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Eu dando vida as coisas

  E o caminho era suave - sem obstáculos na pronúncia das flores. Um perfumado sonar de cores e risos, que se estendiam na passagem dos ol...

sábado, 29 de março de 2025

Transformados seremos

 Minha alma guarda o que não sei,

do que vivi já me cansei.
Quero o futuro ser,
ser futuro que serei
Sou um pouco do passado,
e do presente refém
Espero pelas cores que caem
nas estações,
Depositadas nem sei por quem.
Se colidem com as flores,
entre folhas e frutos vem.
Tudo cabe neste mundo,
antes que tudo acabe,
Tempo é poço sem fundo,
que nem o tempo sabe.
Escolhe, recolhe e sustenta
E a alma é que se arrebenta
O mesmo que trouxe, leva
No auge é que tudo encerra.
Não consigo imaginar,
Longe da imagem do eu.
Que serei na eternidade,
um eu que não sou eu,
Ou eu no apogeu?

Hertinha Fischer

Sinalização do viver

 Aprendi a tecer arames para cercar-me.

Tenho a liberdade em mim, isto me basta.

O intenso que me vê pelos olhos, 

As claras que me ouvem pelas frestas

A solicitude que me empresta favores

O alcançar que me satisfaz.

O que veio me alcançou

O que foi se distanciou, 

Há! mas o prazer ainda flui.

Na orla da esperança,

traçadas de mero segredos,

canta vitória sem medo,

Do que sou e fui,

do que trilhou e brilhou

Do que percebeu de olhos fechados,

escancarando a luz dos outros lados.


Hertinha Fischer



quinta-feira, 27 de março de 2025

A roda da finitude

 A vida encurta,

O ponteiro corre.

Logo, logo, a gente...

Há como se vai o dia na

rapidez, me leva a correr

andando.

E de leve vai somando.

Quando se percebe já são depois,

de depois em depois é que se percebe

Que a tartaruga virou lebre

Os brancos dos cabelos roubam

a cor.

A tez da esperança vira renúncia,

no descarado passar e passar.

Onde a amizade desbanca o amor

E o tempo seca o suor.

Lá na terra do nunca é nunca mesmo,

só é, sempre, por acaso.

E se caso o sempre vence,

é lógico que o nunca mente.


Hertinha Fischer.




domingo, 23 de março de 2025

Transitoriedade

 E a vida que chegou em mim, 

nem sei de quando

Nem sabia que era vida,

mas, nela ando


Embarcou-me em sua aventura

calçando  minha estrutura

Fez de mim o que aprouve

Se fui, nem sei se houve


Vejo-me e te vejo em mim

Goteja, destila enfim

Se te vejo, nem sei se vim

 

Pequena neste mundo grande

folha perdida neste desmande

E a vida que se expande

me leva com ela, por onde ande


É a terra a dona do tempo

Que tudo encerra no esquecimento

pra dentro leva o ensinamento

Se não paguei, fiquei devendo.


Hertinha Fischer




sábado, 22 de março de 2025

Tarde colorida

 Hora do silêncio das flores,

dormindo no seio da terra,
acolchoando-a com cores,
cobrindo-a de amores.
Folhas deitaram para descansar
flores secaram para encantar
tilintando doce melodia
quando os pés forem passar
Doce é o outono
tempo que senta no trono
debulha o que estava acima
do baixo se torna dono
Tudo parece morrer,
olhos que não mais pode entender
Que a seiva ainda perdura
para tempo de renascer
Hertinha Fischer.

Fidelidade e compromisso do existir

 Há um só palco e uma só peça.

