relacionamento. nem sabia ao certo se seria correspondido, mas, sentia que, as coisas se sucedessem dessa forma, pelo menos era essa a sua vontade.
Pensara muito sobre o assunto. Não queria precipitar-se, mas, parece que o destino faz tudo as avessas do que se planeja, Pelo menos, era isso que o seu coração transmitia. bendita hora em que resolveu mudar de Estado.
Olhou no relógio que marcava oito horas e vinte minutos. Pediu pelo interfone que o manobrista tirasse seu carro da garagem do prédio onde estava instalado. O hotel nem era tão sofisticado, mas, tinha lá suas mordomias, Tudo o que o dinheiro compra! - Pensou:
Oito e meia, ele já entrava em seu carro, oito e quarenta, a buzina soou lá embaixo. Anita se olhou no espelho mais uma vez, gostando do que via. Olhou pela janela, constatando que ele havia chegado.
Seu apartamento ficava no segundo andar, levaria apenas alguns segundos para chegar lá embaixo. No entanto, resolveu fazer um sinal para que ele a esperasse, pois não queria demonstrar muita ansiedade.- Mulher tem que se fazer de difícil, pensou:
Foi para o banheiro e se demorou um pouco sentada no vaso, para acalmar a tremedeira e desacelerar o coração que batia mais rápido que de costume.
Depois saiu, chamou o elevador, entrou sorrindo para um casal que ocupava o mesmo espaço. - Boa noite! falou:
Os dois a cumprimentaram, a moça não parava de olhar para ela, enquanto o moço disfarçava com medo de levar um beliscão.
Ela percebeu e sorriu por dentro satisfeita, se causava essa impressão nos desconhecidos, por certo agradaria seu acompanhante. Era só o que almejava!
Ao abrir a porta que dava para a rua, deu de cara com ele a esperar-lhe. não esperava nada diferente, já notara que era um perfeito cavalheiro,
Ele tomou a sua mão e deu-lhe um beijo no rosto. Ela se encolheu um pouco diante da emoção que inundou o seu ser. Não esperava aquele comportamento, afinal, nem se conheciam direito e ela estava acostumada a tratar gente pouco pouco conhecida com um tanto de formalidade no primeiro momento.
Ele continuou segurando sua mão entre a dele, conduzindo-a até o veículo estacionado mais adiante.Caminharam em silêncio, não querendo quebrar aquela sensação gostosa que o leve toque proporcionava.Só então soltou a mão dela para abrir a porta do carro para que ela entrasse. enquanto dava a volta até a segunda porta, ela se concentrou em se habituar com aquele conforto do qual nunca estivera acostumada.Nenhum rapaz a tratara com tamanho cavalheirismo, nem tão pouco sentira aquela sensação de que o mundo parecia rodar em torno dela, deixando-a tão vulnerável a ponto de parecer boba ao seus próprios olhos.Sem aparecer nenhuma palavra melhor para dizer. Quando ele sentou-se ao seu lado, ela apenas conseguiu balbuciar: - Muito obrigado! Ele não respondeu, apenas olhou em sua direção com faíscas no olhar. Para depois lhe dizer suavemente: - Você está deslumbrante!- Você também está muito bem! - devolveu-lhe o elogio:Ela não pode deixar de reparar em todos os detalhes que compunham a imagem daquele homem sentado ao seu lado. Estava vestido com esmero: Calça jeans da cor preta, camisa azul claro com as mangas dobradas nos punhos, sapatos, mocassim, de cor clara, cabelos bem penteados com uma leve onda sobre a testa, destacando alguns fios brancos sobre as têmporas. Um perfume inebriante enchia o ar, de uma fragrância ousada parecendo uma mistura de couro e cacau, com uma leve sensação de frescor de lima e de manjericão. nada parecido com o perfume que ela estava acostumada a sentir nos homens que conhecera, mostrando assim, a sofisticação que jamais vira em outra pessoa.O garçom se aproximou com uma garrafa de vinho tinto malbec, que delicadamente, despejou em duas taças de cristal.Ele pegou a taça erguendo-a para um brinde, ela, automaticamente, o imitou, perguntando:- A que brindaremos?- Ao futuro! ele disse: acrescentado a seguir: - Tim- Tim! - sorvendo um gole e suspirando de prazer.Ela fez o mesmo, a bebida desceu aquecendo-a ainda mais, sentiu uma onda de calor invadindo seu corpo já aquecido pela emoção, queimando-a por dentro, até aparecer em sua testa algumas gotinhas de suor, que ela, imediatamente fez questão de secar com a palma das mãos.- Está muito calor para tomar vinho, ela disse: - Preferiria algo mais fresco.- Imediatamente ele chamou o garçom.
- Por favor! Acho que errei no pedido, a dama prefere algo mais fresco.
- Não! ela se viu a replicar. - Falei por falar. O vinho está muito bom.
O garçom ficou ali parado, esperando os dois decidirem.
Anita fuzilava o companheiro com o olhar, após alguns segundos em silêncio, ela despejou sua fúria: - Podia, ao menos, conversar comigo para tomar suas decisões, não?
Ele a olhou com surpresa, estava acostumado a tomar decisões sobre tudo, mas, viu, que com ela, isso não funcionava. Notou que estava lidando com alguém não manipulável, cheia de dignidade e autoestima.
Após ouvir o comentário de Anita, o garçom se afastou para que eles tivessem o seu momento de discussão a sós.
Ele levantou as mãos para cima, num gesto que pedia paz, para depois falar pausadamente:- Peço desculpas, não queria te chatear. Estou acostumado a ir em restaurantes e pedir uma garrafa de vinho, não importa a estação, eu gosto!
Se não se importar, pode pedir o que quiser. Não é obrigada a me acompanhar.
- Sem problema, ela disse: - Eu é que peço desculpas. Não deveria estar reclamando de nada, está tudo perfeito!
- Bom! Para compensar a minha falta de companheirismo. Disse Daniel: - pode escolher o prato!
Ela sentiu-se mal, depois do ocorrido, e preferiu deixar tudo ao encargo dele, só que, desta vez, fizeram a escolha juntos.
Enquanto degustavam uma comida gostosíssima, conversaram sobre muitas coisas, ele lhe contou que trabalhava em uma companhia de agro negócios. Onde produzia sementes, exportando para outros países, por isso viajava muito.
Como diretor, nunca deixava que outros tomassem decisões por ele.. - Até aquele momento, acrescentou: em tom de brincadeira.
Ela sorriu também, entendendo o que ele quis dizer; sentindo-se satisfeita pela forma em que á incluía em sua vida.
Depois de terminada a refeição, ele a convidou para dar uma volta. Ela aceitou de imediato, querendo prolongar o encontro, talvez, até quebrar o gelo e partir para um outro tipo de intimidade.
Ele segurou em suas mãos logo que saíram da mesa. Ela sentiu uma vibração ir de encontro ao seu querer, como se estivesse se conectando consigo mesma.
Ao sair á rua, ele parou, passou as mãos pelo seu cabelo, parando ao longo de seu pescoço, causando um prazer inigualável que a fez estremecer, seus lábios se uniram como um imã potente, e o mundo pariu sensações antes nunca sentidas.
- O tempo parou: nenhum dos dois saberiam dizer em que tempo as caricias começaram, nem quando terminou. Olharam-se nos olhos, e ele disse baixinho em seu ouvido: - Não tem ideia do quanto esperei por isso!
- Nem você tem ideia do quanto esse pensamento me abalou!
A noite prometia, passearam de mãos dadas, se beijaram um milhão de vezes, até sentirem que já era hora de se despedirem, Ele á levou até a porta do prédio, ela ficou com vontade de pedir para que ele subisse, mas engoliu em seco, deu-lhe mais um beijo, desta vez, menos voluptuoso, soltou as suas mãos das dele, bem devagarinho, quase a protestar, e só então, abriu a porta e se afastou rapidamente, sem olhar para trás.
Ele ficou ali parado, sem se mexer, paralisado por uma sensação de perda, quase á asfixiar lhe.
Deu meia volta quando viu a luz do segundo andar se acender. voltou para o carro, e foi embora.
capitulo 2 ( Medo de amar)
A noite foi longa para Anita, quase não conseguira dormir. Entre uma cochilada e outra,
a imagem de Daniel insistia em aparecer, um tanto desbotada e incerta, como
se fosse desparecer de uma hora para outra.
Seria sua consciência querendo lhe dizer algo,
ou apenas o medo de amar e de ser esquecida?
Sempre fora uma mulher conservadora, não se deixava levar pela magia de um encontro. Não gostava de se expôr, nem de ficar por ficar.
Seus amigos a chamavam de puritana, Ela sabia que não fazia nenhum sentido esse apelido,
ela reservava o direito de escolha, e tinha um certo receio de aventuras passageiras.
Fora criada com muita disciplina, sua mãe sempre á alertou do perigo de se apaixonar no primeiro
encontro, sempre lhe dizia que, as coisas poderiam mudar de repente, e o sofrimento seria inevitável.
Por isso, nunca teve um compromisso sério, mesmo quando queria, não conseguia ficar com alguém no primeiro encontro. Procurava conhecer bem a pessoa que se aproximava dela, antes de iniciar qualquer relação.
Mas, desta vez, o sininho tocou, e a fez refém de uma história diferente, um sentimento novo, do qual ela não sabia lidar.
Alguma coisa em seu íntimo lhe dizia para tomar cuidado. e ela repetia para si mesma: - Palavra tem poder.
Eu serei feliz com ele! Eu serei feliz com ele! E ficou repetindo até o amanhecer.
Pela manhã ao despertar, iniciou o dia como todas as manhãs. depois pegou o carro e foi para o trabalho, antes consultou o celular para ver se não tinha nenhuma mensagem.
E deparou com uma de Daniel que dizia: - Obrigado pela noite! Abraço!
Ela sentiu-se feliz por um momento, para logo sentir uma mancha preta á rondar-lhe: Achara a mensagem muito fria, Porque um abraço, ao invés de um beijo? Depois do acontecido anteriormente, dos beijos e afagos trocados, já teriam um minimo de intimidade para tornar mensagens mais quentes.
Resolveu trancafiar esse tipo de pensamento lá no fundo, e seguiu a pensar em trabalho. Afinal, de que adiantaria remoer o que ainda não aconteceu. - Outro dia, outros motivos, pensava:
Seu assistente já havia chegado quando ela abriu a porta, ele estava atolado no meio de muitos documentos, e logo que a viu entrar foi logo dizendo: - temos que resolver muitos casos de aluguéis atrasados, os clientes estão ligando para saber o que esta havendo, A crise está brava!
- Realmente, ela disse! - Não está fácil para ninguém!
O moço deu uma risadinha, passou as mãos na cabeça, e completou: - Só para você é que não!
Ela ficou meio sem graça, em outra ocasião também sorriria, mas, não na situação em que se encontrava: apaixonada pelo patrão.
Ficou quieta e começou a limpar sua mesa, se concentrando nos afazeres mais urgentes, fazendo ligações e as recebendo, esquecendo por alguns momentos a sua crise emocional.
O dia passou rápido, um entra e sai na imobiliária , acabou exigindo toda a sua atenção. As vezes atendia o telefone e lembrava de Daniel e vinha aquela pergunta: - Seria ele?Só depois das quatro horas da tarde, seu assistente lhe revelou que tinha recebido um email de Daniel. ela abriu a correspondência rapidamente, que só continha uma ordem: - liga para pessoa tal. número tal, que a minha contadora te dará todas as coordenadas para que você inicie o trabalho na casa.Os cheques já estão preparados, ou você prefere um cartão corporativo?Já dei ordens ao escritório de contabilidade para lhe dar carta branca, sempre que solicitar. depois nos falaremos. pode se mudar quando quiser, sinta-se a vontade!abraço!Daniel.A noite chegara. E ela foi para casa sem ter noticias de Daniel: nenhum telefonema, nem nada! Apenas silêncio,Nos dias que se seguiram, ela realizou a limpeza da cabana. embora fosse uma casinha pequena, muito simpática, ao contrastar com o tamanho da residência oficial, mais parecia uma cabaninha.Arrumou e embalou todos os seus pertences, entregou a chave ao seu senhorio, chamou um veículo pequeno para fazer o transporte, e rumou para outra aventura. Agora, sem nenhum receio de não poder pagar.-Pagaria com seus serviços, pensou: - mas, até quando? novamente veio-lhe a insegurança tomando posse de seus dias.
Uma semana, duas e nada de ter noticias do seu patrão. Já iniciara algumas obras, contratando um encanador para resolver alguns problemas, sondando algumas lojas de eletrodomésticos, para entender bem o mercado e saber onde comprar produtos bons com menor preço.
Certa noite, ela estava meio inquieta, saiu para fora para tomar um ar. estava fresco lá fora, então resolveu caminhar um pouco pelo jardim.. De repente sentiu um perfume que ela nunca esquecera, madeira e chocolate. Inspirou instintivamente, parecia que Daniel estava tão perto, que quase conseguia tocá-lo: Que saudade! - balbuciou:
Foi então que uma mão tapou seus olhos, sentiu um arrepio percorrer seu corpo, ouviu uma voz que lhe dizia: - adivinhe quem é?
- Daniel! - ouviu o som de sua própria voz pronunciar aquele nome tão querido. Ao se virar deu de cara com aquele olhos verdes a lhe sondar, brilhando sobre a luz do luar.
- Não vi o carro chegar. Falou:
- Ainda bem, queria chegar de surpresa!
- Porque não ligou antes?
- Não deu, ele respondeu com uma certa emoção:
- Estive muito ocupado, fui chamado as pressas para realizar alguns negócios. Tive várias fazendas para visitar. Além do mais, detesto falar de intimidade pelo telefone. Minha ex- esposa detestava isso.
Mas eu prefiro isso: seus lábios se aproximaram dos dela bem devagar, ela pode sentir o hálito quente
queimando-a por fora, antes de sentir uma onda de calor invadindo-a por dentro, e um sabor de hortelã, misturado com prazer e loucura.
Beijaram-se com sofreguidão, depois de se separarem, ele tocou-lhe de leve a fronte, balbuciando em seu ouvido: - sentiu? agora sabe o por quê?
- Sim, ela sentiu e entendeu, que, por telefone, aquilo não aconteceria.
- Ele disse a seguir: - Detesto sentir vontade e não poder realizar. Sou obsessivo por toque. Sentir saudades é bom, mas, ficar só falando de amor não me sustenta. E você não sabe o quanto esperei por isso.
Ele soltou-á do abraço, pegou suas mãos entre a dele e a conduziu pelo caminho de volta.
- Vamos para a sua casa, ou para a minha? perguntou:
- Para a minha, ela disse: - Sua casa ainda não está pronta!
