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 Me encontrei com o mundo das letras quando o meu mundo se reduzia a nada. Fui muito maltratada pelas circunstâncias que não gostava de silê...

segunda-feira, 20 de abril de 2020

Memorias apagadas...

Chegou a hora. Ninguém soubera,
mas, ele sim!
Havia uma certa agonia por dentro,
uma certeza serena, de que deveria partir.
O médico o avisara fazia um ano, que a sua
saúde estava quase á um fio.
A pressão, a maldita pressão descontrolada,
anos, após anos, na incerteza, tanta coisa para se preocupar.
Dois casamentos, sete filhos. O primeiro acabou na morte da esposa,
o segundo, ainda em curso, acabaria por sua vez, quando a sua hora chegasse.
O que deixaria para os dois filhos ainda pequenos, como eles conseguiriam
sobreviver sem o pai?
Isso não o deixava em paz.
E a pressão ia subindo e os remédios não davam conta, muitas
vezes, acabava na U.T.I.
Quando voltava para casa, uma paz o inundava por dentro: Deus ainda lhe dava uma chance!
A sua casinha branca, de janelas azuis, ainda estavam lá, sem nenhum resquícios de que distanciara por dias.
Havia uma áurea brilhante em cada planta, agora que já pensava haver pouco tempo, dava uma vontade incontrolável de cuidar delas, com mimos cada vez mais sensível. Por vezes as lágrimas escorriam pela face, quase à sugar suas poucas energias.
Entrava em seu paiol, as coisas penduradas num canto: o regador, o gancho, o machado, as enxadas, o deixavam cada vez mais fragilizado. Tudo aquilo fizera parte de um tempo, quando ainda podia usá-los:  na horta, no pomar - ou ainda a carpir ao redor da casa.
Olhava suas duas crianças brincando, correndo atrás das galinhas ou a colher ovos nos ninhos, quanta bonança havia naquele lugar.
Quando jovem, sua vida não fora fácil, houve tempo em que o dinheiro faltava, e que precisava depender de algum vizinho. Agora, tinha tudo, era pouco, mas nada faltava. Porém faltava o principal: saúde e tempo!
Se tivesse um pouco mais de tempo, iria se aproximar mais dos outros filhos, os do primeiro casamento, que andavam meio afastados.
Mas, de que adiantaria fazer isso agora, seria como tentar plantar algo que jamais colheria.
Sua primeira mulher era tudo para ele, mas, a morte bateu muito cedo em sua porta, ele teve que aprender a ficar sozinho, por um tempo, mas, depois, se viu obrigado a arrumar uma companheira, e consequentemente, arrumou mais dois filhos, que agora, era uma razão a mais para querer ficar por mais algum tempo.
Porém, sabia que nada dependia de sua vontade, sempre fora um homem forte e decidido, até demais em algumas situações. Pensava ser o dono de tudo, comandava com mãos de ferro -  sua família, sua mulher, até seus animais.
E quando mais precisava não encontrava nenhum poder. Á não ser, continuar sendo acompanhado por um especialista e tomar seus remédios conforme recomendação.
Isso ele fazia. com zelo e atenção, mas sabia que nenhum dos dois tinham nenhum poder sobre o que lhe acontecia por dentro.
Continuou fazendo o que sempre fazia, cuidava, na medida do possível, de suas mexeriqueiras. Ia à cidade fazer compras,  deixando outras preocupações um pouco de lado.
Já estava sem vigor algum. Aos sessenta e seis anos sentia-se com se já tivesse cem.
Numa tarde de domingo recebeu a visita de seus filhos distantes. conversaram por longas horas, a beira de seu lago preferido. carregou sua primeira neta no colo - Estava sentindo-se bem e feliz, como ha muito não sentia.
O dia ensolarado de céu extremamente azul dava-lhe um pouco mais de esperança. Talvez seu coração alcançaria um estado de êxtase e não ficasse tão fraco como estava nos últimos tempos, e a sua fé o levasse para além das expectativas médicas.
O dia se findou, os filhos retornaram para as suas casas, finalmente, parecia estar em paz.
No dia seguinte sentia-se bem melhor: regou as plantas, colocou um pouco de adubo nos pés de fruta, brincou com seus filhos, parecia um dia normal.
Mas, a noite chegou, e com ela trouxe o pior. Parecia faltar oxigênio no mundo.
O ar entrava, mas não chegava até o pulmão, aguentou por alguns minutos e quando tornou-se insuportável, chamou pela esposa.
Correram para o hospital mais próximo, mas, já não havia mais nada à fazer. seu coração entrou em colapso. Tudo o que dera valor por todos aqueles anos terminou com um ultimo suspiro. marcando o fim que ele não queria.
Os olhos se fecharam, os braços amoleceram, e seu cérebro parou de funcionar. Sem ter tempo de se despedir.
Seu corpo inerte foi deixado numa sala de fundo, jogado em cima de uma mesa, inerte, como se não representasse mais nada, como se fosse um nada. O céu continuou azul, as pessoas continuaram seus afazeres, cada um com seu sonho e o dele terminou, Não sem antes escrever a sua historia...

Hertinha Fischer
















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