Bancos vazios e pouca gente aplaudindo.
Pouco importa: bons protagonistas se incumbem
de fazer o prazer rolar pelo tapete vermelho.
É só uma questão de realização naquilo que se
comprometem.
Um passo, alegrias, dois passos: pura satisfação.
O desencadear da história de cada um se presta a
dizer o que cada um pensa, de acordo com o
que cada um predispõe a acreditar.
Foi assim, é assim e continuará sendo.
Bem se diz que não somos diferentes
dos animais. O que acontece com um,
acontece com o outro.
É pra ser só uma questão de sobrevivência.
Mas, o homem se mete em tudo com
muita astucia.
Não quer só o palco, nem só ser personagem na vida,
ele quer a diretoria.
E como diretor, coordena o que os outros
devem dizer e como os outros devem representar e
até como se deve amar.
E assim acabamos por perder a originalidade,
nos tornando fantoches, num palco
infestado de hipocrisias.
Não se dando conta que tudo é finito.
Deus nos conta que somos semelhantes a ele,
Assemelha-se, talvez, na sua originalidade.
Mas, quando fugimos de nós mesmos, confiando na
metamorfose, como se fossemos criados em casulo,
como a ciência quer que acreditemos. Dai entra toda sorte
de infortúnio. Por que nos afastamos da bondade em justiça.

Hertinha Fischer.







domingo, 16 de março de 2025

A liberdade que Deus concede

 A aparência nega, sim, nega a essência.

Há aqueles que julgam saber, afiam a língua para falar,
como se afiassem uma enxada para capinar.
No entanto, pouco falam sobre si, porque, na ânsia do saber sobre os outros, negam a si mesmos por fraqueza.
Condenam os seres humanos, sem se darem conta, que são massas batidas no mesmo liquidificador.
Se negam a existência de Deus, como saberão explicar a vida?
Procuram por algo que nunca vão achar, já que se consolam com aquilo que morre.
Esmiúçam na palavra, mas, no viver, há falta de concentração.
A biblia não tenta provar nada, mas, assume Deus como um fato. Não encarcera, por que acredita que melhor se faz em liberdade.
Quem procura se consolar naquilo que morre. A morte parecerá o fim.
A palavra de Deus não nos é imposta. Nem o crer é acessível aqueles que fazem questão de se perder.
Hertinha Fischer.

sexta-feira, 14 de março de 2025

Revelando-me como pessoa

 Já se ia as longas horas,

que delongas me contaram
As colinas cansadas declinavam, suavemente,
sobre uma superfície montanhosa.
Enquanto meu semblante se rejuvenescia,
na altivez do pensar.
Nunca me sentia maior, nem melhor,
só uma miudeza sem igual,
como as asas de um gafanhoto,
sustentava-me no alto.
Fui crescendo entre meio,
sem saber, ao certo, se realmente,
era.
Tudo me parecia grande demais, impenetráveis demais,
para que pudesse fazer parte.
Foi ai que me engrenhei em mim, fui adentrando
na sutileza do eu, quase que, em murmúrio,
para que eu mesma pudesse me escutar.
E ouvi meu próprio falar como os surdos
ouvem seus grunhidos e os compreende.
Atentei para a descoberta silenciosa de
poder, sem que soubessem que sabia.
E a poesia voou para dentro, e se propôs
a falar para fora, jorrando-me para a
completude da vida plena.
Ouvindo-me e relatando-me.

Hertinha Fischer.

quinta-feira, 13 de março de 2025

"Heimatlos

 Onde eu estava?

Não sei!
Ainda não sei se estou,
sou apenas uma energia que
se perdeu entre outras que
foram surgindo.
Tentei submergir lá do fundo
do oceano da vida,
e só encontrei, na superfície,
uma forma de me afogar.
Só dependia do não crescimento,
mas, as células, se multiplicavam
enquanto dormia, e os acontecimentos
não davam-me alivio.
Tive que seguir por meios próprios,
próprios daqueles que nasceram
sem folga.
Nunca folguei por completo, mesmo,
quando, na solidão, meu corpo se
ausentava de mim.
Por um dia! Só por um dia, pensava: E esse dia
chamava outro e outro.
Não quero futuro, nunca o quis, aliás, ainda não quero.
se quisesse, provavelmente, não teria,
pois tudo colabora para me contrariar.

Hertinha Fischer.

sábado, 8 de março de 2025

Guerra interna

 Há sessenta e quatro anos nascia eu.