Não tem cama, ela ia completar, mas, desistiu.
Não tinha como fugir do desejo que sentia por aquele homem. Se as caricias continuassem, por certo, o caminho seria esse. O caminho da cama.
E foi o que aconteceu a seguir.
Ele a tomou nos braços tão logo alcançaram a porta, e como se fossem recém-casados, a levou para a cama, onde as caricias se multiplicaram até que não aguentassem mais. Ele a penetrou de mansinho, ela sentiu-se nas nuvens. Nunca em sua historia de vida sentiu algo tão profundo, Era como se dela ele fizesse parte. Os beijos tornaram-se voluptuosos, as caricias cada vez mais ousadas, até que atingiram o clímax, onde ambos se perderam entre suspiros e gritos de prazer.
Ela rolou na cama, virando-se para o lado, ele, por sua vez a abraçou em forma de conchinha, e ficaram lá por horas, sem se falar, apenas sentindo o bater do coração um do outro, em descompasso.
- Estou com fome, ela falou, quase a murmurar: - Vou tomar um banho e preparar algo para comer. Ele se soltou dela, relutante. - Ta bom! eu também estou faminto. toma teu banho, depois me levanto e vou lhe ajudar!
Quando ela colocava os espaguetes para cozinhar, ele apareceu na porta, perguntado: - em que posso ajudar? - Que cheiro bom!
- É o molho de manjericão em sua homenagem, ela respondeu: - seu perfume me lembra lima e manjericão, além de madeira e chocolate.
- Ele deu uma risada estridente que a fez rir também. - Como assim? Tudo isso?
-E algumas cositas mas... emoção, carinho, amor...
Você pode ir lavando a louça se quiser.
Ele se pôs a lavar alguns utensílios que estava sobre a pia, mas, de repente parou, foi ao seu encontro a beijou novamente.
E assim se sucedeu, enquanto jantavam, depois do jantar, até a hora de voltar para a cama e fazer amor pela segunda vez.
O dia amanhecia lá fora, o sol gritante já ameaçava o dia com seu hálito quente. ela procurou um corpo ao seu lado e só encontrou um vácuo.
- Não é possível! pensou: - Este homem é especialista em fugir.
Ouviu um carro chegando: era ele que trazia-lhe café pronto.
- Não acredito! pronunciou ao vê-lo atravessando a porta:
Achei que tinha ido embora.
- Ele fez uma carinha de quem não entendeu: - Como assim, eu só fui lhe preparar um café! - disse sorrindo: e lhe entregou o pacote que tinha nas mãos.
Eu só trouxe café preto. Não sabia se gostava de leite e não quis errar. Portanto. hoje só cafe, pão e manteiga esquentado na chapa.
- Eu poderia ter preparado, disse meio contrariada: tenho tudo aqui, mas, como de costume, você nem pergunta e toma suas decisões.
Ele levantou as mãos em sinal de protesto: - Olha aqui mocinha, não vem não! Só quis lhe fazer um agrado, se não gostou, peço desculpas e jogo tudo fora.
- Não ! ela gritou: - me desculpe!
Tocou suavemente em seus ombros - Olha eu não quis ofendê-lo. só que sou impetuosa demais, não consigo evitar.
Tomaram o café, conversaram um pouco sobre o andamento da decoração do imóvel, ela o levou para verificar alguns itens que comprara, ele ficou satisfeito: - sabia que podia contar com você, não errei quando acreditei em seu bom gosto, continue assim.
Mesmo porque, eu vou me ausentar por alguns dias. o dever me chama, e como você sabe. estarei muito ocupado para pensar em outra coisa que não seja trabalho.
Ela se ofendeu em silêncio, não queria correr o risco de ter que brigar com ele, antes de vê-lo indo embora.
-Para onde você vai desta vez?
- Por ai, onde me chamarem, não sou eu quem decido.
- Sentirei saudades!
- Eu também sentirei! disse meio tristonho:- mas, quero que saiba, que mesmo que eu não ligue com tanta frequência, você estará em meu pensamento.
- Será? ela perguntou:
- Pode apostar! Não quero que pense que eu não ligo, mas, gosto de deixar o tempo decidir!
Assim que puder, eu volto! Dito isso: ele se levantou, afastando a cadeira para trás, deu a volta, tomou-á em seus baços, beijando-á com desespero.
Seus lábios chegaram a inchar com tamanha violência do desejo. Depois ele se despediu, pegando sua maleta, e foi se distanciando, perdendo-se entre a vegetação. Ela só conseguiu ouvir o barulho do carro indo embora.
Ficou um tanto ferida ao constatar que ele nem pediu que o acompanhasse, parecia querer fugir, como sempre.
Os dias seguiram sem qualquer novidade. ocupada com seus dois empregos nem vira o tempo passar. todas as noites ficava por horas olhando a estradinha embrenhada na mata, na esperança de ver algum farol de carro iluminando algum ponto da estrada. Por meses nada aconteceu. foi então, que num fim de semana prolongado por um feriado na sexta feira, ela resolveu ir para casa de sua mãe. Fazia algum tempo em que só se falavam por telefone.
Como ela detestava dirigir na estrada, optou por ir de ônibus. Comprou passagem e na quinta feira a noite, assim que saiu do trabalho, arrumou as malas e partiu.
A pequena cidade onde sua mãe morava, ficava a uns duzentos quilômetros dali. Longe o suficiente para que não se vessem com tanta frequência. Ela sentia-se feliz em poder fazer uma visita no lugar em que morara por tanto tempo, sempre no mesmo bairro, na mesma rua e na mesma casa, desde que se conhecera por gente.
Seus pais se separaram quando ela tinha apenas seis anos de idade, Ele as deixou e nunca mais apareceu, nem para vê-la.
De vez em quando mandava algum dinheiro para ajudar sua mãe a criá-la, até que se casou novamente, se mandou para outro país e nunca mais deu noticias.
Sua mãe deu duro para criá-la e lhe dar uma boa educação. Até que ela decidiu tocar a sua vida por conta própria. mudando-se para uma cidade maior, vencendo o medo de estar só, e de ter que arcar com suas próprias despesas, deixando sua mãe livre para refazer a sua vida se assim o desejasse.
Se passaram quatro anos, ela se formou em administração, fez um curso técnico em transações imobiliárias. Como já trabalhava no ramo, foi muito fácil arrumar um emprego de corretora naquele estabelecimento que trabalhava atualmente.
Ganhou algum dinheiro, mas, gastou muito em coisas banais, acabou quase que tendo que voltar, até realizar o último negocio. O maior de sua vida, e também ganhou essa dor de cabeça, que agora não á deixava mais em paz; O caso de amor com seu mais novo patrão.
Enquanto seguia pela noite, deitada na poltrona confortável do veículo que a levava, Anita pode, enfim, fazer um balanço sobre seus últimos momentos naquela cidade.
O amor e a saudade que sentia do seu patrão era quase que insuportável: Por vezes, ficava tentada a ligar para ele, contar que o amava mais que tudo, mas, a razão se incumbia de fazê-la desistir.
Era uma tortura pensar que poderia estar servindo de passa tempo., sendo usada quando ele aparecia por lá, para depois sumir sem dar conta daquela tortura que se tornou a sua ausência. Nenhum recado, nem de desculpas, nem de nada, apenas um silêncio ameaçador.
Sentiu as lágrimas inundarem sua face, pela primeira vez sofria de amor.
Por sorte estava escuro, outros passageiros dormiam, ou estavam de olhos fechados, não podiam ver sua dor estampado em seu semblante. Fora corajosa até agora, mas, talvez a lembrança de seus pais lhe deixaram emotiva demais.
Não conseguiu dormir nada, seus pensamentos despertos á incapacitava de relaxar, até que o sol despontou no horizonte, dando-lhe um certo alento ao constatar que já estavam entrando na cidade. - - Agora, só queria um abraço de minha mãe, constatou: - que ela me compreendesse, que eu pudesse passar para ela toda essa confusão que tomou posse de mim, e sem me questionar me revelasse um caminho, pois eu sei que palavras tem poder.
O ônibus estacionou na pequena rodoviária, agora só teria que andar por uns quinze minutos para chegar em casa.
Capítulo 3 ( Querendo colo)
Depois que Anita desceu do ônibus na rodoviária, ainda teria que caminhar por uns quarenta minutos até a casa de sua mãe. Poderia chamar um táxi, mas, decidiu não fazer isso.
Queria caminhar um pouco, para redescobrir na memória, o caminho que fizera parte de sua infância por longo tempo.
Enquanto caminhava pelas ruas, sentia no rosto, a brisa serena da manhã, um perfume chegava até ela, uma mistura de almíscar e mel, provavelmente vindo de algumas flores espalhadas pelas árvores que se erguiam sobre a calçada, Salientando suas flores brancas e amarelas, com inúmeras abelhas a
zumbir sobre elas.
Uma sensação de frescor á deixou submersa em boas lembranças do passado, quando, em companhia de sua mãe, ela colhia flores, erguida pelos braços fortes daquela mulher que tanto a mimara. para depois oferecer-lhe com imensa ternura e carinho.
Algumas pessoas passavam apressadas por ela, talvez indo para o trabalho. Embora fosse uma sexta feira de feriado, sabia que o comercio ficaria parcialmente fechado e agradeceu por isto _ Ainda bem que trabalhava em uma empresa que oferecia um horário flexível.
As ruas iam se desenhando á sua frente como se tivesse conhecimento do caminho que tinha que percorrer, seus pés seguiam dirigindo-a sem muito esforço.
- Ainda bem que optei por ir a pé! Pensou: - É bem mais prazeroso curtir essa brisa da manhã.
Alguns minutos se passaram, a mochila já lhe pesava nos ombros, quando enfim pode ver de longe o telhado de sua velha casa, por cima de um muro imponente e um portãozinho de madeira envelhecida.
- Já se passaram muitos anos, nem percebi que envelheci. Pensou: Parecia tudo novo, e agora, vejo que o tempo causou seus estragos. A velha figueira plantada a alguns metros de sua casa, estava parecendo tão cansada que lhe deu uma certa tristeza e pensou: - Como estará minha mãe?
Fazia algum tempo que não fazia-lhe uma visita, sempre que precisava, era a mãe que ia ao seu encontro, Ela sempre preferiu assim. Não queria rever pessoas e lugares que acabou deixando para trás; - Vida nova, sonho novo! Não queria correr o risco de desistir do projeto de capacitar-se.
Perdida em seus devaneios, nem percebeu que já se encontrava tocando a campainha da casa, sentindo-se um tanto culpada por não ter avisado que viria. sua mãe, por certo ainda estaria dormindo.
Esperou por alguns minutos, até ouvir a porta da frente ranger ao ser aberta, seu coração acelerou pela expectativa de abraçar sua mãezinha querida.
A chave girou na fechadura do portão. Quando ela se preparava para fazer uma brincadeira, viu que a pessoa que aparecera não era sua mãe, e, sim, um homem de meia idade.
Ficou boquiaberta sem saber o que dizer, e foi o homem a perguntar:- Pois não! Em que posso ajudá-la?
Ela não sabia se ria ou se chorava. Teve tempo de pensar:- Será que minha mãe mudou-se sem me avisar?
O homem á sua frente, esperou com paciência pela resposta.
- Eu procuro a Dona da casa. - Mariana Soares- ela disse meio sem jeito:
- Ela esta dormindo. Pode me adiantar o assunto? por favor! Falou em um tom muito sério.
- Eu sou a filha dela!
O homem ficou branco de repente. Quase se engasgando com as palavras, se desculpou:
- Nossa! me desculpe, eu á conheço por foto, mas, nem me liguei nos detalhes. Você é Anita? pois não!
- Sim, a própria! Resmungou:
- Vamos entrar, por favor! Dá-me sua mochila, parece estar pesada!
Anita tirou a mochila das costas, e ficou apenas com uma frasqueira nas mãos, entregou-á para o desconhecido e o acompanhou.
- Ele abriu a porta da frente, pedindo que á esperasse. Lá se foi a surpresa! - pensou:
Tinha imaginado a cara da mãe ao vê-la diante da porta, Mas, agora, outra pessoa iria contar a mãe que ela estava lá.
- Quem era aquele homem? ficou a se perguntar. Até que viu a mãe descendo a escada.
Com uma carinha meio apreensiva ela chegou até a borda do sofá, para depois comentar com alegria na voz: - Que surpresa, minha filha! Abraçou-á com muito carinho, completando: - Não á esperava, por que não avisou? Nós teríamos pego você na rodoviária.
- Pois é! Disse ela: - Eu não quis te alertar, para não te dar esse trabalho. Cheguei muito cedo, peguei o ônibus da madrugada!
- E.. Bom... Quem é aquele homem? seu namorado?
Sua mãe enrubesceu, seu semblante ficou sério de repente. Anita sentiu uma tensão no ar, e acabou sentindo-se culpada. Por isso dosou bem suas palavras: - Que é isso, não precisa ficar assim dona Mariana. Eu não á culpo, Foi para que isto acontecesse que eu á deixei sozinha. Pensei, que, talvez, um pouco de solidão a trouxesse de volta a vida, e assim, pudesse encontrar de novo a felicidade ao lado de alguém.
O caminho estava livre, e natural que alguém a alcançasse. Quem é ele?
- O nome dele é Roney. Ele ficou viúvo a dois anos, e nos conhecemos á pouco menos de dois meses.
- Hum! que legal.
- Você não se importa mesmo?
- Não! Ela disse com um sorrisinho nos lábios: - Não mesmo!
E Dona Mariana a abraçou novamente falando de saudade.
- Eu também senti saudade, mamãe. E tenho tanto para lhe contar. Coisas que aprendi não falar por telefone.
Ouviram passos vindo de cima, Roney apareceu com uma certa timidez no olhar. Tinha um semblante sereno, e Anita pode notar o quanto era um homem bonito. Aparentava ter uns cinquenta e poucos anos. Olhos castanhos. Alto, cabelos grisalhos, bem penteado. Usando uma calça azul, de moletom e uma camiseta cavada, parecia pronto para praticar algum esporte.
Ao vê-lo alcançar o piso da sala, Mariana o chamou: - Venha cá, meu querido!
Segurando a mão dele nas suas, pediu que sentasse.
- Esta é Anita, como você já sabe. Ela não se importa que tenhamos um relacionamento, não precisa ficar constrangido.
- Verdade! anita falou: - Mesmo porque, quem deveria estar constrangida sou eu, por não pensar que isto poderia acontecer. Eu deveria ter ligado! Mas, agora é tarde, falou, estendendo a mão para ele: - Muito prazer?
- O prazer é todo meu, e obrigado por não fazer questão em dividir sua mãe comigo!
Eu a amo muito, e pode ter certeza, quero um relacionamento serio.
