Me perguntam se eu tenho uma historia boa para contar. Tenho historia, só não sei se é tão boa assim.
Alguns trechos foram esquecidos, outros, memoriados, sem poder contar. O que posso contar, escrevendo, esqueço.A melhor fase, antes dos cinco anos, não registrei.
Os outros sessenta anos, a memória guardou mais paisagens que dizeres. Não posso descrever o caminho, nem os córregos, nem as mudanças, que foram tantas.
Digo que havia, sempre havia!
Um estalar de vida a uivar, como lobos famintos seguindo suas trilhas.
Um troteio frenético de saberes e sabores, vencendo e titubeando ao mesmo tempo.
As vezes penso que é extremamente inútil revelar, como as antigas fotos que acabam por se perder nas gavetas.
Minhas importâncias são minhas importâncias - enquanto me valem terá um certo valor. Depois que me vou, alguém se valerá, mas, não com a mesma significância.
Pouco a pouco, o tempo vai nos perdendo e os lugares em que sentamos, ocupados.
Sinto as lembranças mais vagarosas, como um tilintar de orvalhos da manhã, que mal chegam e já se preparam para partir.
Uma flor que o tempo toma para si, cujo perfume se vai com o vento.
Algum lugar me espera,
se me espera, quando?
Haverá cura para essa doença chamada velhice,
ou persistirá até que a doença seja a cura?
A velhice é como a criança com menos de cinco anos, sem registro.
Nada será tão sublime como mais um dia, mais uma noite e o dia seguinte. A memória não tem autoridade para ir além do instante. E é esse instante que nos impulsiona a continuar seguindo pelos caminhos já memoriados.
Até que nos procurem nas coisas, que, para aplacar a dor da memória, coisas que nos pertenceram sejam jogados fora. Missão cumprida, partida!
Hertinha Fischer
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