Eu no circo de lona azul,
pairando acima de um tapete verde,
Como tatuzinho morando em buraco de terra,
acima da terra.
Anãzinha de pele queimada, olhos esverdeados,
misturados com galinhas e cães.
Onde rios saiam a passear na mata, traçando atalhos como
chão de formigueiro.
Despencando em penhasco, caindo, lindamente,
com suas saias rodadas e brancas.
Sem saber onde vai, vou eu,
a andar pelos encantos da mata,
tuneis de ensejos se abrem.
Vi algumas trincheiras abertas por sobre a mata fechada,
Talvez ali, houve guerra.
E a guerra interna trava ainda dentro de mim,
que, ligeiramente, segue as borboletas,
e como elas, desejo voar.
Tento seguir como quem segue uma presa,
com a agilidade de quem precisa, e precisamente,
se esgueira, muitas vezes, se arrastando.
Confrontando as mesmices com olhos
de lince, a caçar coelhos.
Quanto mais penso, mais me consumo nesta
canseira de existir.
Os anos andaram em mim e me expuseram a mudanças,
tão radicais, que já não consigo voltar.
Também esqueci de como andar viçosa,
A esperança ainda brota,
como brota os galhos cansados,
até que a seiva perca a sua função,
e a terra consuma os galhos secos.
Hertinha Fischer



quarta-feira, 5 de março de 2025

A meia Luz

 Em terra pisei,

pausei, pousei e passei.
O vicio de andar me embebedou
Areias bebi com licor.
Errante se deu num instante
Tantas vias e fatos constantes,
via e ouvia a metade.
Terra fogo não come,
um pouco de pedra é homem

Epidemia de sons,
metamorfose cruel,
muito, que parece pouco e
pouco que parece tudo.

A casca conta quem é,
e no que parece e não é.
A poupa que conta tudo,
atrás do espelho se esconde.

No reverso canta o verso,
soneto que anda disperso
nem é noite nem é dia
A meia luz fica imerso

Ainda não me entendi,
quando quero e nem quero,
quando gosto e desgosto
tudo no mesmo passo.

Vou e é tudo que quero
Voltar é sacrifício,
ficar, espero.

Hertinha Fischer.

Um dia fiz morrer

 E a noite cai sobre mim,

Sua pesada mão me aconselha,

A escuridão abate minha alma,

sussurrando calma em minhas orelhas.

Onde foi os meus jardins?

Em que terras se meteu.

Se perdeu o azul do céu,

 escondeu o que era meu

Fui ao encontro do amor,

ele desapareceu,

A lua que antes sonhava, em

eclipse se dissolveu.

Eu queria ter ficado, mas

o tempo me levou,

Me acusaram de silêncio,

e o grito então morreu

Eis que fui despercebida,

nem olharam nos olhos meus,

pra saber o que continha, 

dentro dos sonhos que se perdeu.

Já alcancei as nebulosas,

Nesse tempos estelares,

sobrando poeira e fumo,

descolorindo todas as fases

As janelas já se fecharam, 

finco da porta, a soleira

Esperando dias melhores

na hora já derradeira.

A força antes tão abundante, 

agora, fecha a torneira.

Hertinha Fischer


terça-feira, 4 de março de 2025

Saudosas tardes rosadas

 As acaloradas e rosadas tardes de verão abriam caminho para o descanso merecido.