Anita deu uma risadinha por dentro. E pensou consigo mesma: - Pois é! até você, Brutus!
E eu, sem saber o que é isso!
- Vou sair para comprar pão, disse ele; - depois preparo o café, pode ser?
- Sim! mariana respondeu: - enquanto isso, conversamos um pouco.
Quando ele saiu e bateu a porta, Mariana pegou na mão da filha para logo depois perguntar: - E ai, minha filha. Como vai a sua vida em seu novo emprego?
Anita fez uma carinha triste, com uma voz meio embargada como quem estava com vontade de chorar, respondeu: - Não muito bem!
- Por quê? sua mãe perguntou? - Não esta dando certo?
- O trabalho vai de vento em popa, só quem não esta muito bem é o meu coração.
Eu me envolvi emocionalmente com meu novo patrão, e isto está me deixando louca!
- Como assim, se envolveu?
- Estamos tendo um caso de amor!
Mariana franziu a testa: - Nossa! Logo você, que dizia ser contra relacionamentos no trabalho!
- Pois é! aconteceu!
Ele é muito charmoso!
- O seu patrão?
- Não! quer dizer, ele também, mas falo de seu namorado!
- Ah, minha querida. sabe lá Deus, o que o destino nos reserva,
você sabe que eu não procurei nada disso. nem queria, mas, aconteceu.
E as duas começaram a rir sem parar.
- Mas, me fala sobre esta novidade, está apaixonada?
- Sim! estou, muito! mas, ele não sabe!
- Porque ele não sabe?
-Eu não sou de me abrir, e faz tão pouco tempo, que acho que seria leviandade de minha parte dizer que o amo.
Por isso, sofro! Ele também não fala que me ama, só que sente saudades!
- Onde ele esta agora?
- Não sei ao certo,. Pode estar em sua cidade, ou em outro país!
Ele trabalha com exportação de grãos. tem uma empresa em Santos. E viaja muito!
Não me liga, nem manda mensagens, aparece e desparece sem deixar rastros.
- Então, precisa tomar cuidado, ele parece ser casado!
Não, mãe, ele é divorciado. só não gosta de relacionamentos via celular. diz que é meio incerto um amor virtual. que pertence a uma minoria que prefere amor real, ao invés de amor platônico, cheio de promessas não efetivas.
- Isso é bom, disse-lhe a mãe, tentando acalmá-la.
- Talvez! Mas eu fico apreensiva sem saber como me comportar. tenho medo de que esteja mentindo, me usando, sei lá! estou a mil!
- Ah! relaxa minha filha. Tudo á seu tempo!
- É mamãe, falar é fácil!
A porta da frente se abriu, pondo um ponto final na conversa. Roney apareceu com alguns pacotes nas mãos., dizendo alegremente: - Agora só falta o café!
Fez uma mesura, se abaixando um pouco, para depois completar, enquanto já virava-se para a porta da cozinha: - Vou preparar, depois as chamo!
As duas continuaram a conversar, desta vez falavam sobre coisas e situações mais amenas. falando de amigos, familiares, de como a cidade mudara, enfim.
Estavam a mesa, sentados os três, a conversarem alegremente quando o celular de anita tocou.
- Desculpe-me, mas, preciso atender, disse, pegando o aparelho e se levantando da mesa.
Foi caminhando para a sala, e enquanto caminhava, atendeu: - Alô!
- Oi! Onde se enfiou, estou te procurando feito um louco!
A voz de Daniel a colocou em polvorosa, jamais acreditaria se não reconhecesse a sua voz; Porque estaria ligando? acontecera alguma coisa?
- Oi Dani, aconteceu alguma coisa?
- Como assim, aconteceu alguma coisa? Onde você está?
- Estou na casa da minha mãe! respondeu com raiva:
- E porque não me avisou, ou deixou um recado? Assim, eu não perderia tanto tempo esperando. faz horas que cheguei, fui até o escritório, está fechado. Andei pala cidade e nada! Cheguei a ficar preocupado!
- Ah é! E o que pensou? Que eu ficaria sentada no sofá, esperando que você chegasse? Sou sua empregada, mas, não tenho que dar conta de onde eu vou!
Ficou tão irritada que não se aguentou, precisava desabafar, conter-se só a deixaria mais frustrada., começou a despejar toda as palavras contidas: - Não percebe o que faz comigo? não dá noticias, some, e de uma hora para outra aparece e ainda vem com essa de achar que te devo satisfações?
Um silencio profundo se fez do outro lado da linha, apenas se ouvia um resfolegar, como se fosse penoso demais o simples fato de respirar.
E ai, comeu a língua?
- Não!
Quero te ver! Não vou ficar discutindo por telefone, preciso olhar em teus olhos. ver a chama fumegando e tentar apagá-la. Riu meio nervoso.
- Não dá! ela resmungou: - estou a quilômetro de distância!
- Ahn?
- É, estou na casa de minha mãe.
- E onde sua mãe mora? Me dê o endereço, que eu vou até você!
- Mas é muito longe! fica a duzentos quilômetros de onde você está! demoraria umas quatro horas para chegar até aqui!
- Não tem problema, me dá o endereço, por favor!
- Não! espere até segunda feira. volto e conversamos!
- De jeito nenhum. Eu quero te ver agora, Não aguento de saudade!
- Ah, agora sente saudade? Mas não me ligou á tempos, nem quis ouvir a minha voz! Que diabo de saudade é essa?
- Por favor Anita! não faça assim!
Eu preciso te ver meu amor. nem que seja só por alguns segundos!
Ao ouvi-lo chamar de amor, ela se derreteu toda e suspirando profundamente lhe deu o endereço.
Ele se despediu rapidamente dizendo que não tinha mais nenhum segundo a perder. Ela desligou o celular, olhando para o lado da porta da cozinha viu sua mãe encostada no batente á balançar a cabeça, com um sorrisinho maroto nos lábios se pôs a fazer um comentário: - Amor! Que belo é e que transtorno traz!
Anita fez de conta que não escutou, como uma criança mal criada que foi apanhada roubando doces, subiu as escadas bufando, levando consigo sua mochila.
- Não vai terminar o café? sua mãe perguntou:
Já entrando em seu antigo quarto, ela respondeu: - não! perdi o apetite!
Logo depois se arrependeu e voltou, encontrou sua mãe na cozinha, encostada na pia lavando a louça do café.
Uma ternura imensa encheu seu coração. ela a abraçou por trás, foi dizendo cheia de emoção: - Desculpe-me mamãe, Eu agradeço por udo o que fez para mim, foi pai e mãe ao mesmo tempo, não deixando que nada me faltasse. Meu quarto está todo arrumadinho como se ainda me conservasse em sua vida. O que aconteceu foi o seguinte: - Eu fico sem saber o que fazer em relação a este sentimento novo, sempre fui dona de mim, acostumada a controlar tudo que me rodeia, e agora, me vejo assim, sem eira nem beira. completamente perdida e sem direção.
Sua mãe se virou, passando as mãos em seus cabelos, e com uma voz macia falou:
- Querida, veja bem! A vida tem seus mistérios, as vezes nos acorrente, outras nos liberta.
Há sempre um recomeço, e nem sempre recomeçar é fácil. Veja o meu caso: Levei anos para me livrar do medo de me relacionar outra vez. Não estive a procurar por ninguém por todo esse tempo, mas aconteceu. Não porque quis, mas, porque tinha de ser. Se vai dar certo? O tempo dirá! Eu não posso adivinhar o que será, só posso fazer com que dê certo, mas, se não der, pelo menos tentei!
- A senhora tem razão, mamãe!
A mãe á puxou até a cadeira fazendo-a sentar-se, ocupando a cadeira ao lado, serviu uma xícara de café, e em seguida segurou novamente as suas mãos: - De que adianta espernear e fazer drama, quando, na verdade, está fazendo o que o seu coração pede?
Se após algum tempo, vier a saber que esse relacionamento não dará fruto algum, e se, por ventura, continuar a fazer mais mal que bem, você vê o que faz. Mas, por um tempo, eu sugiro paciência.
- Obrigado pelo toque, amor! Eu sabia que podia contar com você, tem sempre uma palavra coerente e sábia para me instruir e ajudar.
levantou-se, colocou a xícara sobre a pia, e continuou a conversa:
Agora eu preciso me preparar, se é verdade que ele vem, já está quase chegando, e eu preciso arrumar o quarto e me arrumar antes que ele chegue.
- Vai lá, minha filha! Sossegue esse seu coraçãozinho e curta seu momento!
Ela subiu para o quarto um tanto mais sossegada, pensou com carinho na conversa que teve com a mãe., chegando a conclusão, de que, realmente, estava sofrendo por nada.
Deitou-se um pouco para descansar, enquanto esperava por Daniel, e começou a sonhar com seus beijos: - Tudo vai dar certo! pensou: - Palavra tem poder!
Algumas batidas na porta a fez despertar. Ainda em transe por ter acordado abruptamente, demorou para por os pensamentos em ordem, para depois perguntar em voz alta: - Que foi?
- Alguém esta a sua espera na sala, sua visita chegou.
Ela deu um pulo da cama, olhou-se no espelho, deu uma escovada nos cabelos, e se viu toda amassada.
- Peça que me espere, já vou descer!
Tirou a roupa que vestia, tomou um banho rápido e escolheu uma blusinha florida, uma calça preta e uma rasteirinha, só depois que aprovou sua silhueta no espelho, foi descendo as escadas com precisão.
Deu alguns passos e voltou, para colocar algumas gotas de perfume. Afinal, não iria se encontrar com qualquer um. Era com o amor de sua vida. novamente se viu a dizer baixinho: - Palavra tem poder! Sorrindo para si mesma, foi descendo, degrau por degrau, até se ver frente a frente com seu amado, que estava mais bonito do que nunca. Tinha um brilho no olhar, um doce sorriso encantando-a ainda mais. Vestindo uma camisa branca de mangas curtas, uma calça jeans azul, meio descorada e um par de tênis também azul. Embora informal, parecia saindo de uma revista de moda: - Quanto bom gosto! pensou:
Ele se levantou, tomando-a nos braços e sem dizer uma palavra à beijou com paixão fazendo sua mãe pigarrear, meio constrangida com a situação. Ela se libertou do seu abraço, e ele pediu desculpas pelo atrevimento, alegando ser pela tamanha saudade que dela sentia.
Dona Mariana ofereceu-lhe um café, ele recusou educadamente, dizendo que chegara mais cedo, e fora para um hotel. La fizera uma refeição rápida para vir buscar Anita para darem um passeio.
Anita parecia um autômato: não falara nada, não ouvira nada, só absorvia em seu íntimo o gosto do beijo trocado e aquele perfume que á inebriava, voltando a fazer-lhe vitima de paixão.
- Vamos? ele perguntou, sem soltar de suas mãos: Ela respondeu com outra pergunta:- Para onde?- Para onde você quiser! Não queria conversar?- Sim! é verdade, aqui não dá!A mãe dela saiu da sala por um momento, voltando logo a seguir, dizendo: Se quiserem eu saio para dar uma volta, preciso mesmo ir ao mercado.- Não precisa mamãe, eu e Daniel vamos dar uma volta, vou lhe mostrar a cidade.E de mãos dadas saíram em direção a rua.Ela sentia-se derreter feito chocolate diante do sol, nunca sentira tamanha vulnerabilidade diante de alguém. As mãos dele segurando as suas á deixava amarrada como quem não conseguia se mexer.Ele estava alegre, olhando a paisagem sobre as calçadas. Era verão, as flores continham um perfume inebriante e selvagem. Os jardins dentro das grades dos portões da casa estavam em festa, parecia mesmo querer pular para fora.Esta rua é muito simpática! A voz suave de seu companheiro se fez ouvir, tirando-a de seu devaneio: - Verdade! É mesmo linda! Eu cresci aqui e é como que reviver o tempo de menina, correndo por essa alameda sem nenhuma preocupação.Agora me vejo adulta e com a mesma sensação de que nada sei, que nada aprendi á não ser viver como todo mundo, com a brisa da vida repousando sobre mim, sem ao menos saber com que cor.- Interessante! repetiu: - A vida é como a brisa, repetiu:E você ainda não entende o meu jeito de ser. Eu...Vamos nos sentar, falou, cortando o assunto, apontando um banquinho na praça.Em uma cidade pequena, as praças estão sempre bem iluminadas e muito frequentada ao final da tarde: Crianças corriam, gritando alegremente umas com as outras enquanto seus pais conversavam sem perdê-los de vista.Anita preferiu sentar um tanto mais afastada de toda aquela tempestuosa onomatopeia, automaticamente se dirigiu para o outro lado da praça, arrastando Daniel pelas mãos.- Prefiro o silêncio para conversar, senão, me perco e começo a ficar nervosa!-Eu também gosto de conversar sem interrupções. E ai! O que manda, minha querida? Ela o olhou até um pouco divertida, nem sabia como iniciar a conversa. Ele parecia deixar tudo mais á vontade. ela acabava se esquecendo de suas queixas. Mas, não podia deixar passar desta vez, nem mesmo deixar-se levar por uma onda de carinho.- É o seguinte, tentou explicar: - Eu quero uma posição sua! Já que não gosta de fazer contato via celular, nem em outra rede social. Eu gostaria de dizer que, desse jeito, é impossível me relacionar a distância. Nunca sei onde está nem em que hora te esperar!- Eu sei que lhe parece difícil, falou em tom suave e comedido: - Mas é como eu sou, estou trabalhando muito para mudar essa situação, e espero que você tenha um pouco de paciência!- Mas, você não pode abrir mão dessa sua decisão de não usar o telefone, pelo menos, comigo?- Não é que não possa. Tudo é possível, minha querida!Eu acho que não é necessário. Sempre detestei estar no meio de um negocio, numa conversa calorosa, e de repente, ter que me envolver numa outra conversa que não faça parte do momento. Ou que, estando no meio de um filme, tenha que pausar para atender o telefone. E ainda, aquela cobrança de que tenho a obrigação de responder uma mensagem imediatamente, porque a pessoa em questão, achou que a mensagem foi visualizada e não foi respondida. tive muitos problemas desse tipo com minha esposa e meus sócios. então, eu decidi abolir este aparelho de minha vida, pelo menos, em questões particulares. Ao invés de melhorar as relações, ele consegue estragar, fazendo da vida da gente um inferno.Se você parar para pensar, há de perceber que a relação se torna muito mais empolgante, quando a gente não esta esperando que algo aconteça, e acontece de uma forma natural, sem que a gente sinta que esta fazendo por ter uma arma apontada sobre a nossa cabeça.- E você precisa ser tão radical? Ela o questionou:- Eu penso assim: - uma vez decidido, se começarmos a abrir exceções, acaba voltando tudo como era antes.Um alcoólatra precisa tomar o devido cuidado para não dar o primeiro gole. E eu fui um viciado em conexão virtual. Não tinha mais vida própria, tudo se resumia em um aparelho ligado na tomada: Televisão, celular, vídeo game. Estive por muito tempo alienado á este meio, não encontrava nem coragem para trabalhar, até que me vi sem outra alternativa, á não ser abolir, de uma forma gradativa, toda essa tecnologia desnecessária. Não que não seja boa, desde que não venha atrapalhar a nossa vida.Imagine-se fazendo amor pelo computador. eu não consigo me imaginar fazendo isso. Seria insano ficar jogando com o amor, como se joga vídeo game. É tão maravilhoso sentir o toque, o perfume, a voz penetrando no ouvido, causando uma sensação real. Depois do amor, ficar aconchegado um nos braços do outro, dormir abraçados, como á perpetuar-se o prazer.Ela o olhava com muita atenção, á pensar que ele tinha suas razões. Ela estava simplesmente, querendo atenção em todos os momentos, em qualquer hora. Não entendia daquela forma. Dizia para ela mesma: - Ninguém entende!- Eu compreendo, ela falou:- mas não entendo.Quando a gente ama, ama do mesmo jeito. Quer ouvir a voz, sente saudades, quer participar da vida do outro.- Sim! Eu sei! Só que, as vezes, podemos estar juntos, até mais do que quando estamos lado a lado! Eu trago você tão nítida em minhas lembranças, que toda vez, que não estou ligado a nada externo, eu posso te sentir em mim com muita intensidade. Tenho que resolver tantos problemas ligado á trabalho, que preciso colocá-la guardada em um cantinho especial, para que não venha á perdê-la quando me encontro longe de tudo.Eu vivo o momento, não gosto de misturar estações, senão fica tudo embaçado!Ela coçou a cabeça e deu um suspiro profundo, acabou falando sem querer: - isto é o que você pensa. eu não sou obrigada a sentir o mesmo, e você me condena a seguir teus passos, mesmo sabendo que meus pés são tão mais pequenos que os teus...
Capitulo 4 (Incompatibilidade de gênio)
Daniel pensou em por um ponto final na conversa sobre sua perspectiva de vida. Queria falar sobre outras coisas, queria tocá-la, abraçá-la,
sentir seus lábios. Mas a conversa tomara um rumo e nem adiantaria tentar outros caminhos.
- Eu já andei mediando entre um passo e outro, meio.... Pigarreou, limpou a garganta e continuou: - Meio a cambalear diante de tantas vontades que não eram minhas. Me instruíam no sentido de colocar as minhas querencias de lado, aceitando a vida como ela foi imposta. Quer dizer: - A favor do certo amor, Porém, eu prefiro o amor certo.
E o amor que pode dar certo é o genuíno amor que será construído dia após dia, sem, no entanto, precisar de regras definidas, como aquelas intermináveis cobranças, e sem sentir necessidade de estar sempre juntos ou a favor disto ou daquilo.
Quando a gente precisa chegar á algum lugar, o que a gente faz?
A gente caminha! Não ficamos á pensar se realmente valerá a pena caminhar, nem ficamos estáticos pelo medo. A gente apenas caminha! Não é assim? Independente do tamanho dos pés?
Então! Se eu digo que te quero bem, e você tem consciência de que estou aqui por vontade própria. Nem preciso falar de amor, nem fazer declarações, nem tão pouco assinar meu nome em seu braço, para que se torne propriedade minha. Nós nos tornamos um só, não fisicamente, mas em sentimentos recíprocos, independente de corpo?
Se o querer um ao outro perdurar porque queremos, de fato, seguiremos pelos mesmos caminhos. do contrário, de que adiantariam palavras?
Eu poderia te ligar de cinco em cinco minutos, mas, haverá horas em que você quererá sossego. eu poderia ficar ao seu lado vinte e quatro horas por dia, e você sentiria falta de privacidade.
Amor não é isso Anita. Amor é a junção da partida e da chegada. A fusão complementar de duas propriedades, que continua individual, embora se torne uma só.
Anita ficou pensativa por alguns instantes, tentando absorver tudo o que ele dissera, e chegou a conclusão de que ele tinha razão, mas, o pulsar de seu coração pedia mais do que simples palavras. Ela queria tudo: Queria mimos, queria presença. Não a presença só, nem só a ausência. mas, a totalidade. Nem mais, nem menos que amor. E ela só conhecia uma forma de amor: Aquela em que dois seres estejam em sintonia, morando na mesma casa, se alimentando das mesmas coisas, dormindo na mesma cama.
Pois é!- ela se ouviu a dizer:- Eu não te peço para ficar, Eu já me decidi quanto ao que quero e espero de alguém. E sei, que não é isso que quero. Eu vou aceitar uma proposta que recebi de fora. Vou para a África, tentar me encontrar, por enquanto, ainda estou perdida!
Daniel a olhou com tristeza, por um momento sentiu que estava no caminho certo para conquistá-la, mas, percebeu que, talvez, estivesse enganado á seu respeito. Como todas as outras, ela queria colocar uma corda sobre seu pescoço, e ele não podia permitir aquilo. Não queria uma história se repetindo, não tinha mais tempo para vacilo.
- Você é quem sabe, querida! tirou a mão que estava sobre a sua e se levantou. para depois falar: - Quando te achar, por favor, me procure. Quem sabe eu ainda esteja te esperando. E foi embora.
Voltou para o hotel, pegou as malas que estavam sobre a cama, desceu até a recepção, fechou a conta, entrou no carro, e voltou para casa.
Anita caminhou devagar pelas alamedas, que agora nem parecia tão bonita. Uma dor no peito a impedia de respirar. Chegou na casa de sua mãe, ela já estava deitada. Não quis incomodá-la. Ligou para a rodoviária, marcou passagem para o dia seguinte bem cedo.
Dormira mal aquela noite, quase não pregara o olho, mas, em seu íntimo fizera a coisa certa. e dizia para si mesma:- Não me dobrarei á vontade de ninguém. Vou entregar a minha vida a fazer o bem. Homem nenhum vai me fazer de boba, nem me usar com tábua de apoio!
Ainda pensando nisso conseguiu se desligar até as seis horas da manhã, quando se levantou, se lavou, e foi para a cozinha. Encontrou sua mãe a preparar o café. Quando a viu entrar perguntara o porque de acordar tão cedo.
Ainda meio tonta pela noite mal dormida, ela sentou na cadeira e começou a relatar o acontecido:-
E foi assim, eu não quero mais falar sobre isso. Coloco uma pedra em cima dessa história. Vou para a África no mês que vem. Eu estava relutando por causa do Daniel, embora estivesse com muita vontade de me aventurar. A Senhora sabe que sou inconstante, as vezes, mas, quando tomo uma decisão, não tem quem me segure.
- Sim, minha filha, a mãe se pôs a falar:- Espero que não se arrependa. Tantas vezes você fugiu de situações como esta, e se empenhou em fazer outras coisas, mas, agora, precisa amadurecer e tentar aproveitar para ser feliz.
- Eu vou ser feliz, mamãe. Palavra tem poder! E deu um sorrisinho raso, como se ela mesmo acreditasse pouco no que falava.
Tomou seu café, a mãe a levou até a rodoviária. Quatro horas depois ela chegou em sua casa. Mas, para sua surpresa o carro de Daniel estava estacionado do lado de fora.
Começou a suar como se tivesse andado quilômetros a pé. O que ele estaria fazendo por lá? depois lembrou que a casa era dele, então, nada de sobrenatural estava acontecendo: A invasora era ela.
Entrou em seu chalé, abriu as janelas para entrar um ar, Começou a arrumar suas coisas.
Algumas horas depois alguém bateu na porta. Ela foi atender, já sabia que só podia ser o Daniel, mas não era.
Ela suspirou antes de abrir a porta. - Oi Andersom, como vai?
Recebeu o meu recado, né?
= Sim! recebi e quis ouvir de seus lábios: - È sério que vai para a Africa conosco?
Ela olhou de soslaio, enquanto colocava um item na caixa: - Não está vendo, já estou encaixotando meus pertences. Sou muito rápida quando tomo uma decisão. também não tenho muito tempo para pensar: - Quando embarcamos?
- Na semana que vem.!
- Dá tempo de comprar mais uma passagem?
- Na verdade, a passagem já está comprada. A associação para a qual nós trabalhamos, recruta voluntários, Temos uma meta, então, é em cima dessa meta que fazemos todos os cálculos.
Somos dez voluntários, compramos uma passagem a mais, caso alguém decida na ultima hora. Se não houver mais nenhum interessado, apenas cancelamos a ultima passagem. Acho que já te falei sobre isto!
- Sim! agora me lembro!
Então, esta decidido: Vou com vocês!
E antes que me esqueça, achou um lugar para guardar minhas coisas?
- Sim, nós temos um lugar para essa finalidade. O templo que temos fica fechado E é lá que podemos deixar nossos pertences. Já que a maioria dos que nos acompanham não tem família no lugar onde residem. E ninguém vai ficar pagando aluguel enquanto ausente.
Anderson parecia ser uma ótima pessoa, ela também já vinha acompanhando o trabalho que eles realizavam em vários países, portanto, não tinha com o que se preocupar.
Logo que o moço se despediu e foi embora. Daniel adentrou o aposento. Anita ficou temerosa com o que viria a seguir: precisava ter uma conversa definitiva, agora, em tom profissional. Doeu-lhe o peito ao sentir a própria indecisão nos seus atos. Queria mesmo era se jogar em seus braços e dizer que o amava, que sentiria a sua falta. No entanto, apenas olhou em seus olhos com uma frieza que não sabia ser capaz, e apenas murmurou sem emoção:- O que faz aqui?
Daniel apenas perguntou sem titubear:- Quero saber o que faço daqui para a frente,
sobre o seu trabalho?
- Arrume outro alguém para acabar o que ainda falta. Como você percebeu: - Esta quase que finalizado, resta apenas alguns retoques, que se tiver um pouco de boa vontade, você mesmo poderá finalizar.
- O que á deixou assim, tão melodramática a ponto de deixar tudo de lado para aventurar-se num projeto que nem de perto tem a sua cara?
- Decepção! talvez! - ela disse com uma voz um tanto embargada pelo sentimento de raiva.
- O que foi que eu fiz?
-Não seria melhor se perguntar: - O que foi que eu não fiz? Pense!
- Não faço outra coisa desde nosso último encontro! Penso que você quer as coisas imediatas, sem pensar no resultado. Eu sou mais pé no chão, devido a própria historia que vivi.
Talvez você esteja certa, O tempo dirá!
- Sim! assim eu espero.
- Você não precisa tirar suas coisas daqui! Poderia ir, sem preocupações, e se, por acaso não desse certo, poderia voltar.
- Eu prefiro assim, não quero nenhum vínculo com ninguém. Se não der certo, volto para casa. Se der, fico por lá!
Ela imediatamente conseguiu sentir a tensão que se instalou naquela sala. Daniel ficou vermelho, como se cada palavra que ela pronunciava lhe atingisse como chicote em suas costas.
- Eu não queria que você fosse. Nós poderíamos conversar, encontrar um meio de achar uma saida. Não é assim que as pessoas normais fazem?
- Verdade! Eu tenho que admitir! Mas, eu preciso me ausentar, mesmo que isto não tenha nenhuma substância para você, eu sei de mim!
-E eu? não conto?
- Você não precisa de mim, se basta á seu próprio ver. Não quer ouvir, só falar, quer aparecer quando der vontade. Eu detesto isso!
Daniel sentiu seus olhos marear de lágrimas, engoliu em seco, para depois falar com voz mansa:- palavra tem poder! - Deu uma piscadela, para depois completar:- Isto não é o fim!
Saiu da posição em que estava, tirou a mão de seu ombro, deu meia volta e foi embora.
O vazio da sala trouxe o eco de seus passos até o coração de Anita, que imediatamente se pôs a chorar convulsivamente.
Chorou até não poder mais, depois, se levantou pegou a mala e também se despediu daquele lugar.
O táxi estava parado bem em frente ao portão, Ao entrar dentro do automóvel Anita suspirou.
Sem querer ouviu-se um murmurio vindo do coração para a boca: - Palavra tem poder!
Não ponho mais os pés aqui!
E o carro foi se distanciando, deixando sonhos para trás. Outras formas de sonhar ainda á esperava, mas o sonhar com Daniel, sinceramente, ela não mais queria.
Ficou hospedada na casa de amigos até a data de embarque. Quando o grande dia chegou, uma imensa saudade de tudo já começava a atormentá-la.
Ligou para sua mãe avisando que estava de partida. Sua mãe ainda tentou dissuadi-la dizendo que ainda daria tempo de voltar atrás. Porém ela não pretendia fazer isto.
Entrou no avião com apenas dois conhecidos, o restante da tripulação eram apenas rostos. Sentiu-se um tanto desconfortável. estava entrando num território desconhecido. Iria passar por privações de todo tipo, E pensou:- só assim estarei segura do que quero e poderei ser o que nunca fui!
Estava pronta para trabalhar em Luanda. Estava seguindo com dois rapazes que já haviam participado
de trabalhos voluntários por lá. ela não sabia ao certo se estava habilitada para tal, embora seus imediatos amigos diziam que sim.
Após horas de voo, finalmente chegaram em Maputo. Uma oportunidade única de conhecer praias fabulosas como os da Ilha de Inhaca e ter contato com os animais da Reserva especial de Maputo- também conhecida como reservas de elefantes.
Anita ficou deslumbrada com tudo o que conseguia ver.
Passaram a noite por lá, na casa de conhecidos portugueses que os trataram com grande cortesia, para no dia seguinte, embarcarem rumo a Luanda em angola.
Embora a vagem fosse cansativa, anita se sentia no paraíso. Parecia a terra que Deus preservara para Ele. Tão cheia de mistérios. Com uma cultura tão rica de ritos e cantorias, onde a alegria predomina mesmo em lugares áridos.
Eles ficariam no bairro de Sambizanga, que fica na região metropolitana de Luanda. Um amontoado de ruas de terra batida sem água purificada.
O bairro operário é como uma imensa favela que comporta milhões de pessoas. onde Lixo e pessoas disputam lugar.
Tão logo entraram na cidade, um sujeito chamado Zola veio em sua direção, com um sorriso alegre cumprimentou Isaías e Célio, para depois olhar para ela, com olhar muito sério, perguntando:- Quem é?
- Esta é Anita, uma voluntária que se candidatou para a nossa causa, disse Isaías:
E, Célio completou: - veio para a missão, porque precisa se encontrar!