Ao deixar a roça, se abria um pequeno trilho entre a vegetação rasteira, que se acabava numa estradinha de terra, onde passavam sonhos de rodas. Ao lado, havia postes de transmissão de dois módulos, deslizando no ar, várias linhas em simetria, que pareciam dançar no ar.
Um romantismo para todos os olhares cansados.
Saindo da estrada, outro trilho, marcado por um pé de bananeira nanica, levava a dois pessegueiros, plantados, um em frente do outro, No meio, o trilho se jogava para um terreiro imenso, Do lado de baixo, grandes arvoredos se deixavam crescer até o céu, do lado de cima, infinidades de bananeiras de todas as espécies, disputavam lugar. No meio do bananal, uma passagem de pedestres, largo e sombrio, que se ia até outro terreiro menor, desbocando, um pouco mais a frente da primeira passagem da casa para a estrada.
Dentro do contexto, a casinha se destacava, sentada na base do primeiro terreiro, com bananeiras também ladeando á suas costas.
No terreiro de cima, havia o paiol, onde se guardava a colheita. As vezes, de milho, noutras de tranças de cebola.
A morada continha uma pequena porta de madeira que se abria para oeste, outra para o sul, Duas janelas pequenas e desajeitadas de abriam para o norte, E uma para o sul. Ao leste ficava suas costas, que se encostava com um grande pessegueiro, que segurava um varal de roupas, feito de arame farpado, que se esgueirava acima dos capins até se encontrar com um coqueiro, que ficava ao lado do primeiro chiqueiro.
Abaixo do chiqueiro, o pasto do cavalo, Também cercado com arame farpado, ladeando uma boa parcela de terra, que ia até um taquaral a beira da estrada, descia até o rio, e do rio, vinha ladeando o segundo chiqueiro, feito por erosões, subindo pelos braços da mata, até, novamente se encontrar com o primeiro chiqueiro perto da casa..
A frente havia um mata burro, por onde havia a passagem para buscar água no rio, lavar roupas e chegar até outro mata burro, que se abria no segundo chiqueiro feito por erosão, onde se preparava a terra para os canteiros onde semeávamos as sementes de cebola, que, tão logo, alcançasse bom tamanho, eram retiradas e plantadas em terrenos, preparados, acima da estradinha de terra.
Encantos se espalhavam por todo lugar, goiabeiras davam seus frutos de quando em quando, enchendo os ares com seu perfume.
A pequena casinha contava histórias passadas, por onde se olhava havia vestígios: Ora um descampado, ora, se achava uma árvore frutífera perdida no meio da mata!
Quando ali chegamos, estava tudo abandonado, mas, assim que o lugar nos conheceu, começou a brilhar novamente.
A composição de um lar, modelado a mão antiga, Tesouros de terracota enfeitava paredes : desenhados pelas mãos do tempo, ressecados, formavam imagens.
O assoalho de terra batida, de tanto mimo, já se tornava meio tonto, Tinha certas ondulações, que os tijolos consertavam, para nivelar os pés das camas.
Dois quartos - Um para as cinco crianças e um para o casal, a cozinha já se aprontava para as fieis refeições, que nunca faltavam, se deliciavam nas panelas bem limpinhas, ariadas com perfeição, em cima da quentura de um fogão á lenha.
A sala de visitas, nunca era usada, ficava a observar o passeio da criançada que á usava apenas de passagem. Apenas o patriarca se sentava numa das cadeiras, a tarde, quando botava o rádio para funcionar , para ficar entendido dos acontecimentos longínquos.
Oh! que magia, tudo funcionando e resultando em alegrias.
Não havia pobreza por aqueles lados, só uma vontade imensa de viver. O que se plantava, se comia, e era tão farto como um restaurante qualquer de uma cidade grande.
O porco gordo que se abatia, ficava guardado em pote de barro, dentro de sua própria gordura, como um açougue a disposição, assim como os frangos, colhidos no quintal de casa. Bastava pegá-los sábado á tardezinha, para comê-los no dia de domingo.
O feijão sendo plantado, cuidado, colhido, batido, peneirado, ensacado, depois, direto para a panela.
Não me lembro de um só dia que não seria dia de festa.
Começava com a cantoria do galo, de madrugada - As galinhas despertavam e ficavam aglomeradas perto do chiqueiro, esperando que o milho fosse debulhado. Após, saiam cada uma para um lado, a ciscar ou botar seus ovos.
Depois o cheirinho de café que chegava até a cama, um convite para se levantar. Parecia uma prece, a prece de todas as manhãs.
Meu pai ia para o rio, com a toalha no pescoço, para se lavar e começar bem o seu dia. Nós ficávamos esperando que ele voltasse. Assim que ele abria a porta, todos pulávamos da cama em sintonia. Hora de tomar aquele café com pão amanhecido torrado.
Depois do desjejum, Ele colocava o seu conga azul, nem precisava falar nada. Saíamos para a seara na roça. Cada dia uma tarefa . Ora carpindo, ora plantando, ora arrancando matinhos com as mãos, entre as mudas de cebola.
Só quando chovia é que ficávamos presos dentro de casa. E mesmo assim, achávamos um jeito de ocupar o tempo. As vezes, lendo, outras vezes, aborrecendo uns aos outros.
Mas, o tempo voa com asas de borboleta. Bate- bate e vai em frente. Some!
E assim foi - é lembrado, que nasce a saudade, as lembranças e por que não dizer: o esquecimento.
Outro tempo se precipita, outros lugares nos comporta, outra idade nos distrai. Pessoas vão indo embora, pessoas vão chegando, agregando, abarrotando o sentido de tudo. E quando a gente percebe, estamos no mesmo patamar. Com muito menos história pra contar.