- Se encontrar com quem? Zola perguntou, mostrando uma fileira de dentes estragados, num sorriso
quase de gozador:
Anita também sorriu, acrescentado:- Comigo mesma! Embora pareça que estou bem aqui, ao alcance de seus olhos! Não sou o que você vê!
- Você é linda! diferente das mulheres daqui. Vai ser difícil não notar!
Célio olhou para Anita com um sorriso zombeteiro no olhar, para depois abrir um sorriso e dizer:- Já conseguiu um admirador!
Anita também sorriu, apesar de sair meio triste. Sabia que não seria nada fácil recomeçar sem a única pessoa que despertara nela uma emoção sem igual, - Suspirou! e veio em sua mente o nome amado: - Daniel!
A grande descoberta
Os meninos a levaram para uma casa simples: composta por dois quartos, uma pequena sala e uma cozinha.
Ela foi apresentada ao quarto onde ficaria: quatro beliches e uma cômoda para guardar seus pertences. A cômoda tinha várias gavetas. Ela ficaria com uma, as gavetas restantes já estavam ocupadas..
O quarto estava bem arrumado, embora fosse simples.
Ela começou a desfazer as malas, distribuindo seus pertences em lugares devidos. Começou a ficar preocupada, pois era muito pequeno para caber todas as suas coisas. Decidiu deixar alguns pertences dentro da mala.
Voltou para a sala, vários membros da associação estavam acomodados numa espécie de banco de madeira, dispostos um diante do outro. uma mesa central acomodava uma garrafa de água mineral e vários copos descartáveis.
Alguém pegou um copo, colocou água e deu para ela beber, antes, porém, fizeram um brinde, batendo um no copo do outro. e dizendo com tom de alegria: - Á nossa missão!
A nossa missão! - todos repetiram.
E que missão era aquela? ela se perguntava: - O que faria? Nunca havia sequer saído de seu município, agora estava em outro país.
_ E o que faremos? perguntou meio desconcertada:
- O mesmo de sempre! Amanhã, assim que clarear o dia, seguimos para a sede, respondeu um dos rapazes:
Provavelmente encontraremos muitas crianças a nos esperar, muitos dos pais também estarão lá. As outras meninas que você conhecerá em breve a auxiliará no que fazer.
- A causa em que trabalhamos é voltada para o social: temos vários grupos distintos: Uns trabalham
com artesanatos, outros com a palavra de Deus, não em termos religiosos, mas em termos de aprendizagem.
Outros ainda ensinam comportamento, e assim por diante. Cada um compartilha daquilo que sabe.
Anita ficou apreensiva. pensou em como contribuir, se nunca ensinara nada á ninguém!
Ela estava perdida em si mesma, como poderia levar alguma mensagem boa?
Decidiu sair da sala, enquanto seus novos amigos conversavam alegremente sobre o futuro. Se despediu alegando cansaço, mas, na verdade, queria ficar só, para fazer um balanço sobre a sua própria vida.
Lembrou-se de Daniel, do que ele falara sobre amor e companheirismo. Ficou desconsertada ao chegar a conclusão de que ele tinha razão; - Se amor fosse apenas pele e cobiça por corpo, o que seria então o amar sobre a condição de apenas cuidar?
O amor eros, como alguns o chamam. Seria amor em parceria, ou apenas desejo de sentir emoções latentes?
Porque havia nela e em tantos, o desejo de controlar as emoções do outro, quando nem sabia controlar os seus?
Havia mais perguntas que respostas, no entanto, ela sabia que tinha que resolver-se para depois concluir. Seria impossível responder sem esmiuçar dentro dela mesma tudo o que a entristecia e incomodava. que, por, um motivo e outro, não era culpa de ninguém. Talvez, nem dela mesma.
Nascemos livres, quase que totalmente livres, não fosse a necessidade de cuidados essenciais. Ao passar dos anos, o ego flui como ribeirão ligeiro, dai nasce-se muito mais do que simples necessidade.
Olhamos para o que o outro tem, vem então, o desejo de competir. porque competimos em tudo, quase que sem perceber.
Tudo o que conseguimos adquirir consideramos "nosso", não damos margem alguma para que tirem de nós. E quando por força maior algo se perde, o vazio será preenchido com dor.
Assim sendo, quero me afortunar com sabedoria, para que amanhã não venha a colher dor em lugar de amor.
E dormiu sem perceber e sonhou com Daniel, agora, distante.
Pela manhã, alguém a cutucou de leve, chamando-á com voz mansa, quase que a sussurrar: - Acorda menina,
Está na hora de tomar café, o dever nos chama!
Ela abriu os olhos, depois fechou-o novamente, bocejou e espreguiçou-se graciosamente. Até perceber que não era a sua mãe lhe chamando.
Só então, pulou da cama um tanto assustada: - Onde estou?
- Na cama! respondeu uma voz com som de riso.
Anita abriu os olhos e viu uma moça desconhecida sentada na beira da sua cama. - Quem é você?
- Meu nome é katia, sua colega de quarto. Seja bem vinda! disse a moça: demonstrando simpatia. - E você, quem é?
Anita notou que a moça era pequena, parecia bem pequena, quase uma menina, tinha olhos amendoados, cabelos castanhos, lisos e compridos, agraciado por uma franja que a tornava bem mais jovem.
Ela sorriu agradecida, respondendo com sinceridade:- Bom dia pra você também, muito prazer, estendeu a mão.
A moça deixou a mão de Anita no ar, ela ficou constrangida por um momento, mas, logo após viu-se envolvida num abraço.
-Amigas! - disse a menina: sussurrando ao pé do ouvido.
- Amigas! soltou do abraço e sorriu.
Ambas se dirigiram para a cozinha, se encontrando com uma rapaziada barulhenta e alegre. Após tomarem o café, se dirigiram para a sede.
Katia foi mostrando o caminho, pedindo para ela fixar os detalhes para quando precisasse sair sozinha, aprendesse como voltar.
As ruelas pareciam todas iguais, exceto por pequenos detalhes. As crianças pulavam de um lado á outro, atrás de uma bola quase vazia, entre uma nuvem de fumaça que os envolvia. A terra estava seca e as ruas poeirentas, numa cidade que necessitava de tudo.
Naquele momento, embora fosse tudo novidade para os demais, envolvidos numa áurea de boa vontade, entre tantos outros estrangeiros que por ali se ajuntavam, Anita sentiu-se pequena demais.
E pensar que sofria pelos problemas que nem existiam, pensou: - Se tudo se resumisse em sofrimento sentimental?
Se pensou em se achar, tinha plena certeza que ali seria o lugar ideal.- Longe de casa, longe de tudo, numa cidade de lata, onde ao longe se via riqueza e pobreza se misturando sutilmente como se fosse dois mundos unidos e desunidos ao mesmo tempo.
Chegaram, finalmente, depois de enfrentar a poeira, numa espécie de barracão, tão humilde feito coração de mãe.
Algumas crianças ocupavam as cadeiras de plastico colorida, em seus rostos, uma mescla de curiosidade e timidez. Anita os sentiu tão forte como o próprio sentimento que nutria por Daniel. Uma ternura imensa se criava dentro dela, tinha vontade de pegar alguns no colo.
Por longas e intermináveis horas eles ficaram palestrando, falando sobre vários assuntos.
Na hora do almoço, compartilharam a refeição feita por ali mesmo, entre cantos e sorrisos, danças e brincadeiras o dia se findou.
Voltaram para casa com uma boa sensação, como se o cansaço fosse deixado para trás. Pode entender que o sofrimento, na verdade, era também uma forma de existir.
Para alguns significa perdas, para outros, viver!
Ha também alegria onde ha poucos recursos: - de uma forma ou de outra, o mesmo tempo que passa aqui, também passa ali.
Onde o amor impera, não ha falta.
E novamente, Daniel voltou em sua mente, como o raiar de um novo dia, ensolarado e calmo, e ouviu-o dizendo: - Do que sentimos tanta falta?
Eu sinto falta de você, ela respondeu no silêncio do seu coração. Como não percebi isso antes!
A voz de sua amiga Katia veio tirá-la de seus pensamentos:- E ai, colega, o que você achou do nosso trabalho?
- Achei magnifico, penso que não poderia ter aprendido mais: quanto mais a gente se dá, mais e mais a gente ganha.
- Verdade! eu sinto, cada vez que vou embora para casa, que ganhei mais do que ofereci.
Ao chegar em casa, sentiu uma vontade de falar com sua mãe. pegou o celular e já ia discando o número, quando lembrou que ela poderia estar no banho, fazendo amor com seu namorado ou ainda ocupada com o jantar, então desistiu.
No dia seguinte mandou um telegrama para sua mãe com dizeres bem carinhoso:
Desculpa por não ter te ligado,
eu acho que a voz em muitos casos não soaria melhor que palavras,
nas quais poderá de vez em quando, lê-las e sentir como se eu ainda estivesse presente. Estou me sentindo muito bem, apesar da saudade. Acredite, aqui distante, eu sinto muito mais do que quando
estava perto.
Espero de coração que esteja bem !
Te amo!
Uma semana se passou sem nenhuma noticia de seu amor. ela já estava se adaptando ao novo modo de vida. trabalhar sem remuneração, comendo o que chegava a mesa. enfrentando os obstáculos que surgiam com determinação e fé.
Aprendera muito desde que chegara. Agora, estava pronta para fazer um tour, afinal, não viera para a áfrica só para trabalhar.
Zola iria ser o seu guia, e katia sua companhia.
Arrumaram as malas e seguiram rumo a Botswana, um dos lugares que Anita desejara conhecer.
Seguiram de avião, um modo mais rápido e pratico. depois seguiriam de carro até uma cidade turística chamada Kasane.
- Kasane é uma pequena cidade com bons hotéis, onde fica um dos acessos ao Parque Chobe. Lá, tudo é muito selvagem e você vai se surpreender com a incrível estrutura para turistas. zola falava sem parar:- Conheço tudo por lá. Vou te apresentar aos amigos mais chegados.
Anita ouvia com muita atenção enquanto saboreava lá de cima, uma paisagem deslumbrante, que mais parecia miragem.
Nunca pensara que seria tão divertido.
O horizonte a frente parecia tão perto, lá de cima podia ver algumas manadas de búfalos pastando, e ainda, girafas tentando alcançar as folhas de acácia. Tudo tão bonito e surreal para quem viveu sempre na cidade.
Zola não se cansava de passar seu conhecimento sobre a região, sentia-se o melhor guia do mundo, conhecedor de toda espécie de animal.
- Vou levá-la para fazer um passeio de barco, lá onde os elefantes nadam, dizia ele: O por do sol é sensacional.
Não vamos ficar em nenhuma hospedagem no parque, iremos mais longe, na casa de um amigo estrangeiro.
Anita sabia que não teria outra aventura igual a essa. já pensava em se instalar por ali por algum tempo, antes mesmo de colocar os pés no chão.
Depois de algumas horas de voo, enfim, desceram numa pequena pista de pouso, descarregaram as malas, se despedindo do piloto, um pequeno veículo os aguardava e um motorista de semblante cansado, pele queimada e um olhar amoroso os acolheu com um largo sorriso. - Prontos para seguir? perguntou:
- Sim! Zola respondeu, depois de fazer as apresentações.
Zola e Katia sentaram na parte de trás do jeep, enquanto Anita sentava na frente, ao lado do motorista.
Adebumi sentiu-se o rei, seu nome sugeria isso. Parecia mesmo com um rei Africano, pomposo demais para parecer um simples motorista.
Seguiram até Kasane, onde se podia ver as imensas quantidade de hotéis e pousadas. Anita sempre pensara numa região pobre, e se surpreendeu com a beleza e sofisticação do lugar.
Entraram na cidade, depois de darem uma volta, seguiram por um caminho que dava para um território mais selvagem, adentrando mais ao norte, numa simpática estradinha de terra.
Andaram por cerca de uns quinze minutos, e uma pequena cabana já podia ser vista de longe. Adebumi apontou -á com o dedo, dizendo: - É lá que vocês ficarão! O dono está viajando, mas, deixou tudo pronto para que fiquem bem instalados por uma semana. Depois ele volta trazendo mais mantimentos.
Anita se surpreendeu, não esperava encontrar por ali, alguém com tamanha gentileza a ponto de oferecer hospedagem de graça. - Quem é ele? perguntou:
- Um amigo! - respondeu Zola, sem dar mais nenhuma informação.
Ao estacionarem diante da cabana, uma mulher de meia idade saiu da casa, vindo ao seu encontro. Estendendo a mão para ela, desejou-lhe boa estadia. Ela olhou para a mulher com muita curiosidade. Magra, cabelos negros, presos num coque. olhos castanhos amendoados, como era comum na região. Um sorriso aberto, e um olhar amoroso de mãe.
Ela tomou a mala de suas mãos como se fosse pesada demais para ela mesma carregar, quase que puxou de volta, mas, sentiu que seria uma desfeita muito grande, então, se conformou e seguiu-á.
Katia carregou as sua próprias malas, e Zola as suas. Deixando Anita meio sem jeito pelo modo diferenciado de tratamento.
Nada perguntou por uma questão de respeito. Ao adentrar na cabana, Ficou boquiaberta com a sofisticação do lugar, embora parecesse simples vendo pelo lado de fora.
A cabana tinha varanda por todos os lados, uma porta de correr foi aberta, dando para a sala, composta por sofás de madeira com almofadas coloridas. Uma lareira apagada num canto dava um ar de graça. ao ambiente. Cascas de árvores trabalhadas enfeitavam um lustre quase medieval, que descia como cascata sobre uma mesa grande e entalhada que cruzava a sala, de uma extremidade a outra. cadeiras de madeiras compunham o quadro espetacular, tudo muito rustico e nada convencional, mas, de muito bom gosto.
Zola a olhava com admiração, achava que Anita, logo, logo, descobriria que não estava ali por acaso.
A mulher levou as duas mulheres para o quarto que iriam compartilhar. A mobília era tão simples como a sala de estar. Apenas duas camas bem vestida com colchas feitas a mão, coloridas e acolchoadas.
Algumas almofadas estavam dispostas no chão de cimento queimado, tão brilhante e limpo quanto outro comodo qualquer da casa.
As dez horas da noite, após um breve descanso. Maqueda, a anfitriã e cozinheira da casa entrou no aposento para chamá-las para o jantar.
Elas se arrumaram e foram para a sala. A mesa estava arrumada com pratos talheres e guardanapo, como qualquer restaurante requintado. As iguarias ocupavam o centro da mesa: muitos vegetais e grãos misturados, pouca carne e uma taça de vinho do porto.
Anita ficou atônita e não deixou de perguntar:- Como alguém nessa região pode ter tanto, se a maioria ocidental pensa numa África pobre e desprovida?