Hertinha Fischer.










segunda-feira, 3 de março de 2025

Moribunda imagem

 Gaiola de ouro, presa dentro do passarinho.

Anéis enfeitando, corpo de canarinho

Suados sussurros, silêncio noturno

Alegoria controlando os passos do taciturno

Houve tempo de Luar,

Luz fraca a enfeitar.

Tudo enfim, se apagou,

só restou o lento vagar.

Samba e enredo sem razão,

caça rabos de um cão.

A beleza se esvaiu,

oco e feio se viu

balançando em terra seca,

a bandeira do Brasil.

Quanto mais terra se tira,

mais fundo fica o buraco,

suntuosa mansão, por fora,

por dentro, pobre barraco.

Hertinha Fischer



domingo, 2 de março de 2025

A derradeira tarefa

 E repentinamente, ela emudeceu diante da possibilidade de ter que deixar seu corpo. Não queria sair de si, Não queria seu espaço vazio, mas a força, antes, tão fogosa, agora definha na incerteza.

Já sabia que um dia teria que partir, mas, não queria acreditar que em algum momento, teria que abandonar sua casa, seu companheiro e tudo aquilo com o qual convivera por décadas.

Seu quintal bem feito - aquele sol da manhã, que espalhava perfumes em sua sala de estar.
A mesa, onde guardava seus mais ousados sonhos, quando, pela tarde, encostava seus cotovelos e colocava a vida para açucarar.
E a comodidade do sofá da sala que, a noite, se fazia, macio, para lhe ver descansar.
As paredes que guardavam tantos passos, o portão, que, por tantas vezes a viu sair ou chegar. Que não poderia mais fechar ou abrir.
A poderosa cama que a acalmava enquanto dormia, E que agora, suavizava um pouco, o corpo já sem forças.
Tinha tantas coisas por se dizer, que precisava, as vezes, cochichar para as paredes. Já que ninguém quer ouvir um moribundo a falar coisas sem sentido.
Havia uma coisa que ela gostava de lembrar: O tempo em que viveu sem aquela preocupação em tomar remédios para se sentir melhor.
Nascera numa casa modesta, a segunda filha, sendo que, a primeira não sobreviveu mais que três meses de vida.
Sua mãe tivera a primeira filha, logo que se casara. Mas, a criança teve uma doença com apenas dois meses de vida, vindo a morrer aos três.
Naquela época, as mulheres engravidavam depois que deixavam de amamentar, Não havia métodos para evitar.
Tão logo a primeira filha veio a óbito. Sua mãe engravidou, após, nove meses, veio outra menina. Esta menina era ela, cheia de vida e bela como uma manta de tramas bem feita.
Talvez pelo trauma da perda, a mãe teve dificuldade para amamentá-la, por causa do abcesso em ambos os seios.
Teve que ser alimentada com água de arroz, e eventualmente, com leite de vaca, já que naquela época, tudo era mais difícil. Não tinham nenhum modo de refrigerar alimentos.
Ela ficou raquítica e não cresceu como deveria. No entanto, havia uma força sobrenatural, que fez com que sobrevivesse e se tornasse uma linda menina.
Com pele branca e algumas sardas, cabelos negros levemente encaracolados como de sua mãe.
Tinha apenas um ano e meio quando veio outra menina, também de pele branca, cabelos loiros como espigas de milho seca, sem ondulações.
Cresciam juntas, como duas crianças felizes. Aos seis anos de idade, já havia, além da irmã, mais dois novos membros. Um menino e outra menina.
A mãe sempre atarefada com as crianças e os afazeres da casa e o pai a trabalhar na lavoura para trazer o sustento, fez com que tivesse que trabalhar bem mais cedo.
Fazia pequenas tarefas como levar o almoço para o pai, na roça, ou cuidar dos mais novos, quando a mãe tinha que ir para o riacho para lavar roupas ou buscar água.
Conforme os anos foram passando, as tarefas foram aumentando, gradativamente, até que, passou a ajudar o pai na lavoura.
Como filha mais velha, isso fatalmente iria acontecer. Sua força de vontade superava a pouca estatura, e logo se viu, sendo o braço direito do pai. Agora, todos os outros irmãos já estavam sobre seu comando.
Viu-se a buscar água na bica, logo pela manhã, depois levava o almoço do pai até a lavoura, e a tarde, levava o café, aproveitando para ensinar a irmã mais nova, tudo o que sabia e que aprendera com o pai.
Certo dia, seu pai ficou preocupado. Já estava tarde e o café não chegava. Então, abandonou a foice e voltava para casa, foi quando viu duas menininhas a brincar num pequeno córrego que atravessava a estrada. Ao chegar mais perto, viu suas duas filhas rindo ao colocar os bolinhos na água, fazendo de conta que eram barquinhos, pulando e gritando de alegria ao vê-los nadarem.
Seu pai ficou furioso, mas, também sorriu, não podendo deixar transparecer a graça. Fez com que voltassem para casa com ele, e após tomar seu café, voltou para a roça.
Foi assim que cresceu, tendo que parecer mais velha do que realmente era, e mais grande que sua própria estatura.
Logo começou a perceber que poderia colocar os irmãos para trabalharem, a fim de não sobrecarregar-se demais.
E lá estava ela, dando ordens aos mais novos, enquanto trabalhava arduamente na lavoura com o pai, distribuindo tarefas a cada um deles.
Sua imaginação aflorava enquanto crescia, logicamente, já sonhava em se casar.
Seu pai não deixava que as meninas conversassem com rapazes, mas, ela, dona de muita esperteza, já começava a dar seus pulinhos. Saia com as amigas no domingo a tarde, para fazerem visitas. Quando, porém, encontrava um moço atraente, as visitas se tornavam muito mais assíduas. Uma de suas amigas tinha um primo muito bonito, morava um pouco distante de sua residência, mas isso não impedia que se encontrassem de vez em quando.
Sua mente se realizava em sonhos, como se o que vivesse no dia a dia, bastasse para continuar a existir.
Domingo era um dia diferente de todos os outros. Seu pai dava folga para ele mesmo e os outros seguiam o mestre. A tarde livre tinha gosto de aventura, longe do olhar inquisidor de quem quer que fosse. Nesse dia a luta dava descanso, para nascer outros sabores diferentes de diversão.
A dura vida de roceira estava entranhada em si, era a única maneira que conhecia de subsistir. Seu anfitrião lhe deslocava para lá e para cá, dando certa importância ao que fazia. E realizava, como abelha rainha, a construir maneiras e maneiras de aprender.
Enquanto a irmã um pouco mais nova que ela, cuidava dos pequenos afazeres em casa, para ajudar sua mãe, ela se desdobrava para não fazer feio frente ao pai. Realizava quase todo trabalho junto com ele.
Franzina em tamanho e uma fortaleza por dentro - capinava, abria covas com a enxada, buscava lenha para alimentar o fogão, regava as mudas com regador, tratava do cavalo, buscava água no rio, destrinchava um porco, inteiro, como ninguém. cuidava dos irmãos mais novos, Sempre ela a frente, atrás do papai.
Por sorte, aprendeu a colocar os irmãos para trabalhar, tornando menos árdua as tarefas que eram lhe atribuídas. Mas, a parte mais pesada, ela carregava sem reclamar.
E o tempo a despertou para o brilho. Fora da lavoura, se esmerava em procurar por amor.
Os rapazes estavam sempre por lá. Tinha um que a queria, fazia tudo para chamar-lhe a atenção. No entanto, não fora bem sucedido. Ainda havia um certo medo de namorar.