Foi Zola a responder a pergunta: - Como em qualquer lugar no mundo, aqui também existe desigualdade social. Muitas pessoas de posse vieram para esta região para investir em turismo. e o que você vê nesta região, não são gente daqui, a maioria dos nativos trabalham, mas não são donos de nenhuma propriedade.
Katia entrou na conversa:- Vem muita gente de fora nessa região, principalmente, por causa dos lagos de hipopótamos e elefantes. Também ha uma infinidade de homens nativos que conhecem bem a região e os animais, tornando o progresso da região possível e a pobreza um tanto menor, devido a possibilidade de trabalho.
E a conversa fluiu durante o jantar.
Depois de comerem, todos foram para a varanda, e de longe podiam observar o parque. O céu tinha um avermelhado intenso, como se tivesse sido pintado com cinzel.E o som dos animais chegavam até eles como gemidos inexpressíveis, porque o ar estava seco e pesado, sem nenhuma sombra de vento. As monções já davam sinais de chegada.
Depois de degustarem um bom vinho, todos se recolheram para descansarem da viagem, Zola prometeu levá-los logo cedo para um passeio de barco.
Anita fechou os olhos, veio em sua lembrança a figura de Daniel. Sentiu uma saudade imensa de seus olhos verdes, de sua voz suave, Quase que sentiu seu halito quente, pronto para beijá-la. suspirou doloridamente, acordando sua companheira de quarto que imediatamente lhe perguntou:- Você está bem?
- Sim! ela respondeu:- Só o coração que dói um pouco!
- Está apaixonada?
- Eu acho que paixão soa tão pouco diante do que sinto - expressou com tristeza na voz:
- E por que está aqui?
- Para me encontrar, eu achava! Eu digo:- achava! porque não sei mais! sinto agora que me perco num abismo de emoções desencontrados. Um terror pensar que o que fiz, talvez, não tenha volta.
- Como assim? O que você fez? A pergunta de Katia teve uma conotação de surpresa:
- Ele me amava, eu tenho certeza agora. Mas, no momento, tive dúvidas. Sempre quis formar uma família. Ter um filho sempre foi um sonho. E isso me fez ficar incrédula em relação a um companheiro. Eu esperava que o homem que me escolhesse fosse, de cara, me carregar nos braços, me levar com ele por onde fosse, assim, como nos contos de fadas. mas, Daniel estava longe de ser assim. Muito pelo contrario! Quando presente, estava de corpo e alma, mas, quando ausente, parecia que me esquecia, Nenhum telefonema, exceto quando tinha algo urgente para falar!
Quando pedi explicação sobre isso, ele simplesmente quis me convencer que a vida é assim mesmo. Não devemos esperar muito um do outro apenas viver os bons momentos com intensidade. cada hora com a sua tarefa: - hora de amar, hora de amar! hora de trabalhar, hora de trabalhar!
Katia deu uma boa gargalhada para depois perguntar com delicadeza: - E ele está errado, amiga? Antes mesmo que ela respondesse Katia concluiu: -
As estações do amor também precisa de estabilidade. Não pode ser corroborado de incertezas. A vida não é uma confusão que se misturam como um bom virado. A idade nos leva a compreender melhor todas as coisas: Quanto mais vivemos, mais chegamos a conclusão, de que, amor verdadeiro não precisa de cobrança, só de amor mesmo. E o resultado nunca saberemos. Só vivendo!
A grande surpresa
Anita acordou cedo e como o recomendado, colocou uma bermuda sóbria, cor de caramelo e uma blusinha com decote em v, toda malhadinha com cores verde, preto e palha. Uma bota de salto baixo e cano curto. Sua amiga de quarto fez a mesma coisa, pareciam gêmeas.
-Estou bonita? perguntou a sua amiga, dando uma risadinha irônica:
Sua amiga, prontamente respondeu, com o mesmo toque de ironia:- Até que ficou legal!
E eu?
- Também combinou com você! E ambas caíram na gargalhada.
Depois de prontas desceram até a cozinha para o desjejum. Onde Maqueda servira um pequeno banquete com frutas, pães artesanal e um delicioso café.
Antes mesmo de saírem da mesa. Zola apareceu na porta com um ar de preocupação, falando meio as pressas com um sotaque carregado: - Andem logo com isso, não temos todo o tempo do mundo, o barco não espera. temos que partir!
As duas moças empurraram as cadeiras ao mesmo tempo, se despediram de Maqueda, agradecendo pelos préstimos, saindo pela porta, rumo ao jipe que estava estacionado em frente, onde o deus Adebume já os esperava, sentado, com as mãos firmes ao volante, como se o veículo pudesse escapar de suas mãos.
Depois de cumprimentar o rapaz, as duas sentaram no banco traseiro, enquanto Zola sentara ao lado de Adebume, conversando entre eles em idioma nativo.
Algumas palavras já era meio que familiar como: - Acelere! Estamos atrasados!
Depois de algum tempo, entre muita poeira, já se podia ver, ao longe, o azulado do rio Chobe, entre uma vegetação um tanto seca e desprovida de verde.
Um calor insuportável e úmido na casa dos quarenta graus as deixava quase em pânico, ainda bem que Maqueda preparou uma mala térmica com água potável misturada com grande quantidade de gelo, Só assim Anita e Katia podiam respirar um pouco aliviadas.
O jipe cortava as campanas com um balanço suave, passando por pedaços planos e outros, nem tanto, deixando-as meio enjoadas. Só mesmo a magnifica paisagem para fazê-las suportar a viagem e o calor.
Duas horas depois já se podia ver os animais de longe. Hipopótamos se deliciavam com o capim a beira do lago. Ainda estava escuro, eles comiam enquanto se dirigiam para a água, antes que o sol despontasse no horizonte.
Foi então que Anita viu o que chamou de espetáculo pleno; As cores no céu se modificaram; de um cinza escuro e vultos á uma avermelhado mesclado de laranja e amarelo e uma infinidade de animais e aves , elevando-se acima e abaixo, mostrando toda a exuberância de viveres.
Zola falava sem parar, mas Anita não prestava atenção em uma única palavra, parecia que seus olhos tomavam todo o seu ser, tirando dela o poder de ouvir, apenas concentrada em ver toda aquela esplendorosa beleza.
Ao descerem do jipe, caminharam a passos largos até o barco atracado a beira do lago, pronto para zarpar, os turistas estavam muito excitados, exibindo suas câmeras nas mãos, prontos para registrar qualquer coisa que se movesse na beirada do lago ou até mesmo ao lado do barco, mas, a maravilha mesmo veio logo após, quando, enfim, chegaram no lugar que chamam de: banheira de elefantes, que por sorte, havia uma família inteira deles, se deliciando no banho matinal.
Depois de tirarem muitas fotos, chegara a hora de voltar, antes que o sol ficasse mais forte.
Anita estava um tanto apreensiva, sempre pensara na possibilidade de ficar na África, mas, temia aquele calor extremo. No dia seguinte participaria de uma palestra sobre negócios imobiliários, que, surpreendentemente, vinha crescendo naquela região.
Conversaram pouco durante a viagem de volta, estavam loucos por um banho frio, para tirar a poeira e o cheiro de suor.
Ao chegarem na aldeia, pouco antes de seguirem o caminho que os levava á cabana, sentiam o cheiro de terra molhada, vindo de longe, Um temporal se aproximava, já dava para ver, uma massa cinzenta cobrindo uma porção de terra ao longe, alguns pingos atingia o para brisa do carro, misturados com poeira, formando uma espécie de fundo marrom escorrido sobre o vidro do veículo.
Anita se sentiu um tanto aliviada, pois a chuva, ao longe, trazia, com ela, uma brisa fresca, afastando um pouco a agonia daquele calor insuportável.
Seguiram adiante, comemorando a mudança do clima, fazendo festa, batendo a palma da mão sobre o aço, cantando uma canção tribal, cuja letra, soava para Anita, completamente desconhecida. mas, a alegria contagiava.
Tão logo avistaram o pátio da casa. Anita viu um jipe parado em frente, comentou com sua amiga Katia:- Temos visita, quem será?
Katia deu um sorrisinho raso, como se soubesse de algo, mas, que não poderia contar. Com muito cuidado, respondeu: - Não sei, não! Pode ser qualquer um. Um turista, talvez!
Desceram do carro, entrando na casa, todos ao mesmo tempo, menos o motorista, que deu ré, manobrando rapidamente o veículo, saindo em disparada, levantando poeira.
Maqueda estava na cozinha, preparando um ensopado e pouco conversou, quando elas entraram para tomar água.
- Que cheiro delicioso! ela comentou: Recebeu, apenas um aceno de cabeça como resposta,.
Com um misto de tristeza pela falta de comunicação, resolveu seguir para o quarto, enquanto sua amiga Katia, seguia para outro lado.
Entrou no banheiro, fechou a porta, tirando a roupa devagar. Uma onda de nostalgia se intensificou em seu ser. Sentindo tanta saudade de casa. Abriu o chuveiro, a água quente escorrendo pelo corpo despertou nela um certo alivio e gemendo de satisfação, ficou ali, parada por algum tempo, como se fugisse de seus próprios pensamentos.
Não se deu conta de quanto se demorou no banho, mas, ao sair, notou alguma coisa estranha. Tudo estava extremamente quieto, como se só restasse ela na casa.
Vestiu-se, automaticamente, apenas com um vestidinho amarrotado sobre o corpo nu, Desceu as escadas devagar. Estava sentindo medo, sempre soubera que havia dentro de si, um certo poder de sentir as coisas. Agora, aquilo soava bem mais forte.
Teve vontade de criar asas, de poder voar para casa, assim, como toque de mágica, mas sabia ser um sonho em vão.
Assim que desceu a escada, a sala estava completamente vazia, nem sombra de zola, ou de Kátia. seguiu para a cozinha, também não encontrou Maqueda.
Puxou um banquinho de madeira até a borda da mesa, sentando-se diante de uma garrafa de café, encheu a xícara com a bebida quente, sorvendo alguns goles. Lá fora uma chuva torrencial se precipitava, com raios e trovões. E Anita se perguntava: - Onde foram todos?
Ouviu um ruído de passos vindo do corredor - Sorriu aliviada: seria Maqueda?
Ficou completamente paralisada, quando um rosto bem conhecido apareceu no vão da porta, saudando-a com alegria: - Olá!!! Até que enfim, te reencontrei!
Anita quase caiu da cadeira. Ela esperava encontrar qualquer pessoa naquele lugar remoto, menos Daniel.
Com um tom de surpresa na voz, perguntou: - O que você faz aqui, onde estão todos?
- Todos quem? eu vim para te ver e é só o que tenho pensado em todo esse tempo!
- Como assim? Pensei que tinha tocado a sua vida, pensei mesmo, que já tinha me esquecido!
- Nunca te esquecerei. Você é o amor da minha vida!
- Como soube que eu estaria aqui?
- Eu planejei tudo isso!
- Planejou, como assim?
- Fiz tudo de comum acordo com seus amigos, que também se tornaram meus, a partir de um acordo que fiz. Os contratei para aliar-se a mim.
- Aliar-se? Katia também?
- Principalmente! falou: agora com uma certa pena na voz!
- E onde está ela agora?
- Foi embora, junto com Zola!
- E Maqueda, também se foi?
- Maqueda foi á vila. Eu a instrui a sair daqui por algumas horas, logo, logo, estará de volta!
Anita se debruçou sobre a mesa, colocando as mãos sobre a cabeça, desnorteada com os acontecimentos, Tinha tantas perguntas a fazer, que, naquele momento, a única saída seria chorar, para aliviar um pouco a tensão que a comprimia.
Sentiu a mão de Daniel deslizar em suas mãos frias. Sentindo-se cada vez mais vulnerável, desatou a soluçar.
Daniel ficou sem ação. Já duvidava que fizera a coisa certa.
Afagando as mãos delas, começou a balbuciar:- Desculpe! pensei que ficaria feliz, mas vejo que não!
Anita levantou a cabeça, empurrando as mãos de Daniel com uma certa violência; falando com voz embargada pelas lágrimas: - Ficar feliz? Como ousa! Só vi traição nesse ato.
Não seria mais fácil, simplesmente me procurar, telefonar, quem sabe? Ah! mas o rei não sabe fazer isso. O rei acha que todos temos que ajoelhar-se diante de seus desejos.
- Não é isso, querida!
- Não me chame de querida. Não sou sua, nunca fui e nunca serei! Ainda mais agora, que descobri do que é capaz!
- Eu te amo! Daniel disse baixinho: - Este é o meu pecado!
- Se realmente me amasse, jamais teria me deixado partir!
- Eu não deixei! Você é que partiu por que quis! Aliás, refrescando a sua memória. Eu te ofereci o meu amor, a minha cumplicidade, mas, você preferiu ignorar, não tem nem ideia do que sofri ao vê-la partir!
- E sobre o proprietário deste lugar?
- O proprietário sou eu. faz tempo que comprei este lugar, quando ainda era casado, este sempre foi o meu refugio.
- Então, Zola e Katia sabiam de tudo, foram seus cúmplices desde quando?
- Desde que você veio para cá!
- Eu sabia que havia algo diferente, sempre achei que palavras tem poder. agora, vejo que não só a palavra tem poder, mas, atitudes também! Estava bem desconfiada desde o inicio, mas, pensei que tudo não passava de invenção de minha mente!
- Não! Não era invenção de sua mente. Eu estava por trás de tudo desde o inicio: A sua vinda, a passagem, a estadia, a viagem para cá, o tour.
- E em nenhum momento você pensou em mim?
- Mas, eu fiz tudo isso pensando em você! disse que precisava de um tempo, longe de tudo, então, fiz com que isso acontecesse e é assim que você me agradece?
Ah! devo te agradecer, então? - Muito obrigado por ter me enganado!
- Digamos que não foi um engano, propriamente, tanto, que estou aqui te revelando, tim tim por tim tim, toda a verdade dos fatos!
Anita se desesperou e saiu correndo da sala, indo se refugiar em seu quarto, onde deu vazão á sua dor.
Como pudera ser tão ingênua?
Chorou até não poder mais e devido ao cansaço físico e emocional acabou por dormir profundamente.
Enquanto isso Daniel também se desassossegava em seu íntimo. Fizera tudo errado, agora não sabia mais se fora a melhor escolha.
A chuva só aumentava, Lá fora estava um caos. Daniel tinha certeza de que Maqueda não voltaria naquele dia. Agora tinha a batata quente em suas mãos e nem sabia como se livrar dela!
Andou de lá para cá, a chuva não dava trégua, queria caminhar um pouco para aliviar a tensão, mas, como conhecia aquela região, sabia que era tempo das monções e que a chuva podia cair por dias seguidos, tornando inviável qualquer possibilidade de saída ou chegada. Ainda mais quando tinha permitido que levassem os dois veículos disponíveis.