Medo de enfrentar a ira do pai, que dizia: É a partir de amizade e conversa com rapazes que tudo começa.
-È claro! ela pensava: -Como começar sem conhecer?
E os dias iam se indo, como quem obedece ordens. Aliás, de obedecer ela sabia bem.
Começou a se convencer de que teria que sair da roça. Só assim poderia, alcançar a liberdade tão desejada.
Tinha muita vergonha de ser quem era. Havia uma certa pureza em seu pensar.
De certo modo, sentia um certo ciúme, de quem, errante, estava livre.
Aconteceu que, em certo momento de sua história, as algemas foram retiradas, e ela pode conhecer o outro lado da moeda.
Só não sabia que a maneira de existir de cada pessoa é diferenciada. E mesmo livre do sistema patriarcal, sua alma estava acorrentada nos princípios.
Saiu da solicitude de sua casa, enredando por caminhos desconhecidos e maus.
Tentou montar um negócio na cidade, e, inocentemente, perdeu mais um pouco.
Conheceu um homem que desejou, fez o possível e o impossível para colocá-lo em sua vida. E o casamento veio a acontecer, de modo simples sem nenhum glamour.
Logo a causa deu seus frutos, e uma linda menina nasceu.
Enfeitou sua alma de luz, pode enfim, saber do que se tratava a vida.
Traçou caminhos, fincou estacas em suas defesas, chorou ( por que não) as vezes.
Luas e sóis traçaram dias e noites, lençóis e travesseiros cavaram tempo, e como o tempo corre atrás da gente, logo ela estaria a deriva.
Buscou solução onde as palavras lhe davam esperanças. Trabalhou dentro de si para não sucumbir. Tratava-se de vida, mas, sabia que a vida tem seus declínios.
Quarenta anos depois, o tempo lhe apresentou outro membro, uma menina linda que lhe deu o nome de avó.
E mais uma vez, o destino distorceu seu caminho.
Teve um infarto, foi parar em um hospital, quase sem pulso.
Ficou por vários dias na U.T.I , sendo medicada por remédios fortes, perdeu o sentido do que ocorria em seu redor.
E teve mais uma chance. A vida ainda lutava.
Passou se os dias a correr mais depressa, agora ela tinha uma pontada de esperança, que, as vezes, lhe dava um pouco mais de energia, mas, o corpo fingia. Não era a mesma e sentia as vibrações cada vez mais lentas.
E o medo de deixar a construção para trás, ainda emerge, como quem se prepara para o último estar.
Não quer ir embora, mas, as malas já se arrumaram. E logo terá que partir.

Hertinha Fischer






























Quando se vê

 Eu me vejo, talvez

Tu me olha, será?
Em que frente, mentes
O íntimo acomoda e incomoda.
O ir é repente.
as estradas, inocentes.
O resolver, matemática
Resolver-se, sistemática.
O tempo, sal te a dor.
Derruba árvore, rega a flor.

Hertinha Fischer

sábado, 1 de março de 2025

Saga do viver

 Entre tantos, também despertei,

Se vinha ou saia, também eu não sei.
Na boca o sono do sonho de alguém.
Chorando as vezes, sorriso escutei.

Orbitava em mim mesma, a chance de ter
Algo que brilhasse um eu que pensei
Se era ou seria, quem poderá me dizer
Me fartei de suspense as lágrimas que chorei

Se já era hora, também era dia,
Esperança em meu peito me convenceria
Que, os medos, as vezes
me socorreria.

As pontes já podres por onde passei,
Em vertentes sussurros lá embaixo mostrava,
O eu se perdia na busca de si
No ar rarefeito que a alma buscava

Ainda em perigo, avante mulher.
Doravante só sobras e nostalgia
Da distancia que já percorreu,
Sobraram as cinzas do que se acendeu.

Hertinha Fischer.