Resolveu descansar um pouco, mas, não sem antes dar uma passadinha no quarto de Anita, para ver se ela estava bem, Ao constatar que dormia profundamente, jogou um agasalho sobre o corpo dela, cobrindo-a delicadamente para que não despertasse. Depois seguiu para o quarto ao lado, onde se esparramou sobre a cama, cobrindo-se. Embora sua cabeça estivesse a mil, acabou por ser vencido pelo cansaço da viagem e também dormiu.
- La pelas tantas da madrugada Anita despertou, ainda meio sonolenta lembrou-se do que aconteceu. Desceu a escada a procura de um copo de água, estava faminta, precisava urgentemente de algo para comer. Abriu a porta da geladeira e dentro dela encontrou vários potinhos contendo guloseimas de vários tipos, Optou por algo salgado. tirou um pouco de sopa num recipiente, colocou sobre o fogão, acendeu o fogo, esperando esquentar.
Ouviu passos descendo a escada, seu coração parou. Arrependida por ter descido, quase saiu correndo pela porta dos fundos, mas, antes mesmo que desse um passo, Daniel apareceu na porta.
Ela se voltou rapidamente e uma voz dentro dela a fez parar. A voz intima lhe dizia:- Pare de fugir!
Daniel nada falou. Ainda parado na porta, apenas a olhava como se a visse pela primeira vez. Anita o observou meio lacônica. Ele vestia um pijama surrado, de cor azulada, com a barba por fazer, parecia tão vulnerável e tão perdido quanto ela.
Ela fechou o robe, não tinha nada por baixo. A não ser uma pele, agora, arrepiada pelo frio que vinha não se sabe de onde. Até a sua alma estava gelada.
Daniel percebeu a sua excitação e começou a falar:- Está com medo de mim? Não precisa! Já me arrependi o suficiente. Nem pense em sair lá fora!
- Não vou sair, Anita falou meio desconsertada. Já não lhe parecia tão terrível tê-lo por perto.
Convidou-o a sentar-se, fazendo um gesto com as mãos, puxando uma cadeira.
Terminou de aquecer a sopa, colocou em dois pratos, empurrando um para Daniel e outro para ela, do outro lado da mesa.
- Come! ela disse: - Você precisa se alimentar, está com uma cara de cansaço!
Daniel olhou-a com ternura , pegou o talher e começou a comer em silêncio.
Ela também fez o mesmo.
Tão logo, ambos sentiram uma certa acomodação por dentro, como se o alimento tivesse feito um milagre sobre as emoções. Olharam-se em silêncio, por várias vezes, e quanto mais se olhavam, mais o desejo reprimido os aliciava. De repente se viram lado a lado, subindo as escadas. E sem dizerem uma única palavra, foram se despindo. A boca de um se achou tocando a boca do outro e vorazmente se deliciaram com a onda de prazer que assumiu poder naquele preludio. Ficaram abraçados por longo tempo, acariciados por aquele sentimento tão renovador. Até o momento final, quando chegaram ao clímax, eles se perderam no mesmo mundo de emoções. Quando enfim, dormiram um nos braços do outro. derrubando todo resquícios de saudade, que, por um tempo, os deixaram, quase que, anestesiados.
E a saga continua
Pela manhã. Anita acordou primeiro, Daniel ainda dormia com os braços em torno de seu corpo. Ela tirou-o de mansinho com toda delicadeza. Levantou-se colocando a roupa devagar. Foi para a cozinha preparar o café.
A chuva não parava. Espiando pela janela, ela podia ver a enxurrada deslizando para a estrada já encharcada. Já ouvira falar desse fenômeno, mas não imaginava que seria tão intenso, provocando chuva forte e sem tréguas.
Não sabia onde Maqueda guardava as coisas, precisou abrir quase todas as portas dos armários disponíveis até encontrar tudo que precisava!
Depois de tudo pronto, colocou tudo numa bandeja, se preparando para levar o desjejum para o quarto. Mas, antes de dar um passo, Daniel entrou no aposento com uma cara bem alegre, falando com uma certa disposição na voz: - Oi amor, tudo bem?
- Sim! Anita respondeu com certa decepção, queria mesmo era fazer um agrado, servindo-o no quarto. - E você, dormiu bem?
- Sim, muito bem, obrigado!
Ela colocou a bandeja sobre a mesa, puxando uma cadeira para ele: - Sente-se!
- Não vai tomar café comigo? ele disse num tom quase que carinhoso.
- Bom! ela começou a falar. - Eu queria tomar café com você lá no quarto!
Ele mostrou seu melhor sorriso e levantando-se, pegou a bandeja numa das mãos, segurando a sua em outra, dizendo: - Vamos lá, então!
Subiram as escadas quase a correr. Ele na frente e ela atrás.
Ao chegarem no quarto, ele colocou a bandeja sobre o criado mudo, e jogou-a sobre a cama, puxando-a para si, beijando seus lábios rapidamente e com um efeito avassalador.
Ela gemeu de prazer, era tudo que queria! Pensava:- Não poderia haver uma lua de mel, sem sexo pela manhã.
Depois de estarem plenamente satisfeitos, acomodaram-se diante da suculência dos pães amanteigados, regados á geleia de morango e queijo fresco.
- Até quando? pensava ela:
Sempre quisera ter um homem só para ela, sem ninguém entre eles, nem mesmo uma empregada doméstica. Ela á preparar tudo e o amor unindo a cozinha com o quarto., num só prazer - o de comer e amar.
Depois de uma semana, já estava entediada, pensando no quanto perdia. Tudo se resumindo em sexo e prazer. Tinha necessidade de mudança, mesmo que isto lhe custasse algumas lágrimas. A vida não podia ter sentido maior, se as coisas e sensações não fossem bem dosadas. Sentia saudade do trabalho, das conversas com a mãe, dos amigos, da correria que tornava tudo tão mais prazeroso. Porque os excessos só fazem com que o sabor diminua.
Começou a entender bem o que Daniel lhe falara a algum tempo atrás; As vezes, estamos tão obcecados por satisfações físicas, quando a alma está ansiosa por coisas que o momento não pode dar.
Tinha tudo: amor, alimento, carinho e solidariedade, Mas só podia haver um resumo, um triste resumo, onde o amor só cabe a uma pessoa. não pode avançar nem para a direita, nem para a esquerda. E agora, sentia na carne a necessidade de algo mais.
- Porque está triste? Daniel perguntou:
- Não estou! ela respondeu: - só estou pensativa!
- Um dólar pelo conteúdo do que pensa! disse ele em tom de brincadeira:
- Nada de especial! ela respondeu: - Lembrando do que me falou!
- E o que te falei que tira a alegria em teus olhos?
- Que não ficamos á pensar se valerá a pena caminhar, nem ficamos estáticos diante do caminho. Apenas usamos os pés e vamos em frente.
Que se a gente quer bem e tem essa consciência, o faz por vontade própria, sem precisar reafirmar todo tempo e/ou declarar, assinando o nome do amado no braço só para se ter a sensação de ser proprietário um do outro.
Que poderíamos usar o telefone e ficar ligando de cinco em cinco minutos, achando, que, com isso, a gente consegue se ter o controle sobre a vida do outro, mas, isso só faz com que sintamos cada vez mais incompletos.
Eu sinto, agora, a necessidade de outros. O seu amor me sublinha - Acentuando, marcando, mas só pode subsistir quando podemos somar com os outros.
- Está reclamando da solidão a dois?
- Reclamando? não! è bom demais estar com você a sós. Estou pensando que a vida deve ser povoada com muitas réplicas. Não pode se resumir a um ato á dois!
E por falar nisso, até quando ficaremos confinados nesse lugar? Eu não estou presa! Estou?
- Você quer dizer: Sequestrada por mim?
- Sim! Estou?
- Não, não está!
- Então, porque não temos nenhum veículo?
- Só porque chove muito ainda. E Maqueda não pode sair de Kasane, senão já estaria aqui.
Além do mais, não temos sinal para nos comunicarmos. Está um caos. Nada nesta região funciona enquanto durar esta tormenta!
- Tem razão! - concordou:
É que, perdi a palestra da semana passada, me inscrevi e não compareci!
- Palestra? sobre o quê? Daniel perguntou:
- Sobre atuação imobiliária local!
- Ah! Que bom! pensa em ficar por aqui?
- Talvez! E você , não?
- Eu! Ele gaguejou um pouco:- Ainda não me decidi!
Embora estivesse louca para dar uma resposta, resolveu sorrir e dizer com toda a naturalidade do mundo:- Pois deveria!
O mundo vive lá fora, há encantos a se descobrir, há ensejos e desejos de crescimento. Nada foge do tempo!
_ Ah! agora é você?
- Eu? o que?
- Você que anseia por algo a mais!
- Sim! Valeu tanto essa nossa estadia aqui. Talvez, se eu não tivesse vivido essa reclusão de amor, ainda estaria pensando que amor é algo a se discutir, mas, não é!
Daniel sorriu, tocando de leve as suas mãos.
O dia terminou e como não havia muito o que fazer, foram cedo para a cama . Anita dormiu profundamente até amanhecer. Quando acordou, notou estar sozinha na cama. Levantou-se rapidamente, sem saber por que, algo lhe dizia que teria que enfrentar mais algumas pedras pelo caminho.
Entrou na cozinha e como seu íntimo avisara - No lugar de Daniel encontrou a amável Maqueda, tirando um pão fresquinho do forno.
Palavra tem poder! Ela pensou: aquilo só poderia ser brincadeira.
Quando ela pensava estar tudo bem, lá vinha um balde de água fria.
Maqueda se limitou a saudá-la com um leve aceno de cabeça.
Estava bem vestida, coberta por uma manta de crochê jogada nas costas. E sobre a cabeça um turbante colorido.
Anita sentiu-se incomodada, mas teve que perguntar: - Seu patrão, onde está?
De antemão já sabia a resposta. mas, precisava de confirmação.
- Saiu logo cedo, pediu para não acordá-la.
- E disse quando volta?
- Não! E a conversa parou por ai.
Anita tomou o seu café e foi para o quarto, precisava pensar.
Desde que conhecera Daniel, a sua historia parecia um conto de briga entre gato e rato. Parecia não ter fim. Nada era previsível. Nem mesmo a paz era constante.
- Só que eu. Pensava ela: sou boa aluna, aprendo rápido e não vai ser um gato que vai me colocar em cheque mate. Um rato esperto, aprende como se safar, usando as armas do próprio inimigo.
Pensando sobre isso, tomou um banho, trocou de roupa, arrumou sua mala e partiu, sem que Maqueda sequer notasse que saiu.
Se viu a andar pela trilha lamacenta, não se importando com a quantidade de lama a grudar na sola da bota. Andava a passos largos, como se estivesse sonhando, ao invés de vivendo.
Depois de uma hora de caminhada, chegou a uma bifurcação; um encontro de estradas turísticas. E teve a sorte de ouvir o barulho de um jipe vindo de uma delas.
Era raro encontrar uma mulher andando sozinha por aquelas bandas, mas, ninguém deixaria uma pessoa para trás, mesmo sendo alguém desconhecido. Disso, ela sabia. Não se abalou quando o carro parou e o motorista abriu a porta, falando alegremente: - Let's go!
- Thank you!
Ela entrou no carro e o motorista acelerou, nem perguntou para onde ia, sabia que a estrada os levaria direto para Kasane.
Ao adentar a cidade ela disse ao motorista que a deixasse próximo ao aeroporto, de onde esperava encontrar um voo para Luanda ou qualquer outra parte que a colocasse o mais distante possível dali.
Parou diante de um hotel, onde turistas se aglomeravam, a chegar e partir.
Por sorte, logo encontrou um grupo que esperava por um avião de frete. Que fazia voos particulares, de Kasane a Luanda, na cidade de Cabo. Teria que pagar um pouco mais caro, mas, para quem estava fugindo, nada parecia tão ameaçador.
Duas horas depois já se dirigiam ao pequeno aeroporto, onde um avião de pequeno porte já os esperava.
Anita sentiu-se aliviada quando o avião saiu do chão.
Chegando na cidade de Cabo em Luanda, ela reservou passagem para São Paulo, para dali a dois dias, Ficaria num hotel, bem perto do aeroporto. Não queria correr o risco de esbarrar com nenhum conhecido.
Logo que desembarcou no Brasil, sentindo o cheiro de casa, respirou aliviada.
Foi direto para casa da mãe.
Ficou lá por dois dias seguidos sem falar nada sobre Daniel. Sua mãe sabia que algo não estava bem, mas, resolveu nada perguntar. apenas acolheu-a com amor.
Naquela semana, Anita optou por não falar nada sobre a viagem, nem sobre tudo que se passara, embora soubesse que nada fora insuportável, muito pelo contrário, A viagem fora uma delicia, a sua estadia com Daniel, então, fora um tempo dos mais felizes. Tinha medo de contar para a mãe o quanto fora indelicada ao fugir. Com certeza, sua mãe não concordaria com tal atitude.
E o que ela esperava?
Talvez um conto de fadas, com o príncipe correndo atrás dela!
Epílogo
Anita se recolheu em seu quarto sem saber bem o que fazer.
Sua mãe nem quis mexer no vespeiro, deixou que ela descansasse
de suas renúncias.
No dia seguinte, a sangria parecia estar estancada. Anita acordou,
se vestiu e voltou para a cidade em que trabalhou.
Passou na imobiliária, retirou seu nome da lista. deixando bem claro que se desligava
da empresa.
Embora houvesse um tanto de tristeza na equipe. Eles entenderam que Anita realmente precisava de um tempo.
Depois que se despediu de todos, ela voltou para a casa da mãe.
Enquanto viajava, pensava seriamente em tudo que viveu. Em seus momentos de incertezas, em sua dolorida jornada até ali - trinta e dois anos de aprendizado. Pensou:
E ainda não aprendi nada!
Ao chegar em casa, ainda estava um tanto apreensiva quanto ao que fazer. Encontrou sua mãe sentada na soleira da porta, olhando para a rua.
- O que faz aqui, mamãe?
- Penso na vida, disse: soltando uma gargalhada.
Anita também sorriu, dizendo logo a seguir: - Engraçado. Eu também pensava o mesmo!
A mãe a olhou dentro dos olhos, para perguntar a seguir: - O que se passou na África, querida?
Você chegou calada, permaneceu calada e eu não queria forçá-la a dizer nada. Embora esteja curiosa a respeito.
E Anita narrou todos os acontecimentos.
A mãe de Anita balançou a cabeça em negativa, falando a seguir: - Ah, minha filha! Como pode não confiar em si?
- Eu confio mamãe, mais do que o necessário. Só não consigo confiar em amor.
- Como assim? Daniel da vários sinais de que a quer!
- Me quer, mas, não me ama o suficiente para oficializar o que sente. Parece querer ser dono de mim!
Eu me senti tão vulnerável quando ele me contou que bancou a viagem e que fez de tudo para que eu não soubesse, até o momento de aparecer como quem tem controle sobre tudo e todos.
Se eu não o amasse, teria fugido no primeiro momento, mas, não! Sou idiota! Entrei no jogo e joguei melhor do que ele, porque, na primeira oportunidade, quando ele menos esperava, dei-lhe as costas, assim como ele faz sem dar a menor satisfação!
- E o que você ganhou com isso?
- Nada! Mas pelo menos, agora, ele deve saber como me sinto!
- E como você se sente?
- Uma tola!
- E agora, o que pretende fazer, já que deixou o trabalho?
- Então, mãe! Eu ainda tenho algumas economias. Pretendo abrir um negocio próprio. Queria ouvir a sua opinião a respeito, e caso se interesse até poderia participar!
Aqui na rua, logo no final, tem uma casa para alugar. `Pensei em abrir uma loja de roupas ou uma perfumaria. O que você acha?
- Eu acho ótimo, fica perto de casa. E prefiro que seja uma perfumaria, gosto muito desse tema!
- Será que seu marido se oporia, caso sejamos sócias no negocio? Não quero causar nenhum mal estar entre vocês!
- É claro que ele não se oporia, não é esse tipo de homem. Pelo contrario, vive dizendo que eu preciso arrumar algo para fazer, que me tire da rotina do lar.
Acredito até que teria prazer em nos ajudar!
E quanto ao Daniel?
- Como assim?
- Se ele te procurar, novamente, o que pretende fazer?
- Sei lá, dona Mariana! sei lá!
Um dia de cada vez, um propósito a cada manhã!
Depois de conversarem com Roney e tudo acertado, arregaçaram as mangas e juntas limparam a casa, compraram as gondolas apropriadas, obtiveram licença de funcionamento. Começaram a pesquisar fornecedores. Após dois meses de intenso trabalho, tudo estava pronto para inauguração.
Distribuíram folhetos, estudaram as possibilidades de ofertar alguns produtos.
Anita se encontrava muito ansiosa para abrir as portas de seu mais novo empreendimento. Tanto que, nem se lembrava mais do antigo trabalho.
Pela manhã, antes mesmo de tomar o desjejum, já estava no computador, estudando a melhor maneira de abordar sua clientela. Já tinham contratado uma jovem estudante de dermatologia e também usavam muitas revistas voltadas a esse mesmo tema.
A mãe de Anita era enfermeira aposentada, conhecia bem o ramo, isso tornava tudo tão mais fácil para Anita, que só sabia administrar e vender.
Ao chegarem no estabelecimento já havia uma enorme fila, com muitos amigos e pessoas desconhecidas interessadas em conhecer a mais nova loja de cosméticos da região. Quando as portas se abriram, ficaram de boca aberta com a organização.
Tudo a mão, Tão limpo que dava até vontade de puxar uma cadeira e se instalar por ali.
Foi um sucesso total, tanto que o faturamento do primeiro dia deixou todos muito entusiasmados. Roney não parava de dizer: - Nossa! Se eu soubesse disso, já teria feito há muito tempo!
Anita deu risada. Respondendo com ar de alegria:- Pois é? mas, a ideia foi minha!
Passou-se alguns meses desde então.
Anita se enfiou no trabalho, fazendo dele sua razão de viver, não soube mais de Daniel.
Certo dia, depois de um longo dia de trabalho, um amigo de infância a convidou para sair, ela aceitou de imediato. Cansou de ouvir sua mãe lhe dizer que precisava viver socialmente, mesmo que isso não lhe fosse de nenhum interesse.
Antônio fora um menino muito tímido, mas, se tornou um homem interessante. sempre fora apaixonado por ela, embora não a visse a tanto tempo. agora, depois de tê-la visto na perfumaria, despertou nele boas lembranças do passado e aquela paixão de menino veio a tona.
Tomou coragem e a convidou para irem ao cinema.
Depois de assistirem ao filme, passaram numa lanchonete para tomarem um drinque. E entre uma conversa e outra, Anita ia percebendo que havia, por parte de Antônio, outro interesse além de uma simples amizade. Ela não queria, mas, deixou-se envolver pelo fato de que estava muito carente. Nunca deixara se beijar no primeiro encontro, mas, naquele dia, ela se atirou de corpo e alma, numa frenética troca de carinho. Pensava consigo mesma: - Já perdi tempo demais com essa mania de autopreservação.
Nos dias que se seguiram, os encontros aconteciam assiduamente, muitas vezes, quando ela fechava as portas da loja, ele já estava esperando por ela no estacionamento.
Embora não sentisse a mesma emoção que sentira com Daniel, Antônio fazia bem a ela.
Era um bom companheiro: alegre, divertido.
Todos os dias, pela manhã, encontrava uma mensagem de carinho no celular: - Bom dia, princesa, Dormiu bem?
Ela respondia com muito carinho, até que se sentiu meio sufocada com tantos mimos.
Ele não á deixava em paz, Não dava muito espaço para que ela pudesse estar um pouco sozinha a lidar com os próprios pensamentos, mas deixava rolar.
Precisava de autocontrole, precisava mesmo deixar de ser tão chata, lembrando-se dos conselhos da mãe, que sempre a alertava sobre aquela mania que ela tinha de se preservar.
Os dias transcorriam sem que ela percebesse, tanto eram os afazeres.
Certo dia, ela abriu a loja, enquanto não entrava nenhum cliente, abaixou-se atrás do balcão para colocar alguns produtos em ordem.
Não ouviu o sensor da porta avisando que entrara alguém, tão envolvida com o que estava fazendo, até, que, pelo visor do balcão, percebeu um par de pernas encostado quase diante de seu nariz.
Alguém encostara no balcão, mas, se não levantasse, não saberia quem era.
Então, se levantou e quase morreu de emoção, ao ver, debruçado sobre o balcão, nada mais, nada menos, que seu antigo amor.
Daniel estava bem vestido, como sempre! parecia até mais, jovial. Ela reparou no novo corte de cabelo, na blusa de lã, cor azul turquesa jogada no ombro. Na camisa de cor branca e de manga curta, . Mas seu olhar tentava decifrar o sentimento que aqueles olhos tentavam lhe passar.
Antes mesmo que ela conseguisse dizer alguma coisa, ouviu o som daquela saudosa voz lhe perguntando: - Esqueceu-se de mim?
- Não! Não, ela balbuciou- quase que num gemido fraco:
Eu... fez uma pausa - só não esperava vê-lo por aqui, depois de tanto tempo.
- Pois é! eu tenho tanto para te contar, ele disse com uma voz embargada pela emoção:
Precisei de muita coragem para vir até aqui. Eu queria te fazer algumas perguntas e gostaria que fosse muito sincera comigo.
- O que fez você fugir daquele jeito? Logo naquele dia, quando eu lhe preparava uma bela surpresa!
- Que tipo de surpresa, ela perguntou: - Não entendo!
Quando ele ia responder, alguém entrou na loja.
Daniel nem notou, mas, Anita ficou branca ao perceber Antônio se dirigindo para onde conversavam.
Ao chegar perto dos dois, Antônio encostou no balcão, ao lado de Daniel, pensando que era apenas um cliente, ele a saudou: - Bom dia, minha querida!
Daniel olhou-o, de cima a baixo, como se tentasse entender o que acontecia. Para depois perguntar:- Quem é ele?
- Um amigo, ela respondeu:- Antônio, este é Daniel!
- Os dois homens se olharam, estenderam as mãos e se cumprimentaram.
Antônio sentindo-se ameaçado, falou logo a seguir, corrigindo a dama: - Sou o namorado dela!
- Seu namorado, Anita?
Anita não sabia onde enfiar a cara. Travou-se de tal modo, que a voz não saiu.
Só depois que Daniel virou as costas, saindo da loja, ela conseguiu se refazer e olhando bem no fundo dos olhos de Antônio, com muita zanga, conseguiu ouvir o som da própria voz:- O que faz aqui tão cedo?
Antônio ainda não tinha percebido o que acontecera. Parecia que vivia em outro mundo.
A resposta veio sem nenhuma emoção na voz:- Apenas ia passando por aqui e resolvi entrar para ver se não precisava de nada. Qual é o problema?
- Nenhum! ela disse, procurando controlar o nervosismo.
- Só que não precisa passar por aqui todos os dias, não vê que estou trabalhando?
- Nossa! porque a zanga?
- Não estou zangada, mas, você não trabalha mais? Parece que esta sempre na cidade!
- O que quer dizer?
- Sei lá! Da para gente conversar noutra hora, tem cliente chegando!
- Te pego as oito, podemos jantar juntos?
- Hoje não! - ela disse enfaticamente:
- Porque não? - ele insistiu:
- Eu preciso rever algumas coisas, refazer alguns planos!
- Sobre a loja?
- Não!, sobre a vida! a minha vida! - ela enfatizou: - Agora me da licença. amanhã nos falamos!
- Fazendo um sinal de positivo com o polegar, ele falou apressadamente: - ok!
E saiu da loja sem olhar para trás, pensando que aquela dispensa poderia significar mudança.
Anita trabalhou muito naquele dia, parecia que a noite se distanciava cada vez mais, ao invés, de se aproximar;
Não teve muito tempo para pensar no ocorrido nem de colocar seus pensamentos e emoções em ordem. Mas, assim que o ultimo cliente saiu da loja e conseguiu fechar as portas, se deixou cair sobre uma poltrona em seu escritório.
E toda emoção contida veio a tona. Começou a soluçar bem alto, quase que em desespero.
E o amor que sentia por Daniel despertou de uma forma intensa, dolorida como levar um tiro
no coração. entendeu então que andava fugindo do certo, que mesclava um sentimento já construído, colocando outro na história, como se pudesse apagar o que já havia sido e escrito.
Voltou para casa a pé, deixando o carro no estacionamento da loja, precisava de ar puro. Foi andando pelas alamedas arborizadas. A rua, agora, lhe parecia muito iluminada. Seus olhos vermelhos de tanto chorar alcançava o lugar mais alto de sua história. A luz do verdadeiro amor.
Amanheceu, outro dia já estava pronto para ser decifrado e conquistado, Anita acordou bem disposta como há muito não acontecia.
Já havia tomado uma decisão - não poderia esperar mais nem um segundo para por em prática o que resolvera naquela noite.
Ligou para Antônio, pedindo-lhe que fosse tomar café com ela.
E com grande tristeza por ele, terminou o namoro.
Depois de contar para a mãe a decisão que tomara. Pediu que ela tomasse conta da loja, colocando-a a par de todas as tarefas mais urgentes. pegou o carro no estacionamento e seguiu para
casa de Daniel. Seguiu por quase três horas de estrada, numa velocidade constante, naquela hora a rodovia estava quase vazia, permitindo que fosse o mais depressa possível.
Chegou no portão, estava fechado. Já podia ver, ao longe, o carro de Daniel estacionado em frente a casa.
Por pura sorte o portão de entrada de pedestre estava só encostado, resolveu entrar. Não havia ninguém por perto. O caseiro devia estar trabalhando em algum outro lugar, distante da entrada.
Ao aproximar-se da casa, com coração em disparada, notou uma pequena avezinha pulando num galho de árvore. Parecia tão feliz, que a fez parar um instante para observar.
A avezinha pulava e cantava, parecia um concerto de amor. algo tão, maravilhosamente, belo, que a deixou muito mais emocionada. Até que, num doce momento, uma outra avezinha, que lhe pareceu ser a fêmea, veio ao encontro do dançarino. Este lhe cortejou até que ela permitiu o acasalamento. Depois do ato, os dois sumiram entre as árvores.
Ela se lembrou de todos os momentos em que estiveram juntos, em jubilo, Do quanto ela se sentia bem ao lado de Daniel, Nem sabia dizer como pudera pensar o contrario. Aquele era o seu lugar, Ele seria o seu parceiro. aquele com quem desejaria passar o resto de sua vida.
Ao bater na porta, insistentemente, a emoção já ultrapassava todos os limites. Escutou o som dos passos, sabia que eram dele. Assim que ele abriu a porta, pulou em seus braços.
Ele a segurou, fortemente, ela podia sentir o pulsar de dois corações batendo no mesmo compasso. Os lábios ávidos pela doçura um do outro se abriram e se entregaram ao beijo jamais esquecido.
Depois seguiram abraçados até a antessala. Onde sentaram sem nenhuma pressa.
Daniel lhe confessou baixinho: - Quanta saudade meu amor!
Eu preciso te dizer antes de qualquer coisa: - naquele dia em que te deixei em casa para ir até Kasane. Na verdade, sai para comprar um presente. Quando voltei e não te encontrei, quase enlouqueci. fiquei pensando que você não me amava. Que havia decidido vir embora sem se despedir por estar constrangida em me contar a verdade.
Ela colocou a mão na boca de Daniel para fazê-lo parar de falar. depois encostou novamente os lábios sobre os seus. Beijou-o, sofregamente, até quase perder o fôlego, como um pedido de desculpas.
Depois olhou-bem dentro dos olhos dele dizendo:- Me desculpe. Eu achei que tinha me deixado, como das outras vezes, sem aviso prévio, então, decidi, por mim mesma, por fim aquele sofrimento de não saber ao certo até que ponto queria estar comigo.
- Ah! minha pequena, talvez, tenha faltado, de minha parte, um tantinho de verdade. Eu deveria ter te contado, que queria estar com você de todas as maneiras possíveis. Só que não podia falar que ainda não tinha resolvido por completo a historia do divorcio.
Levou quase um ano para que isso acontecesse. Também tive que acertar muitas pendencias na empresa. Não podia, simplesmente, largar tudo, sem colocar alguém de confiança para cuidar dos meus interesses
Bom, mas voltado ao assunto anterior!
Espere um pouco, ele falou: levantando-se do sofá.
Saiu rumo ao quarto, voltando em seguida com uma caixinha numa das mãos.
Isto é para você. O presente que teve que esperar!
- Ela abriu a caixinha e dentro dela estava um anel de noivado. Ao ver a reação de surpresa estampado no rosto de Anita, tomou uma de suas mãos, levou-a aos lábios, levantando-se e ajoelhando ao seus pés.
Com a voz embargada por uma emoção intensa, pediu-a em casamento.
Anita não respondeu de imediato, pois uma lágrima teimosa insistiu em abandonar seus olhos.
- Eu digo mil vezes, sim, ela respondeu:
Fim
Hertinha Fischer